quarta-feira, 13 novembro

 

 

Entre os fatores de desigualdade que afetam a participação das mulheres na política está a violência política de gênero. Isso significa que, além das dificuldades históricas para se eleger, quando as mulheres chegam ao poder elas ainda enfrentam empecilhos para manter os cargos conquistados. Essas dificuldades foram abordadas na audiência pública promovida nesta quarta-feira (6/11) pela Comissão dos Direitos Humanos, presidida pela deputada Laura Sito (PT), que debateu o tema “Um Compromisso com a Democracia: Construindo um Protocolo de Combate à Violência Política”.
De acordo com o levantamento realizado pela organização Terra de Direitos e Justiça Global, as mulheres representam aproximadamente 13% dos cargos eletivos de todas as esferas políticas do Brasil (municipal, estadual e federal). A baixa representatividade e participação feminina na política nacional podem ser consideradas reflexos das desigualdades entre os gêneros presentes em tantas esferas da sociedade brasileira. “Somos mulheres que vivemos a violência política. Nossa chegada ao parlamento sempre foi muito questionada. O que me indigna é o silêncio das instituições, é a impunidade e a sensação de que eles podem nos ameaçar, nos interromper e está tudo bem. Quando nos ameaçam de morte, nos matam um pouquinho. Quando ameaçam nossas filhas, também nos matam um pouco”, afirmou a deputada Bruna Rodrigues (PCdoB), proponente da audiência.
Desde que iniciou na vida política, a parlamentar já recebeu diversas ameaças, assim como a sua filha. “O que fazer com uma mulher ameaçada? Ninguém sabe. O que fazer com a família, com a filha de uma mulher ameaçada? Ninguém sabe”, ponderou. Para Bruna, as instituições precisam assumir as suas responsabilidades. “Não dá para as mulheres denunciarem e chegarem no Ministério Público e o MP não oferecer a denúncia. Não dá para chegar na delegacia e enfrentar mais uma barreira”, sustentou.
A deputada Laura Sito, que também já recebeu ameaças de morte, afirmou que o Parlamento não é capaz de garantir que a atividade parlamentar esteja assegurada. “Desde que assumimos na câmara de vereadores, foram muitas as ameaças de morte. Ao sofrer ameaças, pouco ou nada é feito. Se pudermos iniciar com protocolos nos ambientes políticos, nós poderemos avançar, de fato, para um comprometimento das instituições porque designar uma viatura para estar na frente da minha casa ou um policial legislativo para acompanhar a deputada Bruna nas atividades legislativas é insuficiente. Voltamos para casa, para a periferia, todos os dias. Quem é que vai me proteger no Sarandi quando entro e saio da minha casa?”
Segundo o Inter-Parliamentary Union, o Brasil é um dos piores países em termos de representatividade política feminina, ocupando o terceiro lugar na América Latina em menor representação parlamentar de mulheres. No ranking, a taxa brasileira é de aproximadamente 10 pontos percentuais a menos que a média global e está praticamente estabilizada desde a década de 1940. “A gente quer que as mulheres acessem o poder e que permaneçam quando conseguem chegar lá. Não podemos deixar de citar a presidenta Dilma e toda a violência política institucional e pessoal que ela sofreu durante o golpe”, disse a presidenta do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, Marina Dermann.
De acordo com o levantamento realizado pela Terra de Direitos e Justiça Global, a violência política de gênero acontece em maior parte pelos oponentes ou colegas das mulheres por meio de ameaças massivas virtuais. A pesquisa ainda aponta que nos casos em que foi possível identificar o sexo do autor da violência, os homens aparecem como autores em 100% dos casos de assassinatos, atentados e agressões e em mais de 90% dos casos de ameaças e ofensas. A violência política de gênero acontece, na maioria dos casos, não em forma de agressão física, mas em ameaças, intimidação psicológica, humilhações e ofensas. “Não podemos naturalizar essa violência como uma violência corriqueira da sociedade brasileira. A violência política de gênero é uma violência contra o estado democrático de direito e nós precisamos assim pontua-la para que nós a enfrentemos de forma assertiva e de forma determinante para que ela não exista no cenário nacional”, sentenciou Maria das Neves, representante do Conselho Nacional de Direitos Humanos.

Ao longo da história global, as mulheres sempre foram afastadas da política e esse papel ficou reservado apenas aos homens. Isso leva a uma dinâmica de não reconhecimento das mulheres como iguais, o que faz com que sua dignidade seja o principal alvo de ataque. “É fundamental que esse debate ultrapasse essa audiência pública porque a legislação é muito positiva e vem trazendo a criminalização de atos que atentam contra a democracia. À medida em que temos mulheres e pessoas LGBTQIAPN+ que não podem exercer o seu posto de poder, estamos atentando contra a democracia”, afirmou a ouvidora da Mulher do Tribunal de Justiça do estado do Rio Grande do Sul, Jane Maria Vidal, que tem se dedicado a combater os casos de violência política e tentado garantir a segurança das mulheres na política.
“Para manter a representatividade a gente precisa também conscientizar a população de que o voto não é só um dever, mas um direito fundamental conquistado com muita luta e que é muito importante a gente saber exercer esse direito ao voto, justamente por isso, porque quem a gente vai eleger vai ser a nossa voz nos espaços político”, defendeu a representante do Núcleo de Defesa da Mulher da Defensoria Pública, Paula Britto Granetto.

O termo violência política é utilizado, segundo o levantamento realizado pelas organizações sociais de direitos humanos Terra de Direitos e Justiça Global, para caracterizar o emprego da violência para deslegitimar, causar danos, obter e manter benefícios e vantagens ou violar direitos com fins políticos. A violência constitui-se, assim, em um instrumento que desestabiliza e antagoniza a própria política enquanto experiência legítima e democrática. “Aqui no Brasil foi criado algo que é mais nefasto que as fake news, que é o deep nude, que é deep fake específico para violentar as candidatas mulheres, então temos a criação de conteúdos de vídeos que colocam os rostos das mulheres em situações degradantes, pornográficas e de pedofilia e isso traz uma preocupação que não tínhamos. A violência política nunca é estanque”, relatou a presidenta do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral (Igade), Francieli Campos.

 

Texto: Claiton Stumpf – MTb 9747

Foto: Roger Ribeiro Vieira

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