domingo, 24 novembro

 

 

A Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa vai cobrar que Tribunal de Contas do Estado (TCE), o Ministério Público de Contas (MPC) e Ministério Público Estadual (MPE) cumpram o seu papel fiscalizador no que diz respeito ao processo de privatização da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) e encaminhar ofício ao governo do estado para que os encaminhamentos que estão sendo tomados para isso sejam tornados públicos. A decisão foi tomada na Audiência Pública que debateu a situação da empresa pública, na manhã desta quinta-feira (24).
Requerida pelos deputados titulares da CSSP, Jeferson Fernandes e Edegar Pretto, a audiência contou ainda com a participação dos deputados Sofia Cavedon, Fernando Marroni e Zé Nunes, além de representantes da Fundação Família e Previdência da CEEE, da Frente Parlamentar pela Preservação da Soberania Energética Nacional e servidores públicos. Convidados, os representantes do governo e da presidência da CEEE não compareceram à audiência.
O presidente da comissão, deputado Jeferson, considerou natural que os representantes do governo e da presidência da CEEE, ao saberem que seria um debate em defesa do patrimônio público, não se fizessem presentes, pois a intenção deles é vender, mas os órgãos de controle não podem se omitir. “Os conselheiros são muito bem pagos para exercerem o seu papel com isenção, então é inadmissível que se omitam. É dinheiro público. Se ficar dívida, é o povo quem vai pagar a conta com tarifas altas e serviços de má qualidade”, argumentou. Jeferson mencionou ainda que o governador Eduardo Leite conseguiu retirar da Constituição Estadual o direito do povo votar no plebiscito sobre a possibilidade de venda da estatal e recordou que em 1997 o Estado vendeu e acabou ficando com dívidas consideráveis. “Não queremos que a novela se repita. Não se está aqui discutindo se o governo tem ou não tem direito de fazer a venda. O que estamos discutindo é em que moldes, pois isso é tão importante quanto a decisão de vendê-lo. Se é para o estado ficar com mais dívidas, isso é um problema a ser considerado”, ponderou.
O deputado Edegar defendeu que é preciso continuar lutando pelo que é público e reiterou que
não ha justificativa para os representantes do governo e os gestores da CEEE não estarem na audiência. “É preciso enviar um ofício dizendo que sentimos a ausência deles, pois está nítido que eles querem deixar claro que agora está tudo com eles, mas não pode ser assim, pois temos um passado de privatização que não deu certo e isso nos preocupa muito”. Para Edegar, o governo precisa responder como está sendo tratada essa possibilidade de venda, como será a modelagem, os prazos, quando pretende lançar o edital e se é o melhor momento. “Em 1997 tivemos uma narrativa muito parecida, de que não havia outro jeito, que a empresa era deficitária, que o Estado não suportava uma empresa deste tamanho e o resultado não foi bom”. A venda da CEEE pelo governo de Antonio Britto, tirou 2/3 de orçamento da empresa.
A luta dos eletricitários foi destacada pela deputada Sofia Cavedon. Ela lembrou que infelizmente não teve adesão total da população e o governo acabou retirando o direito do povo gaúcho votar no plebiscito previsto na Constituição do Estado. “A destruição dos serviços públicos é o perfil do Eduardo Leite, pois não é crível que depois de Tarso (Genro) criar o Fundo de Previdência e Sartori mesmo ter honrado, Leite ter encaminhado o saque ao dinheiro dos servidores”. Sofia sugeriu que se destaque um documento demonstrando a gestão temerária da CEEE, com a mudança de estatuto, as perdas de garantias. “É preciso fazer uma denúncia pública e coletiva com todos os atos temerários”.
Já o deputado Fernando Marroni reafirmou que os órgãos de controle não podem lavar as mãos, pois trata-se de um crime que lesa o Rio Grande do Sul e fere a história da desestatização de uma empresa norte-americana. “Fica nosso alerta e nosso repúdio ao posicionamento destes órgãos que parecem alinhados ao governo”, disse.

Entidades representativas dos servidores falam da falta de transparência
Durante a audiência pública, representantes dos servidores da CEEE afirmaram que os gestores deram sinais de que o processo de privatização já estaria andando desde novembro do ano passado, quando teria contratado empresas para fazerem a precificação da companhia. Em função disso, a Fundação Família e Previdência da CEEE montou um grupo de trabalho para levantar dados.
A principal preocupação dos servidores é com o futuro, pois a CEEE tem uma dívida com a Fundação, responsável pela previdência complementar.
De acordo com o diretor-presidente da Fundação, Rodrigo Sisnandes Pereira, afirmou que atualmente a fundação paga uma folha mensal de R$ 50 milhões para mais de 9 mil aposentados e pensionistas. “É um orgulho de ter um benefício complementar de previdência”. Os passivos do Grupo CEEE são materializados em contratos que somam dívidas e outras obrigações dos patrocinadores em um montante que, a valores passam de R$ 1,27 bilhão. A presidenta do Conselho Fiscal da Fundação, Janice Fortes, disse que a efetivação da privatização, que resultará na troca de controle acionário, obriga “a integralizar o pagamento do total dessa dívida até a data da efetiva transmissão ou transferência de direitos e obrigações ao novo acionista controlador, sendo inadmissível qualquer pretensão de calote visando a facilitação do processo de alienação das empresas que compõem a concessionária.”
Ainda segundo Janice, em junho deste ano, o Conselho recebeu uma correspondência do presidente da CEEE, com o pedido de revogação de uma série de contratos com a Fundação “para livrar as empresas do que entendem como ônus no processo de alienação das mesmas”. Exigiu também “a exclusão da solidariedade existente entre as Companhias nas obrigações por elas contraídas”, “renúncia e exclusão da possibilidade de vencimento antecipado dos instrumentos em caso de troca de controle acionário das Companhias” e “rescisão dos Contratos de Garantias”. “Com essa carta fizemos uma denúncia a vários órgões de fiscalização, como a Superintendência Nacional de Previdência Complementar, ao procurador geral do MP de contas, entre outros”.

Necessidade de fiscalização

O ex-presidente da CEEE, Gerson Carrion, Assessor Técnico da Frente Parlamentar pela Preservação da Soberania Energética Nacional, afirmou que é uma luta do Parlamento fiscalizar. “A CEEE tem um grandioso passivo previdenciário, dos ex-autárquicos, passivo trabalhista, passivo internacional, dívidas com Itaipú, então chegam a soma que ultrapassa os 9 bilhões. Em vez de discutir a recuperação e fortalecimento da CEEE estamos diante de um processo açodado de privatização”, afirmou, dizendo-se preocupado com o silêncio dos órgãos de controle. “Quando vem o governador e o presidente da CEEE dizer que a empresa está quebrada, me parece um ato de irresponsabilidade. Está havendo passibilidade dos órgãos de controle. Tá na hora do controle agir de forma cautelar e suspender o processo de privatização”.
Em nome do Movimento Atingidos por Barragens (MAB RS), Leonardo Maggi, que integra a Coordenação Nacional, afirmou que o movimento enxerga a CEEE como solução. “Lembramos aqui e afirmamos que é um retrocesso. Não é a toa que (Leonel) Brizola nos 50 encampou o setor elétrico e instituiu a CEEE. Fez isso porque o sistema não dava conta. Começou a dar errado quando começaram a fatiar a empresa e vender em pedaços”, afirmou, referindo-se aos 2/3 do estado em que a energia elétrica é privada, com piores serviços e maior tarifa. “Está provado que o privado não dá conta de atender a população. A CEE retomou o processo de recomposição dos lucros e a ameaça da privatização consequentemente vai produzir aumento da tarifa”.
Jeferson disse que depois que vender, vir com algumapontamento, é só para fazer de conta. Cvhamo atenção para a necessidade…
O diretor do Sindicato dos Eletrecitários do RS (SENERGISUL), Antonio Jailson Silveira, falou que a privatização “não vai melhorar o serviço, pois as privadas não entregam o que prometem”. Citou como exemplo a multa de R$ 35 milhões que a RGE tomou pela falta de qualidade no serviço. “Em 1997 CEEE foi fatiada e agora está voltando o monopólio. Se for vendida, provavelmente será para uma estatal chinesa”.
Para o presidente do Sindicato dos Técnicos Industriais de Nível Médio do RS (SINTEC), César Augusto Silva Borges, as narrativas se repetem em torno da precarização do serviço público para justificar a privatização. Temos exemplo da privatização em 97, que acabou gerando aumento das tarifas, piora dos serviços. “Se formos olhar todo o cenário nacional e mundial, as narrativas são parecidas e os reflexos comuns e o resultado é a perda de qualidade e elevação dos preços”.
Fabrício da Adefers registrou que o Estado não pode ter um cheque em branco, por isso a audiência pública tem grande importância para cobrar dos gestores da Companhia a modelagem que até agora não foi explicada pelo governo. Têm vários argumentos para sucatear e precarizar e tem a questão do ICMS que lesa o Rio Grande do Sul. Com a escolha da CEEE não pagar o ICMS, saímos do 4ª lugar no ranking nacional para uma das últimas posições. Quem vai ficar com as dívidas? É preciso que os órgãos fiscalizadores se manifestem”, defendeu.
Para co conselheiro da Fundação, Sandro Peres essa concessão é ainda pior que a feita pelo governo Britto. “Quanto à relação da CEEE e o fundo de pensão, a grande mídia sempre associa a imagem da CEEE com aqueles sugadores que estão sempre querendo levar vantagem. Os trabalhadores da CEEE há quase 40 anos administram seu fundo de pensão porque dentro de uma visão estratégica, não deveríamos disputar o mesmo que os outros, por isso temos nosso fundo de pensão próprio”, disse, frisando que a Fundação CEEE despeja na economia do RS 50 milhões mensalmente, dinheiro que entra oxigenando a economia do estado. “Se a estatal for vendida, a dívida deve ser quitada à vista, o que vai demandar uma chuva de ações na Justiça”.
Eduardo Dias, servidor da CEEE de Pelotas, afirmou que no ano passado, o governador mostrou que realmente a CEEE e empresas públicas são, para ele, apenas um negócio. “Ele diz que o governo não deve interferir no negócio e que é uma questão de ideologia do PSDB que vende o que não é seu. Se tivéssemos uma empresa, os móveis de marfim e os cabos de ouro, ele venderia da mesma forma”.
Vitor Dahm, da Uniprocea lembrou que não se trata mais de privatizar ou não, pois isso já passou na Assembleia, mas a preocupação é com o cenário que vem a posterior. O que interessa ao consumidor é a disponibilidade de energia elétrica. Também destacou o impacto que a privatização terá nas empresas que fornecem para a CEEE. “Se uma empresa do exterior adquirir, ela vai comprar dos seus fornecedores. Quais são as perspectivas da privatização. Penso que na tarifa vai dar problema, mas na parte da tecnologia tenho muitas dúvidas. Seria preciso que mostrassem quais seriam os cenários”.
Jeferson Luis Patta de Moura, diretor de Previdência da Fundação Família e Previdência, concluiu que o Legislativo tem feito a sua parte, pois está inserido, mas os órgãos fiscalizadores ainda precisam fazer o seu trabalho. “Não tem como a gestão da fundação abrir mão das garantias”.

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