segunda-feira, 25 novembro
Foto: Reprodução / TV ALRS
Mesmo no período do recesso parlamentar, em janeiro, as Comissões de Cidadania e Direitos Humanos e Saúde e Meio Ambiente da Assembleia Legislativa promoverão encontro para tratar dos detalhes e estratégia do Plano Estadual de Vacinação, em elaboração pela Secretaria Estadual da Saúde. Outro assunto que os dois colegiados darão seguimento neste período diz respeito ao PL 1462/2020, que tramita na Câmara Federal e é estratégico para a licença compulsória e a suspensão temporária do direito de exclusividade das patentes farmacêuticas.
Estas deliberações foram resultado da audiência pública promovida hoje (18) pelas duas comissões, sob a coordenação da deputada Sofia Cavedon (PT), quando esteve em pauta a “Vacina para todas e todos e o PL 1462/2020 – uma resposta à epidemia de Covid-19”. Com a presença da secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, ficou pré-agendada uma reunião em janeiro, a ser realizada pela Comissão Representativa, para tratar do Plano Estadual de Vacinação, conforme dispôs a secretária.
Neste momento em que os índices revelam o avanço do contágio no Rio Grande do Sul e no Brasil, com o aumento da lotação das UTIs e também das mortes, a urgência da vacina está mobilizando os gestores públicos que desde março estão enfrentando a pandemia do novo coronavírus. Arita Bergmann informou que está em curso a elaboração do Plano Estadual de Vacinação, que demanda ampla estratégia e articulação especialmente com os municípios, que cumprem o papel principal na aplicação da vacina. Por enquanto, o governo aguarda a definição do plano nacional a ser indicado pelo Ministério da Saúde, mas a secretária trabalha com a possibilidade de utilizar estratégia local. A logística envolve diversos setores e custos, e a operação estará sendo implementada justamente no início das novas administrações municipais, em janeiro, razão pela qual a Famurs e as entidades municipalistas estão alinhadas com a secretaria da Saúde para esse fim, explicou Bergmann.
A secretária não descarta a participação do setor privado na vacinação. O RS dispõe de 5.400 farmácias e mais de 400 farmacêuticos estão capacitados para a vacinação, conforme o Conselho Regional de Farmácia. Arita adiantou que o Plano Estadual de Imunização prevê uma seção para o setor privado e também poderá dispor do terceiro setor, que está oferecendo caminhões para o transporte da vacina. “A área da ciência, da academia, de epidemiologia, infectologia, todos são bem vindos para um plano de vacinação no RS que chegue no cidadão que queremos proteger”, assegurou.
Ela adiantou que na próxima terça-feira (22) acontece a reunião do Comitê de Operações Emergenciais para apresentação do primeiro desenho do Plano Estadual de Vacinação contra a Covid-19, disposto de forma a alcançar “todos os cantos do estado”. Disse que o governo está em diálogo permanente com o Ministério da Saúde, na expectativa de que a coordenação da vacinação seja nacional, mas ainda sem confirmação de qual vacina e a quantidade disponível, incerteza que “coloca dificuldade para o fechamento do nosso plano”. Por isso, Arita prepara um plano B, em caso de não distribuição de imunizantes para o RS no início do próximo ano, que será a compra direta de vacinas do Instituto Butantã, o que é viável porque o estado tem memorando nesse sentido.  A secretária reiterou os cuidados do governo com os ritos administrativos públicos para compras neste período de pandemia, adotando cautela e fazendo as licitações, como foi na compra de 230 respiradores, monitores e camas, operação que enfrentou a ganância de algumas empresas. Disse isso para explicar que a compra da vacina é um processo criterioso, e o melhor seria a coordenação nacional para essa compra. Enquanto isso, outros procedimentos estão em curso, como o processo de compra de 308 câmaras de conservação para os municípios com menos de 100 mil habitantes, assim como a compra de seringas, embora o estado tenha um volume razoável em estoque.
Bergmann ponderou, no entanto, que a previsão de déficit no orçamento do próximo ano e, em caso de rejeição da proposta do governo das alíquotas do ICMS, estará inviabilizado o financiamento para a compra de vacinas, cujo custo será em torno de R$ 120 reais a dose. Sobre o PL 1462/2020, manifestou apoio, “é missão que envolve todas as instituições”.
Distanciamento controlado
Diante de críticas ao poder público no enfrentamento da pandemia, atribuindo à população os cuidados para se proteger do contágio, Arita Bergmann defendeu o Modelo de Distanciamento Controlado adotado pelo governo, cujo monitoramento é feito pelo Comitê de Dados, semanalmente, com as análises técnicas dos pedidos de abertura e cogestão. O município assume a responsabilidade quando adota a cogestão e os protocolos da bandeira laranja, por exemplo, quando a sua região está em bandeira vermelha. “A região faz um pedido, analisamos no Gabinete de Crise, se pode ou não usar os critérios da cogestão”, afirmou. Ela destacou o apoio do Ministério Público Federal e Estadual no cumprimento dos protocolos que atingem todas as atividades, “se fossem cumpridos não estaríamos vivendo este momento e pedimos para o cidadão que denuncie”, indicando o telefone 150 e o apoio da Brigada Militar e da Vigilância Sanitária dos municípios para cumprir os regramentos. “O cuidado com o uso da máscara, a higienização das mãos, evitar os contatos de grandes grupos, as pessoas têm que ter consciência que a transmissão do vírus depende de comportamento”, disse categórica.
A deputada Sofia Cavedon também deverá encaminhar um manifesto à bancada federal gaúcha pela imediata votação do PL 1462/2020.  Ela destacou o trabalho parlamentar, ao longo do ano, vinculado ao Comitê Científico, buscando informar a população sobre  assuntos como a reabertura das escolas públicas, os critérios das bandeiras e agora, para tratar da vacina. Também o deputado Jeferson Fernandes (PT) acompanhou a audiência, preocupado com os indicativos de aumento dos contágios, das internações em UTIs e das mortes, lamentando que o Brasil tenha adotado procedimentos inadequados e de alto risco para a população diante da pandemia.
Progressão exponencial
Pela Sociedade de Infectologia, Ronaldo Hallal fez o alerta da progressão exponencial de casos no RS, das mortes e também dos sinais de colapso no sistema de saúde, o que está a exigir “mudanças estratégicas e medidas enfáticas de diminuição da circulação, e rediscussão da política de prevenção, não apenas a política de vacinação”. Também alertou para a fragilidade da assistência aos usuários do SUS, em função da pandemia. E pediu a aprovação do PL 1462, sugerindo campanha de acesso ao site da Câmara Federal pedindo pela aprovação da matéria. Outra ponderação foi no sentido de alertar sobre as desigualdades sociais do país que se repetem nos índices de contágio e mortes pela Covid-19, em especial da população negra e periférica. Logo em seguida, ele apresentou detalhes da dinâmica que envolve as três fases de produção da vacina e os laboratórios internacionais e nacionais envolvidos nesse processo.
O médico Armando de Negri também mostrou que este é “o pior momento da epidemia no RS”, com os números indicando um sistema de saúde colapsado. Disse que Porto Alegre já registra pacientes em ventilação mecânica fora das UTIs, com pacientes Covid ou não esperando UTIs e a taxa de ocupação está em torno de 100%. Esse quadro não é muito diferente no interior, como em Caxias do Sul ou Santa Maria. Segundo Negri, a continuar desse jeito, as mortes acontecerão por Covid ou outras doenças, lamentando que diante desse desastre as pessoas agem com normalidade e o estado passou a responsabilidade aos municípios. “É um negacionismo não assumido”, classificou.
A respeito do PL 1462/2020, que tramita na Câmara Federal, Pedro Villardi, do grupo de trabalho sobre propriedade intelectual, baseado na experiência com pesquisas em HIV, hepatite e tuberculose, discorreu a respeito das patentes farmacêuticas,uma vez que são instrumento do estado ou da empresa que permite eliminar os concorrentes daquele mercado de medicamento como monopólio. As patentes são obrigatórias para todos os campos tecnológicos desde 1994, com repercussão perversa sobre a saúde, gerando custos humanos e tecnológicos excessivos. A ONU aponta incoerência entre os direitos humanos e as patentes farmacêuticas”, explicou, uma vez que se torna impossível assegurar o direito à saúde em cenário com as patentes farmacêuticas. Nesse cenário, a disputa pela vacina para conter a pandemia do novo coronavírus expõe que “as patentes geram monopólios e em termos epidêmicos, formam combinação que levam a gente para o desastre”. Isso aconteceu no início da pandemia, com o custo dos equipamentos de proteção individual e os respiradores. Uma das formas de enfrentar essa “batalha de patentes” está contida no PL 1462/2020, que “traz para o ordenamento jurídico brasileiro a urgência para lidar com as pandemias”. A licença compulsória é a autorização do estado para que outras empresas com determinada tecnologia, por determinado tempo, quebrem o monopólio, que não pode existir durante pandemias. A matéria tramita desde abril na Câmara, mas nunca foi pautada, embora com requerimento de urgência, continua engavetado pelo presidente, Rodrigo Maia (DEM).
Outra participação foi do pesquisador Paulo Pisa, da Fundação Oswaldo Cruz e aposentado da OMS, com experiência em campanhas de imunização. Disse que a organização dessa estratégia envolve a saúde e todos os segmentos sociais, em operação de altos custos financeiros. “A OMS estima que para vacinar a população os países vão ter que aumentar em até 18 vezes o seu orçamento nacional de imunização, e os estados e municípios devem triplicar os gastos em imunização para fazer frente à epidemia”. Alertou que o Programa Nacional de Imunização e a Organização Panamericana de Saúde, há 40 anos, têm mecanismo que permite que municípios, estados e países tenham acesso aos insumos e materiais de forma internacional, através de um fundo rotatório de mais de 4 bi de dólares, para comprar vacinas e distribuir em 156 países.
Seguiram-se participações do médico Jeferson Boeira, pelo SIMERS; Marília Ferraro Rocha, do
Conselho Nacional de Saúde, que alertou para a responsabilidade do estado com a vacinação, e não as pessoas, e também para o fato de que a execução desse serviço é atribuição dos técnicos do estado e não pode ser terceirizado. Carla Almeida mostrou o risco de os índices no RS de HIV, AIDS e tuberculose dispararem diante da contenção dos serviços do SUS; pelo MPF, Bruna Pfaznzeller detalhou a atuação do órgão durante a pandemia e questões que envolvem a vacina; e Lissandra Michelin, do Programa Nacional de Imunização, comentou sobre os dados da vacina, os dados de segurança, e o eixo de farmacovigilância.
Por último, o secretário Luis Lamb destacou o empenho e esforço da área da saúde para enfrentar a pandemia, conforme a visão técnica e num ambiente coletivo de discussão e ação.
A solicitação da audiência pública foi encaminhada pela presidente do Conselho Municipal de Direitos Humanos de Porto Alegre, Márcia Leão.
Fonte: Agência de Notícias ALRS
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