sábado, 23 novembro
Reprodução Mauro Mello

Em vez de realizar concurso público para a contratação de policiais militares e bombeiros, o governador Eduardo Leite apostou no PL 261/2020, aprovado por 37 votos favoráveis e 13 contrários, e no 262/2020, aprovado por 34 votos favoráveis e 13 contrários. Ambos visam a recriação do Programa de Militares Estaduais Temporários (PMET) da Brigada Militar, cujo objetivo é contratar 2 mil PMs pelo prazo de dois anos, prorrogável por até oito anos e 300 bombeiros pelo prazo de dois anos, podendo os contratos serem prorrogados por mais oito anos. A bancada do PT votou contra a proposta, por entender que a dispensa de concurso é de duvidosa legalidade, pois o método preferencial para o Estado contratar servidores é o concurso público, que leva o servidor a dedicar-se a uma carreira estável, profissional e legalmente protegida, especialmente em uma atividade tão especializada como o policiamento.

O deputado Jeferson Fernandes, que preside a Comissão de Segurança e Serviços Públicos, argumentou que o projeto é prejudicial. Primeiro por não ser constitucional, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). Em agosto passado, a relatora, ministra Cármen Lúcia, entendeu que a lei viola a competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares. Ela apontou ainda que as normas gerais federais sobre a matéria não preveem a possibilidade de contratação temporária de PM.

Para ingressar na BM ou no Corpo de Bombeiros Militar é necessário o ensino médio e mil horas de treinamento. Mas, pelo projeto, tanto para o PM temporário quanto para o bombeiro temporário, além do ensino médio, basta um treinamento de três semanas, num total de 120 horas, no Departamento de Ensino da Brigada Militar e Departamento de ensino do Corpo de Bombeiro Estadual Militar, mantendo o retrocesso na qualificação funcional da BM. “Além de ser um contrato precário, tem uma formação inadequada e impede um plano de carreira. E não é só trabalho administrativo é também guarda externo de penitenciárias. Esperamos um projeto mais global e não resolver com a contratação de PMs temporários sem uma perspectiva de carreira”, disse o deputado Jeferson, acrescentando que ouviu relatos de PMs temporários de que se obrigam a fazer bico porque não tem uma perspectiva de carreira na Brigada Militar. “Precisamos valorizar os policiais com carreira e com dignidade e esse projeto não garante isso”.

O deputado Pepe Vargas acrescentou que na forma como se estabelece o PM temporário no Rio Grande do Suyl, eles não executam funções secundárias. São atividades que exigem uma formação maior. “Quero saber se teremos procuradores temporários, juízes temporários, promotores temporários. Queria saber se o deputado que falou que isso é uma modernização concorda que pode haver procurador temporário. É dessa forma que vamos constituir um serviço público adequado para os cidadãos e cidadãs? Evidente que não”, disse. Para Pepe, estamos vivendo um “círculo vicioso, que leva ao corte de gastos, que leva a termos um crescimento econômico cada vez menor, queda da arrecadação e aumento de impostos e obviamente ao desemprego e a desigualdade social”. As consequências deste tipo de política de austeridade fiscal, segundo Pepe são desastrosas.

A deputada Sofia Cavedon destacou a desigualdade entre trabalhadores permanentes e temporários. Os que tem contrato, carreira e previsibilidade, direitos trabalhistas, segundo ela, são cada vez em número menor. Por outro lado, a maioria nem FGTS tem. “Saem sem perspectiva. Tornam-se permanentes, mas não tem os mesmos direitos dos contratados por concurso. Há trabalhadores que estão há 10, 15, 20 anos que estão em contratos temporários e vivem o drama permanente da fragilidade do vínculo, do risco de demissão. Não tem plano de saúde, não têm perspectiva de carreira”. Sofia chamou a atenção de que o estado está terceirizando e quarteirizando. “Não podemos aceitar esse rebaixamento brutal. Votamos contra para valorizar a carreira da segurança pública.”

Pela proposta do governo, que tramita na Assembleia Legislativa, a remuneração dos servidores temporários para ambas as funções será de R$ 3.751,38, na qual incidirá contribuição nos mesmos índices e bases de cálculo aplicáveis aos Militares Estaduais de Carreira, observado o disposto na Lei Complementar n° 13.757, de 15 de julho de 2011, ou seja, para o Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Militares do Estado do Rio Grande do Sul.

Não basta para a legalidade do projeto o fato de que no Estatuto dos Militares preveja a figura do PM Temporário, pois não existe qualquer menção de que este será contratado sem concurso. No próprio Exército existem oficiais temporários (R2), que cumprem sua carreira pelo regime da CLT, em um tempo certo, mas que ingressam pela forma normal de agregação a carreira militar.

“Há tempos cobramos do governo que chame os 2,1 mil brigadianos, 300 bombeiros, 450 agentes da Susepe e 1.250 policiais civis aprovados no último concurso. Eles sim merecem o chamamento. O RS precisa de servidores da Brigada Militar, Polícia Civil e Susepe valorizados. Estes projetos representam um desrespeito ao serviço público”, afirma o presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, deputado Jeferson Fernandes.

“Estes jovens recém saídos do serviço militar, com apenas três semanas de qualificação, sem preparo adequado e sem carreira organizada põem em risco não só as vidas deles próprios, mas da população em geral”, avalia o deputado Jeferson, frisando que o estado mantém o mesmo processo simplificado de admissão enquanto que a realidade comprova que a execução de serviços internos, de atividades de apoio e administrativas, de guarda e de video-monitoramento não são tarefas de menor complexidade a serem executadas por pessoas pouco treinadas que não tem responsabilidades ou compromissos com a história da BM.

STF considera inconstitucional a figura do policial militar temporário 

Atualmente a Lei nº 11.991/2003, que prevê a contratação de PM Temporários por dois anos, prorrogável por igual período, foi declarada Inconstitucional pelo STF, em agosto de 2020. Segundo a relatora, ministra Cármen Lúcia, a lei viola a competência privativa da União para legislar sobre normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares (artigo 22, inciso XXI, da Constituição). Ela apontou ainda que as normas gerais federais sobre a matéria (Decreto-Lei 667/1969, Decreto 88.777/1983 e Lei 10.029/2000) não preveem a possibilidade de contratação temporária de PM. Por outro lado, a norma atacada previa que o soldado PM temporário seria contratado por processo seletivo simplificado e se submeteria ao Regime Geral de Previdência Social, remuneração de um salário mínimo regional durante o curso de formação e, posteriormente, de 75% a 80% do vencimento bruto inicial do soldado de carreira.

Texto: Claiton Stumpf (MTB 9747)

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