Por Miguel Rossetto(*)
O anúncio da saída da Ford do Brasil é a parábola perfeita deste capitalismo predatório em que estamos sequestrados no Brasil, em que grandes empresas sugam absolutamente tudo do Estado e da sociedade para depois, quando for do seu interesse, abandonar o país, população e trabalhadores a sua própria sorte. Mas esta também é uma parábola sobre políticas de governo.
Sempre afirmamos que o que garante a industrialização de um país é a força do mercado de massas, da capacidade da população consumir e mover a máquina da economia, ou seja é uma demanda forte que puxam a produção, articuladas com políticas tecnológicas e de inovação.
Outra corrente, que alimenta o apetite predatório destas empresas, coloca o foco no custo, seja trabalhista, seja fiscal. Com base nesta ficção econômica, cortou-se impostos, fez-se reformas trabalhistas e previdenciárias que empobreceram o povo e derrubaram a demanda. O resultado: o que foi anunciado hoje.
Mas mais grave ainda é que este processo quebrou o estado do Rio Grande do Sul – e outros estados, com isenções a rodo que destruíram a base tributária gaúcha. Chegamos à absurda situação que só os pequenos são tributados. Isto é parte importante da crise fiscal gaúcha que se arrasta há décadas.
No caso concreto, a empresa Ford teve uma conduta ilegal com o RS e foi punida pelo Judiciário por isso. Buscou um conjunto de privilégios como benefícios fiscais exagerados e recursos diretos do caixa do Estado, sem compromisso de permanecer operando, sem compromisso com fornecedores locais e sem compromissos com numero de empregos. Conseguiu isto na Bahia, a partir de FHC que trabalhou contra a Federação promovendo a guerra fiscal entre os estados, com gigantescos privilégios federais e estaduais. Agora anuncia que vai embora, o que comprova ao fracasso destas políticas.
Há que se registrar uma última ironia neste triste desfecho. No dia em que comunica sua saída do Brasil, a Ford anuncia o investimento de 580 milhões de dólares na Argentina. Ou seja, entre a dupla Bolsonaro e o ultraliberal Guedes e o esquerdista Alberto Fernandes a Ford optou pela Argentina. A saída da Ford – e sua ida para a Argentina-, da Mercedes e outras empresas, revela a brutal e desastrosa desindustrialização do pais e o aumento insustentável do desemprego. Este desastre foi anunciado quando Bolsonaro assumiu e entre suas primeiras medidas acabou com o Ministério da Indústria e o Ministério do Trabalho, retirando a indústria nacional e o trabalho da sua agenda. Uma tragédia.
(*) Miguel Rossetto foi vice-governador do Rio Grande do Sul, ministro do Desenvolvimento Agrário e do Trabalho.
Publicado originalmente em Sul21