sábado, 23 novembro
Foto Joaquim Moura

Sindicalistas, estudantes, médicos e auditores vinculados ao mundo do trabalho lotaram o Plenarinho da Assembleia Legislativa gaúcha, na manhã desta quarta-feira (4), em Porto Alegre, para discutir o objetivo do governo Bolsonaro de reduzir em 90% as chamadas Normas Regulamentadoras (NRs) em segurança e saúde no trabalho.

A proposta do governo federal, que a defende com o falso argumento de que as NRs são hostis às empresas, ao desenvolvimento econômico e à geração de empregos, foi destacada como mais um grande ataque aos trabalhadores e trabalhadoras. “Não bastasse os enormes prejuízos ao mundo do trabalho por meio da terceirização sem limites e das reformas trabalhista e da previdência, que jogaram por terra inúmeras conquistas civilizatórias do povo brasileiro, o governo Bolsonaro agora busca acabar com a normatização das regras que justa e exclusivamente buscam dar segurança e garantir a saúde daqueles que verdadeiramente produzem a riqueza no país. Novamente o governo tira de quem não tem e dá para o andar de cima em forma de menos custo e mais lucro”, avaliou o deputado estadual Valdeci, proponente da audiência, destacando que esse verdadeiro ganho financeiro às empresas virá, novamente, da precarização do trabalho.

O prazo de 30 dias para o debate com a sociedade sobre a proposta também foi duramente criticado. “Para uma discussão coerente precisamos no mínimo de 180 dias, com consulta popular e mais debates técnicos. E que nenhuma alteração venha a diminuir nossas condições de trabalho hoje”, sustentou Gerson Cardoso, dirigente do Sindipolo e membro do Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST). Para Cardoso, audiências públicas sobre o tema precisam ser repetidas em todos os estados brasileiros, como também a recomposição do orçamento de entidades como a Fundacentro, que estuda e promove a elaboração e gestão de políticas que visem a promoção da equidade social e proteção do meio ambiente laboral. “As NRs salvam vidas e não podem ser enfraquecidas”, defendeu o dirigente, que denunciou, ainda, que hoje o país conta com 2,3 mil fiscais do trabalho, sendo que o ideal seria cerca 8 mil.

Segundo Heloísa Rubenich, da Associação Gaúcha dos Auditores Fiscais (AGITRA), nos anos 1970, o Brasil foi o campeão mundial em acidentes de trabalho, o que obrigou o governo militar da época a criar as NRs e sinalizar à Organização Internacional do Trabalho (OIT) de que estava fazendo algo nesse sentido e atender as exigências do Banco Mundial para a liberação de financiamentos. Hoje, o país ocupa o 4º lugar, com milhares de óbitos por ano e um acidente a cada 49 segundos. “Quantos já ocorreram desde que começamos esta audiência?”, indagou a auditora, acrescentando que até o final da atividade pelo menos uma pessoa no país iria morrer por conta de sua atividade profissional. Rubenich revelou também  que, segundo um estudo do Ministério Público do Trabalho (MPT), por conta das subnotificações, esses números são quatro vezes maiores. “E ainda querem rediscutir em um mês normas que levaram anos para serem construídas”, criticou, acrescentando que a proposta do governo federal trará dificuldades – e até mesmo impossibilitando –  para que os auditores fiscais chequem até mesmo denúncias de trabalho escravo.

Para o presidente da CUT/RS, Claudir Nespolo, os empresários sérios estão preocupados com a estabilidade econômica, o crédito escasso, a logística e a melhora do mercado interno, e não com a retirada ou a flexibilização das NRs.. Para o dirigente cutista, o governo está, na verdade, dando uma satisfação ao que há de pior no segmento privado. “É direcionado a um segmento que, por um acidente da História, acabou assumindo setores importantes nos ministérios e na economia, abrindo o caminho para aquilo que na prática é trabalho escravo. Na prática é a construção do desenvolvimento com sangue e morte. É um setor que não representa o pensamento médio de quem quer construir o país e produzir com seriedade”, sustentou Nespolo.

As deliberações do plenário ficaram centradas na exigência do aumento do prazo para a discussão da matéria, a realização de audiências em todas as unidades da federação e que a Comissão de Saúde e de Meio Ambiente (CSMA) da Assembleia Legislativa envie uma recomendação à Secretaria Nacional do Trabalho avalizando a necessidade dessas ações.

O tema da audiência foi em atendimento a uma solicitação feita pelo FSST, instância que reúne as principais entidades sindicais e não sindicais representativas de categorias como bancários, petroleiros, metalúrgicos, químicos, telefônicos, aeroviários, trabalhadores da agricultura, entre outros.

As chamadas NRs que atualmente estão em vigor são resultantes de discussões tripartites, que envolveram representantes do governo, dos trabalhadores e da classe empresarial e foram sendo atualizadas ao longo do tempo conforme as mudanças ocorridas no mundo do trabalho. Elas regulamentam e disciplinam, por exemplo, procedimentos que devem ser seguidos para garantir a segurança e integridade física de quem trabalha em atividades cuja periculosidade pode oferecer riscos graves. “Mesmo com elas, no período entre 2012 e 2018, foram registrados 4,5 milhões de acidentes de trabalho no país, que resultaram em 16 mil mortes e mais de 38 mil amputações. Agora imaginemos como seria sem essas normas?”, questionou Valdeci, citando dados oficiais do MPT. “Eles podem nos tirar tudo, mas não roubarão nosso sonho de continuar na luta, finalizou o parlamentar.

Também participou da atividade, o deputado estadual Pepe Vargas (PT).

Texto: Marcelo Antunes (MTE 8.511)

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