segunda-feira, 25 novembro
Foto Mauro Mello

Não há confirmação em números oficiais sobre a violência doméstica durante a pandemia. O que está havendo é a crescente sub-notificação de casos devido à dificuldade que as vítimas encontram para denunciar as agressões domésticas. Essa foi a conclusão da reunião virtual promovida na manhã desta quinta-feira (16), pela Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa, que debateu a violência doméstica durante a pandemia e as ações emergenciais. No encontro também ficou acordado que serão mantidos e ampliados esforços em torno da campanha para que as vítimas e a sociedade como um todo denunciem os casos de agressões contra as mulheres.

O objetivo da reunião, segundo o deputado Jeferson Fernandes (PT), que preside a comissão, foi fazer o diagnóstico de como está atuando a rede de proteção neste período de isolamento, em que as o convívio familiar foi ampliado, que é quando vítimas de violências anteriores passam mais tempo junto aos agressores. “O importante é socializar as informações e nos organizarmos para manter essa campanha nas ruas e até dentro da Assembleia Legislativa”, defendeu o parlamentar.

Em relação à Polícia Civil, após o decreto do Governo do Estado que restringiu serviços e determinou o isolamento social, a delegacia online foi ampliada e 1.006 ocorrências de violência contra a mulher foram registradas em um período de 15 dias de isolamento. A ferramenta está funcionando. “Ampliamos a medida protetiva online. Assim que a mulher pede a medida protetiva, o policial deve entrar em contato com esta vítima”, assegurou a chefe de Polícia Civil do RS, delegada Nadine Anflor que afirmou que o número é alto, mas que mesmo assim há muita sub-notificação. Ou seja, muitas mulheres estão deixando de denunciar. Nos três primeiros meses de 2019, o Rio Grande do Sul registrou 15 feminicídios e neste ano, no mesmo período, 26.

O aumento de 73% nos feminicídios se deu nos três primeiros meses, mas março, quando iniciou o isolamento social, não exerceu influência, pois foram registrados 11 feminicídios, mesmo número que em março de 2019. Contudo, as autoridades concordaram que no aumento da convivência familiar, a tendência é o agravamento dos casos de violência. “Em relação aos feminicídios, desde meados de 2019, pegamos todas as mortes violentas de mulheres, analisamos caso a caso. Das 26 mortas, apenas duas tinham medidas protetivas. Então não há relação do aumento do feminicídio com o desencarceramento”, afirmou a delegada Tatiana Bastos, observando que canais alternativos para as denúncias estão sendo implantados.

A coordenadora da Comissão de Segurança e Serviços Públicos e da Força Tarefa contra o Feminicídio, Ariane Leitão, chamou a atenção para o fato de que Porto Alegre conta com apenas uma casa abrigo oficial para as vítimas e que o espaço, que era para receber o triplo de famílias, tem apenas 13 pessoas, devido à sua precariedade. Uma outra alternativa, lembrou, é a Casa Mirabal, que tem uma atuação espontânea, sem apoio estatal. “Trabalhamos durante a pandemia na articulação dos serviços, passando informações de como denunciar. A partir dessa semana, vamos começar a gravar vídeos estimulando as denúncias”.

Ações iniciadas

Os dados oficiais da Secretaria de Segurança Pública também não demonstraram aumento nos indicadores de violência doméstica durante o período de isolamento, mas a rede de proteção tem ampliado a atuação, devido ao histórico de aumento de casos em períodos em que as pessoas ficam em casa. Houve expansão de municípios atendidos pela Patrulha Maria da Penha da Brigada Militar de 46 para 84, no período. Mais de 200 policiais foram treinados. As visitas continuam. Em março, mais de 1.600 mulheres foram cadastradas e mais de 2.800 visitas, realizadas pelas patrulhas, segundo a Major Karine Soares, coordenadora da Patrulha Maria da Penha da Brigada Militar, que fez um apelo para que parentes e vizinhos de vítimas, denunciem. “Se a população chamar, mesmo que não haja ocorrência registrada anteriormente, a patrulha vai passar”. Em março, a patrulha fez 13 prisões por descumprimento de medidas protetivas. “São possíveis 13 feminicídios evitados”.

Apoio para as denúncias

O deputado Edegar Pretto, que coordena a Frente Parlamentar dos Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres e coordena o Comitê Gaúcho ElesPorElas, da ONU, observou que a violência contra a mulher está relacionada a afetividade dos homens que por ciúmes fazem vigília das mulheres, o que acaba dificultando que elas efetuem as denúncias. “Temos que ampliar as possibilidades denúncias por telefone ou online. Mas temos que nos preocupar também que durante a pandemia, para onde vão as mulheres vítimas? Deveríamos ter atenção especial para garantir espaço seguro para as vítimas”, defendeu. O deputado afirmou que também vai encaminhar ao governo do estado pedido para que locais como farmácias e supermercados sejam espaços de denúncias. “A exemplo de iniciativas em outros países, estes deverão ser agentes de transmissão da informação para o poder público”.

No mesmo sentido, a titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar de Porto Alegre, Madgéli Frantz Machado, destacou a campanha “Quarentena sem violência” que o Tribunal de Justiça vem realizando. Segundo ela, farmácias e supermercados, por não estarem fechados estão sendo utilizados para divulgar os telefones e canais de emergência. “Estamos em tratativas com a BM para que a Policia Comunitária nos auxilie na distribuição dos cartazes confeccionados”. No Estado foram registrados 32.245 pedidos de medidas protetivas. Segundo a magistrada, o tribunal realizou um levantamento e o número de presos soltos no período de isolamento não é de 3.800 como divulgado. “São 1.900 presos e o percentual elevado de apenados soltos não foi em função do Covid-19, mas porque já estavam em condições de progredirem de regime”.

Os atendimentos remotos também vem sendo feitos pela Defensoria Pública, que deixou de realizar atendimentos presenciais. Em Porto Alegre, por exemplo, as vítimas podem acessar pelo Alô Defensoria (3225.0777) e pelo Centro de Referência dos Direitos Humanos (3221.5503) ou pelo 0800.6445556. “Até este momento a maior procura tem sido por questões de saúde. No centro de referência de direitos humanos, psicóloga está atendendo de forma remota, conversando com vítimas”, frisou a defensora pública Liseane Hartman.

Também participaram da reunião os deputados Pepe Vargas (PT), Dirceu Franciscon (PTB), Sérgio Turra (PP), Franciane Bayer (PSB), Luiz Henrique Viana(PSDB), Gilberto Capoani (MDB), Sebastião Mello (MDB), Gerson Burmann (PDT), e Dr. Thiago Duarte (DEM).

Texto: Claiton Stumpf (MTB 9747)

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