De invisíveis a “selvagens”

De invisíveis a “selvagens”
Quase metade das famílias de povos indígenas vive em situação de vulnerabilidade social no RS. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Será por acaso que muitos gaúchos e gaúchas ainda desconhecem a presença de povos originários no nosso estado ou tratam-lhes com desdém?

São 35 mil indígenas, residindo em 159 aldeias (54 são guaranis; 103 kaingangs, 1 charrua e 1 xokleng). Estão em 69 municípios e em todas as regiões do RS. Quase a metade das famílias (3.152), estão em vulnerabilidade social. Dentre essas, 120 em extrema vulnerabilidade. Isso, que os dados são de 2020 (SDR), o que certamente piorou com a pandemia.

Não é de hoje que a história oficial invisibiliza estes povos. A “descoberta” do Brasil, em 1500, por Pedro Alvares Cabral, ignorou a existência de milhares de etnias nativas. Cabe lembrar também que portugueses e espanhóis tiveram o apoio decisivo dos bandeirantes paulistas para saquear, violentar, escravizar e exterminar milhares de indígenas que fundaram o RS. Com a espada numa das mãos; e a cruz, na outra, menosprezaram diversas culturas deste e de outros continentes.

Renato da Silveira nos ensina, em sua obra “(…) Papel do Racismo Científico na Montagem da Hegemonia Ocidental (2000)”, que cientistas europeus do século XIX, renomados em função de descobertas como o metro, o sistema decimal, o telégrafo, a solda, o gás de iluminação, a unificação da medicina com a cirurgia moderna, passaram a explicar com pesquisas, com base na cor da pele principalmente, a “supremacia natural dos homens brancos”.

Buffon, Voltaire, Dr. Paul Broca, Charles Letourneau, Cesare Lombroso, Georges Vacher de Lapouge, só para citar alguns, fundamentaram suas conclusões racistas a partir de análises grosseiras da anatomia humana ou com base nos relatos de religiosos e militares que haviam convivido com populações indígenas e negras.

Quem era invisível passou dessa condição para “selvagem”, “infantil”, “juvenil”, “bárbaro”, “feminino”, “pré-histórico”, “inferior”, “degenerados, “feio”, grosseiro, “estúpido”, “vagabundo”, “covarde”, “pervertido”, dentre outros adjetivos de tom pejorativo. Esse racismo que foi incutido também por aqui, via autores brasileiros como Nina Rodrigues, continua muito vivo e ameaçando a dignidade desta gente que cobra o mínimo de reparação pelo tenebroso passado, via políticas públicas, terras e respeito as suas culturas e suas religiosidades.

Vivam os povos indígenas que insistem em viver. Façamos deste 19 de abril de 2021 um marco de solidariedade a quem nos emprestou tantos ensinamentos em todas as áreas, mesmo sem o devido reconhecimento.

Jeferson Fernandes, Deputado PT RS, mestrando Direitos Humanos UNIRITTER.