sexta-feira, 22 novembro
Crédito: Joaquim Moura

Primeiro objetivo será a ampliação dos atendimentos para diagnóstico e tratamento.

Mais de três mil pacientes aguardam na fila de atendimento do único centro especializado no diagnóstico de doenças raras do Rio Grande do Sul, no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. O número de consultas disponibilizadas pela instituição, entretanto, é de 17 por mês. “Não temos tempo para esperar”, lembra Carina Zuge, que preside a Associação Gaúcha de Distrofia Muscular (Agadim) e participa do Conselho Estadual de Saúde. Para ela, assim como para os próprios médicos que atendem no Clínicas, a ampliação do acesso ao diagnóstico é a principal demanda a ser resolvida no curto prazo. “Sem fechar o diagnóstico, não adianta falar em acesso a medicamentos”, explica Carina.

Segundo Jonas Saute e Lavínia Faccini, ambos médicos geneticistas que atendem no centro de referência do Hospital de Clínicas, o número de consultas é determinado pela contratualização do SUS com o hospital, mas, segundo eles, é possível a ampliação do serviço. “O foco do trabalho da Frente deve ser o de ampliar as oportunidades de acesso ao diangóstico”, defende Faccini. “Existe capacidade técnica e de pessoal para isso”, reforça Saute.

Raras, mas muitas

Embora o nome sugira um incidência pequena, as doenças raras atingem algo em torno de 7% da população. São cerca de oito mil tipos diferentes de moléstias. As mais conhecidas são as Distrofias Musculares e a Atrofia Muscular Espinhal (AME), mas existem outras, como a Glicogenose e mesmo Doenças Intestinais Inflamatórias. Quase 80% das moléstias são genéticas.

Para organizar e dar visibilidade política a essas demandas, os deputados Luiz Fernando Mainardi (PT) e Valdeci Oliveira lançaram nesta quinta-feira (22) a Frente Parlamentar em Defesa de Políticas Públicas para Pacientes com Doenças Raras no âmbito da Assembleia Legislativa. “A Frente é uma forma de conscientizar a sociedade e ajudar na formulação de políticas públicas que respondam às necessidades desses pacientes, muitas vezes esquecidos e dependentes de atendimento e medicações que não são facilmente disponíveis”, explica. “Estamos aqui porque esta tarefa não diz respeito apenas a este ou aquele governo, deste ou daquele parlamentar, deste ou daquele partido. Esta tem de ser uma causa da sociedade. Não devemos apenas levantar o tema, mas pressionar pela sua resolução”, afirmou Valdeci.

Para Mainardi, a luta para que todos possam enfrentar com dignidade moléstias às vezes desconhecidas fora de centros especializados, exige persistência e continuidade. “É uma luta longa. Não se resolve só com definição de políticas públicas, embora isso seja fundamental. É preciso reconhecimento social e político das necessidades especiais das pessoas que sofrem com isso”, disse.

“Cada passo que damos nessa caminhada é muito importante. E o que deveria existir junto ao estado é uma Câmara de negociação e discussão permanentes”, sustentou Valdeci. O parlamentar lembrou que foi justamente esse um dos pontos reivindicados – e naquele momento acordado – quando da audiência realizada com a secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, em 19/6. “Quando se está perante a secretária, técnicos e assessores da área juntamente com as diversas associações que hoje estão presentes nesse ato, o discurso é muito bonito. Ficou acertado que a partir daquele dia se poderia estabelecer uma reunião a qualquer momento para tratar dos assuntos vinculados às doenças raras e ir resolvendo essas questões. Mas infelizmente parece que não se concretizou”, cobrou o parlamentar. “Por isso temos de exigir da Secretaria da Saúde esse canal contínuo de diálogo para diminuirmos a distância que existe entre a realidade do paciente e o que definitivamente é necessário”, completou.

Além de representantes das entidades de pacientes, participaram do lançamento da Frente médicos geneticistas do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, representantes do Conselho Municipal de Saúde, da Defensoria Pública, da OAB e os deputados Valdeci Oliveira (PT), Jeferson Fernandes (PT), Sofia Cavedon (PT), Luciana Genro (PSOL) e Tiago Simon (MDB).

Cortes em pesquisas prejudicam tratamentos

Outro aspecto apresentado pelos médicos do Hospital de Clínicas é o risco de cortes do governo federal em bolsas de pesquisas universitárias. Para o médico Jonas Saute isso ameaça a capacitação de profissionais e pode atingir aos pacientes. “O centro de referência no Hospital de Clínicas só existe porque existe a Universidade. E a Universidade está sob ataque. É um momento difícil. Isso pode afetar muitos tratamentos”, desabafa.

Ações

Ficou definido na reunião o apoio da Frente a projetos que interessam aos pacientes, incluindo emenda ao PPA que destina recursos para a ampliação da abrangência do Teste do Pezinho, que pode prevenir algumas das doenças raras. Hoje o teste feito no Rio Grande do Sul é capaz de identificar seis enfermidades. Casa seja mais abrangente, poderá identificar até 12.

Embora pareça uma medida banal, esse diagnóstico precoce pode, inclusive, diminuir o custo do tratamento futuro. Uma das pacientes presentes no evento, que sofre com Doença Inflamatória Intestinal, testemunhou que a falta de identificação precoce de sua moléstia significou um custo de R$ 32 mil por mês em medicação. Caso a doença tivesse sido diagnosticada precocemente, o custo seria algo em torno de R$ 70,00 por mês.

Os deputados e as entidades definiram, também, organizar uma audiência comum com as secretarias estadual e municipal de saúde conjuntamente com os gestores do Hospital de Clínicas de Porto Alegre para reformularem a contratualização do hospital com o SUS, o que permitirá ampliar o número de consultas e, portanto, o acesso ao diagnóstico.

Além disso, será convocada uma Audiência Pública para debater o uso medicinal da Cannabis, um dos únicos recurso para muitas dessas doenças e que ainda não tem o uso permitido no Brasil.

Texto: João Ferrer (MTE 8078) e Marcelo Antunes (MTE 8.511)

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