domingo, 24 novembro
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Realizar um plebiscito popular à revelia do governo do estado foi o principal encaminhamento da audiência púbica promovida na noite desta sexta-feira (22) pela Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa, para debater a PEC 280. Proposta pelos deputados Jeferson Fernandes, Zé Nunes, Sofia Cavedon, e Edegar Pretto, presidente da Comissão, o encontro virtual reuniu vereadores e representantes de sindicatos, Famurs, Ministério Público Estadual. O governo Leite, mais uma vez, não enviou nenhum representante para debater os impactos da PEC 280, que retira a exigência de plebiscito para a venda da Corsan, Banrisul e Procergs.

O presidente da Comissão, Edegar Pretto, argumentou que o debate não se esgota nesta audiência. “A covardia também fica para a história. O governo não participou e a base aliada está disposta a patrolar a votação. O governador vai às redes sociais dizer que vai descumprir a palavra, mas espera que o povo compreenda. Mas compreender como, se a promessa feita pelo então candidato Eduardo Leite era de que Banrisul e Corsan continuariam públicos?”, questionou.

O Procurador do Ministério Público estadual, e ex-deputado Estadual, Vieira da Cunha, que foi autora da PEC que incluiu a obrigatoriedade de realização de plebiscito para privatização de empresas públicas, lembrou que a proposta foi resultado de uma grande mobilização da sociedade gaúcha, que clamava pela proteção ao patrimônio público. “Havia um grupo norte americano que não fazia os investimentos necessários e Leonel Brizola criou a CEEE. Agora o restante da CEEE distribuição foi entregue. A conversa para boi dormir de que vendia porque dava prejuízo, não se sustenta mais. Já fala em privatizar a Corsan, o Banrisul e a Procergs que são lucrativos. Daqui a pouco vão querer vender até o Palácio Piratini, com móveis e tudo. Estamos diante de um estelionato eleitoral que vai na contramão da democracia que todos nós queremos”, avaliou.

Em nome dos proponentes da audiência pública, o deputado Jeferson Fernandes observou que há uma preocupação com a democracia direta e com a democracia interna no Parlamento, pois o governo não autoriza seus secretários e gestores das empresas públicas a participarem da audiência púbica. “Os 317 municípios em que a Corsan está não foram consultados. O presidente da Corsan utiliza a mídia para atacar os trabalhadores e criar a ideia de que a empresa tem que ser entregue à iniciativa privada. Desafio para além das bancadas de oposição, quais são os deputados que ousarão votar contra a PEC”, disse. Jeferson reconheceu que pelo menos um deputado da base governista, o deputado Faisal Karan (PSDB) participou da audiência, sem se manifestar. “Uma pena que outros não tenham se juntado a nós”.

O presidente da Famurs, prefeito Maneco Hassen, também iniciou sua fala lamentando a ausência dos representantes do governo na audiência pública que debateu temas muito importantes para a vida dos cidadãos gaúchos. “Temos procurado fazer pela Famurs o diálogo extremo, mas é lamentável que este tema tenha vindo à tona no pior momento da pandemia, independente da nossa posição sobre privatizar ou não. Nós tínhamos que estar debatendo a falta de vacina, o porquê nossas crianças estão fora das salas de aula, a falta de apoio às micro e pequenas empresas e a solidariedade às famílias que perderam alguém para a Covid”. O governador anunciou, em 18 de março, a possível privatização da Corsan, disse Maneco, mas não pode vender algo que não é dele sem debater com os proprietários. “A concessão é da Corsan, mas o direito é das prefeituras. Que a Corsan tem problema , nós não temos dúvidas, mas essas dificuldades não são maiores que o tamanho da empresa”, afirmou.

Denise Correa, diretora da Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Instituições Financeiras do Rio Grande do Sul (Fetrafi), que representa 28 sindicatos, disse que no estado estão morrendo muito mais gaúchos e gaúchas do que estão nascendo. Isso demonstra que a discussão é extemporânea. “Ocorre em um momento em que as instituições deveriam estar discutindo como sair dessa crise, como garantir vacinas, como socorrer as empresas. Temos que dar nosso olhar sobre como vai ser a sociedade depois. Precisamos de democracia pois nunca se saiu de uma guerra sem um estado forte, com empresas fortes que possam reconstruir a sociedade”, defendeu.

Arilson Wunsch, presidente do Sindiágua, afirmou que o governo Leite é um governo “sem lei”. “O que acontece no RS é que em nenhum momento o governo Leite pensou em uma política de saneamento no RS. E trouxe gente do mercado financeiro para administrar a Corsan. Agora está fugindo do debate”. Wunsch chamou a atenção para o processo de privatização da água em Uruguaiana, cujo lucro que empresa tem não é investido no município. “Vai tudo para o Canadá”.

DESRESPEITO AO PARLAMENTO
A ausência de representantes do governo em um debate tão importante também foi abordado pela deputada Sofia Cavedon, que considerou como um ato do governo de desrespeito ao Parlamento. “Ao mostrar a intenção de terminar com o plebiscito, está demonstrando uma postura autocrática. A constituição está voltada para a construção de uma sociedade democrática e soberana. Esse governo não respeita, pois não dialoga”. Para Sofia, a supressão do direito conquistado renega a soberania do povo. “É agressivo e violento com o povo e com a democracia no estado do Rio Grande do Sul. Repudiamos essas façanhas”, disse.

A diretora geral do Sindicato dos Trabalhadores em empresas de processamento de Dados, Vera Guasso falou da importância da Procergs. “O governador engomadinho está dizendo o mesmo que se dizia na ditadura: que o povo não sabe decidir”. A Procergs está na vida de cada uma e cada um de nós gaúchos. Na pandemia, em questão de horas, a Procergs colocou milhões de gaúchos em home office. Estamos voltando à recolonização do Estado Brasileiro. Não é possível entregar água, bancos e tecnologia da informação. São dados sensíveis, informação e segurança que comprometem a soberania. Segundo a diretora, alguns gestores das empresas assistiram à audiência pelo Youtube. “Mas não vieram aqui porque o governo não os autorizou”.

O deputado Valdeci Oliveira reafirmou que a retirada da obrigatoriedade de consulta à população é absurda e criminosa em um momento de pandemia. Para o parlamentar, isso foi premeditado para evitar que os trabalhadores se mobilizassem. “O governo fala em gestão moderna, mas que modernidade é essa que reedita o pior do governo Antônio Britto? Que modernização é essa que em plena pandemia coloca a privatização da água, que é um bem da humanidade? E como ficam os municípios onde há pouco tempo se fizeram novos contratos? E como ficam as pequenas cidades?”, questionou, lembrando que as empresas que comprarem a Corsan visam lucro e só vão atender as grandes cidades. “Governo que tem medo do povo, não deveria ter direito de ser governador”.

O deputado Fernando Marroni também apontou o estelionato eleitoral, pois o governador prometeu e não está cumprindo. “Muita gente votou nele com essa confiança. Gosto do debate aberto e o que se escancara aqui é um grande engodo eleitoral e por isso a democracia vai se perdendo e o povo deixa de acreditar em quem os representa”. Para Marroni, “passar a boiada em plena pandemia é uma covardia”. Segundo o deputado, 12% da água potável do planeta está no Brasil e com o novo marco regulatório, os municípios não terão titularidade e não terão autonomia. “Não importa se tem outras empresas, a titularidade e o patrimônio será do Estado ou da nova gestora. Isso é um golpe sobre a água”. O deputado lembrou que o Papa Francisco disse que o saneamento é fundamental para a superação dos problemas sociais.

O deputado Pepe Vargas chamou a atenção para o fato de que em 1995 o governador Britto começou com o processo de privatizações. Em sessões extraordinárias em ritos sumários na véspera do Ano Novo. Anos depois a Assembleia, por iniciativa de Vieira da Cunha, incluiu a obrigatoriedade da consulta pública. A democracia direta não é apenas eleger seus representantes. “Os que aqui se apresentam como portadores da modernidade, retroagiram ao tempo do Maquiavel, em que a vontade do ‘príncipe’ se sobrepõe à vontade do povo e isso é muito ruim para a democracia, pois gera descrédito”. Pepe lembrou que saneamento básico sofreu uma onda de privatizações na década de 90, mas agora no mundo todo volta a ser estatizado. “O Banrisul e a Corsan não são deficitários. Qual país vai entregar a sua base de dados sigilosos para a iniciativa privada? E o governo não participa das audiências públicas. Espero que os deputados da sua base aliada ajudem o governador a enxergar”.

Para o deputado Zé Nunes, presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Banrisul Público, é muito grave o que o governador está fazendo, pois está botando no lixo a credibilidade política. “Isso faz um mal enorme para a política. Uma das façanhas do governo Leite é a covardia, primeiro pela agilização da PEC em um momento de pandemia em que a população não pode se mobilizar, segundo porque desconsidera o elemento da democracia participativa, atropelando como se tivesse legitimidade para vender tudo o que quiser. É covarde porque foge do debate e por aderir proposta do governo federal, lesiva ao Estado”. Chamou a atenção para o fato de saneamento básico representar investimentos em saúde. “O povo vai pagar essa conta, pois a tarifa vai aumentar. Da mesma forma que o Banrisul é um instrumento potente para programa de microcrédito, para o amparo aos hospitais, para o financiamento cultural.

Texto: Claiton Stumpf (MTB 9747)

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