As regiões de Passo Fundo e Soledade, no Rio Grande do Sul, receberam nesta terça-feira (14) o lançamento virtual da Campanha Máscara Roxa, que permite às mulheres vítimas de violência doméstica denunciarem os seus agressores em farmácias, durante o período de isolamento social devido à pandemia do novo coronavírus. A atividade, promovida pelo Comitê Gaúcho ElesPorElas, da ONU Mulheres, contemplou as 28 cidades que fazem parte das associações dos municípios do Planalto (Ampla) e do Alto da Serra do Botucaraí (Amasbi).
O lançamento foi conduzido pelo deputado estadual Edegar Pretto (PT), que coordena o Comitê Gaúcho da ONU Mulheres. O parlamentar explicou aos participantes as motivações que deram origem à campanha. “Há uma constatação de que a violência contra a mulher aumentou na pandemia, porque o agressor está mais tempo em casa em contato com a vítima, que muitas vezes tem dificuldade de fazer a denúncia. Ao mesmo tempo há uma subnotificação dos casos de violência doméstica, o que é comprovado pelo aumento dos feminicídios, inclusive no RS”, relatou.
Conforme dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado, nos meses de março, abril e maio deste ano 28 mulheres foram assassinadas por questões de gênero. Somente em abril, o aumento foi de 66,7% em relação ao mesmo mês do ano passado. Ao todo, de janeiro a junho, 51 mulheres morreram vítimas de feminicídios no RS.
Segundo Edegar Pretto, o problema da subnotificação ocorre principalmente neste período de pandemia, porque os agressores costumam vigiar os passos da vítima, o que dificulta a sua ida até uma delegacia, ou ainda, controlar o aparelho celular, impossibilitando que ela denuncie por telefonema ou via internet.
O deputado acrescentou ainda que a Campanha Máscara Roxa atende a uma recomendação da ONU, para que seus países constituam políticas a fim de enfrentar a violência contra as mulheres durante a pandemia, envolvendo locais estratégicos para facilitar a denúncia, como as farmácias. “Esses estabelecimentos permanecerão abertos mesmo em situações de lockdown”, justificou.
O coordenador do Comitê informou ainda que o objetivo dos lançamentos regionais é potencializar ainda mais a campanha, que já conta com mais de 1.300 farmácias participantes. “Queremos que toda a sociedade esteja engajada nessa luta e nos ajude a convencer mais proprietários de farmácias a fazerem a adesão”, solicitou.
Como funciona a campanha
Lançada no dia 10 de junho no RS, a Campanha Máscara Roxa permite que mulheres vítimas de violência doméstica façam denúncias em farmácias. Ela começou com 600 estabelecimentos, e já são mais de 1.300 unidades de quatro redes envolvidas. De abrangência da Ampla, seis dos 16 municípios possuem farmácias participantes. Já na região Amasbi, quatro dos 12. Até o momento, farmácias de nove municípios gaúchos já receberam denúncias, em Venâncio Aires, Bento Gonçalves, Casca, Pinhal, Capão da Canoa, Vitória das Missões, Rio Grande, Capão do Leão e Porto Alegre.
Todas as farmácias com adesão estão com o selo “Farmácia Amiga das Mulheres”, que serve para que as vítimas as identifiquem. Os atendentes receberam capacitação online para o procedimento e para garantir a segurança da vítima. Ao chegar na farmácia a mulher deve pedir a máscara roxa, que é a senha para que o atendente saiba que se trata de um pedido de ajuda. O profissional dirá que o produto está em falta e pegará alguns dados para avisá-la quando chegar. Após, o atendente da farmácia passará à Polícia Civil as informações coletadas, via WhatsApp, para que o órgão tome as medidas necessárias.
Edegar Pretto lembrou que qualquer farmácia pode fazer parte da campanha. O objetivo é envolver também aquelas que não fazem parte de grandes redes, mas que estão em cidades menores. “As farmácias não pagam nada para participar. Além disso, os atendentes que encaminharem as denúncias à Polícia Civil não precisarão testemunhar”, garantiu. Interessados devem entrar em contato com o Comitê: 51 991993641 | comite.gaucho.elesporelas@
Participações
Juíza-corregedora do Tribunal de Justiça, Gioconda Pitt falou que a Campanha é fruto do engajamento de vários órgãos e entidades, com o apoio de farmácias e meios de comunicação. Ela reforçou que, neste período de pandemia, há um aumento da violência doméstica e, ao mesmo tempo, da subnotificação. “As vítimas não estão se sentindo encorajadas para denunciar, elas têm medo e não sabem a quem pedir ajuda. Essa campanha é um canal de denúncia.”
Promotora de Justiça do Ministério Público Estadual, Carla Souto destacou que a campanha apresenta para as vítimas uma porta de saída. “É uma possibilidade de romper o ciclo de violência”. Ela complementou que o problema da violência doméstica há muito tempo deixou de ser um problema de casal: “passou a ser uma questão de saúde pública.”
Defensora pública, Liseane Hartmann disse que as mulheres enfrentam vários tipos de violência e que o combate a essa realidade é de responsabilidade de todas as pessoas. Ela ressaltou que o estado registrou um aumento no número de feminicídios, enquanto houve redução de outros tipos de crimes durante a pandemia.
Diretora do Departamento de Políticas para Mulheres do RS, Bianca Feijó pediu aos representantes dos municípios que participaram do lançamento para colaborarem com a divulgação da Campanha Máscara Roxa. Segundo ela, muitas vezes as mulheres têm dificuldade ou não possuem recursos necessários, como internet, para denunciar casos de agressões e que agora as farmácias se colocam como alternativa.
Delegada da Polícia Civil de Ibirubá, Dina Aroldi contou que, ao fazer o atendimento, os policiais percebem o medo que as mulheres têm de denunciar os seus agressores. Para ela, a campanha é fundamental para diminuir os índices de violência doméstica. “Temos que lutar para que, num futuro próximo, as crianças não vivenciem mais isso dentro de suas casas e para que elas não levem essa criminalidade para fora de casa”.
Comandante Regional de Policiamento Ostensivo Planalto, coronel André Giuliani frisou que a instituição é parceira da campanha junto à Polícia Civil. Ele ainda reconheceu o trabalho realizado pela Patrulha Maria da Penha na região. “A Brigada Militar faz o registro e coíbe qualquer violência. Somos parceiros e estamos à disposição desse projeto”.
Representando as Farmácias Associadas, Gustavo Vivan explicou que a rede está presente na maioria dos municípios gaúchos e é constituída por pequenos empresários de comunidades locais, que estão engajados e têm o compromisso com as questões sociais. “Para nós é uma honra fazer parte da campanha e ajudar a combater a violência doméstica”.
A defensora pública Anelise Sturm, que representou a Associação das Defensoras e dos Defensores Públicos do RS, contou que trabalhou durante seis anos na Comarca de Soledade, período em que acompanhou várias situações de violência doméstica. “Muitas nos deixaram chocados, principalmente nas comunidades do interior”. Ela acrescentou que, por esse motivo, a divulgação da campanha na região é de extrema importância.
Prefeito de Ibirapuitã e presidente da Amasbi, Rosemar Hentges destacou que a associação é parceira da Campanha Máscara Roxa e que pautar o fim da violência contra as mulheres é fundamental. “Muitas vezes a violência fica reprimida dentro das famílias e não se consegue dar a atenção necessária porque ela não aparece”. Ele argumentou que, se toda a sociedade se engajar à iniciativa, o estado terá condições de mudar essa realidade.
Reitora da Universidade de Passo Fundo (UPF), Bernadete Dalmolin parabenizou o deputado Edegar Pretto pela campanha e pelo movimento que tem feito no estado pelo fim da violência contra as mulheres. “Fazer o enfrentamento da violência é algo que deve ser de todos. Mas quando vem de um homem, do parlamento gaúcho, é algo que precisa ser destacado e que merece o nosso reconhecimento e agradecimento”. De acordo com a reitora, a universidade também possui iniciativas de combate à violência contra as mulheres, a qual também considera uma pandemia.
Gerente da Emater/RS-Ascar da região de Soledade, Lucia Souza afirmou que a instituição atua há 65 anos no estado e está presente em mais de 90% da zona rural, onde trabalha com homens e mulheres. Ela completou que a instituição se sente honrada por também fazer parte do Movimento ElesPorElas. “Estamos engajados na Campanha Máscara Roxa e iremos intensificar a divulgação”.
Representando o Movimento de Mulheres, Eva Lorenzatto compartilhou informações que revelam a realidade enfrentada no dia a dia pelas mulheres, especialmente neste período de pandemia, como o desemprego, a sobrecarga de tarefas e a violência doméstica. “Muitas vezes as vítimas permanecem em cárceres privados e, devido ao isolamento, ficam 24 horas por dia com o agressor. Precisamos de incentivos à denúncia, as mulheres tem que sair desse ciclo de violência, tem que se libertar”.
Vereadora de Casca, Sirlei Rapkievicz fez um chamamento a todos os participantes do lançamento virtual para que visitem as farmácias de seus municípios e convidem os proprietários a fazerem parte da campanha. Ela contou ainda que, em seu município, após essa mobilização, as farmácias tiveram 100% de adesão.
Municípios que possuem Farmácias Amigas das Mulheres na região do Planalto
– Camargo (Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Casca (Farmácias Associadas / Vida Farmácias, da Rede Vida)
– David Canabarro (Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Marau (Farmácias Associadas / Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Passo Fundo (Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Vila Maria (Agafarma / Vida Farmácias, da Rede Vida)
Municípios que possuem Farmácias Amigas das Mulheres na região do Alto da Serra do Botucaraí
– Campos Borges (Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Ibirapuitã (Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Nicolau Vergueiro (Vida Farmácias, da Rede Vida)
– Soledade (Farmácias Associadas / Vida Farmácias, da Rede Vida)
Outros lançamentos regionais
Até o final de agosto o Comitê Gaúcho da ONU Mulheres também lançará a Campanha Máscara Roxa nas regiões do Litoral Norte, Fronteira Oeste, Noroeste, Missões, Planalto Médio, Serra, Vale do Caí, Vale do Rio Pardo, Vale dos Sinos, Vale do Paranhana, Carbonífera e Metropolitana de Porto Alegre. Os lançamentos virtuais já ocorreram nas regiões Norte, Centro, Celeiro e Sul. Com as regiões do Planalto e Alto da Serra do Botucaraí já são, ao todo, 164 cidades envolvidas.
Texto: Leandro Molina (MTE 14614)