sexta-feira, 22 novembro

 

A adesão do Rio Grande do Sul ao Regime de Recuperação Fiscal proposto pelos governos Temer/Bolsonaro e as consequências para a situação financeira e fiscal do Estado motivaram o deputado Miguel Rossetto a propor e realizar, na quinta-feira (30/11) uma audiência pública na Comissão de Finanças, Planejamento, Fiscalização e Controle.

Assinado no final de janeiro de 2022, a medida chegou a ser comemorada pelo próprio governador Eduardo Leite, que na época afirmou: “A recuperação fiscal do Estado já está acontecendo, e isso é percebido por todos, com os salários em dia, os investimentos que estão acontecendo. Mas a negociação com a União da dívida que o Estado tem é ponto importante para que o Estado do Rio Grande do Sul possa dar solução definitiva aos seus problemas mais graves da estrutura financeira e possamos então ter a segurança de um destino melhor para todos os gaúchos.”

Alertado pela Bancada do PT de que assinatura do acordo com a União era nociva para o desenvolvimento e as finanças públicas gaúchas, uma vez que obrigou o Estado a abrir mão de ações judiciais que contestavam os valores da dívida, além de uma série de contingenciamentos de investimentos e da perda de autonomia nas decisões, em menos de dois anos, o governador Leite, sem assumir seu erro, agora afirma que o RRF vai inviabilizar a economia gaúcha e transfere a responsabilidade para o Governo Federal.

Para o deputado Miguel Rossetto preservar as receitas públicas fazem parte das obrigações de governos que tem responsabilidade legal e ética de atender as orientações constitucionais que traduzem direitos da população. Os estados tem que construir, defender e sustentar receitas adequadas ao cumprimento das exigências da Constituição. “Nós não acompanhamos a ideia de destruição do estado de bem-estar social, do movimento democrático feito pela sociedade gaúcha, pela sociedade brasileira em busca de uma qualidade de vida e de um progresso baseado em direitos fundamentais.”

O parlamentar ressaltou que a capacidade de buscar receitas adequadas ao cumprimento dessas exigências se articula com a capacidade econômica dos Estados e que esse equilibrio é fundamental. “Há um abandono perigoso e insustentável por parte do governo sobre a agenda econômica do RS. Não há nenhum esforço ou dedicação para o crescimento econômico do nosso Estado, base fundamental para o crescimento da receita.”

Rossetto afirmou ainda que a capacidade de busca receita não vem sendo tratada de maneira adequada pelo Governo Leite e citou a negociação dos recursos da Lei Kandir, em que o governador abriu mão de valores importantes para o Estado. Ele citou também o episódio da aprovação do Orçamento Estadual para 2024 com diversos itens que descumprem os preceitos constitucionais, no caso dos investimentos mínimos em Saúde, Educação e Ensino Superior. O parlamentar assinalou que não nenhum movimento para ampliar a arrecadação e menos de uma semana depois, o governador envia um Projeto de Lei para aumentar as alíquotas de ICMS.

Presente da audiência pública, a secretária da Fazenda, Pricilla Santana reafirmou que o Regime de Recuperação Fiscal foi essencial para a economia gaúcha. Pricilla ressaltou ainda que o Governo Federal à época não ofereceu nenhuma outra opção e criticou a suspensão do pagamento da dívida pelo governo Sartori, que seguiu no primeiro mandato de Eduardo Leite. A secretária responsabilizou ainda o corte de ICMS unilateral promovido pelo Governo Federal. Na época, nem a base do Governo Leite na Assembleia Legislativa, nem os aliados na Bancada Federal levantaram qualquer óbice.

O líder da Bancada do PT, Luiz Fernando Mainardi destacou a fala da secretária que contradiz o governador e a crítica que fez ao não pagamento da dívida pelas gestões do MDB e PSDB. Mainardi afirmou que a dívida pública gaúcha está paga há anos, mas este fato, foi ignorado pelo governador Eduardo Leite, que abriu mão das medidas judiciais impetradas para contestar os valores. “O primeiro grande baque nas finanças públicas do nosso Estado foi a Lei Kandir, que retirou receita. Os estudos que nós temos, feitos por técnicos do próprio Estado, dão conta que o nosso crédito, aquele que nós deveríamos ter recebido do Governo Federal, porque ele fez política econômica, gerou extraordinários superávits na balança comercial, bombou o Brasi, às custa de quem? Dos Estados! E esse é um Estado exportador, que deveria ser compensado e só foi minimamente, com foi o nosso caso. Por isso jamais deveríamos ter aberto mão deste questionamento.”

Mainardi questionou ainda a decisão do governador Eduardo Leite que dizia que o comprometimento com a receita de pessoal, que nunca ultrapassou o limite prudencial de 48% serviu de justificativa para o maior arrocho salarial da história do RS. “Agora volta o discurso como ameaça para lidar com uma arrecadação baixa, provocada inicialmente pelo governador. Ele abriu mão de continuar 30% e passou para 25%. Houve uma decisão baseada nas eleições. São dois posicionamentos oportunistas, do governador em função das eleições e das alíquotas que foram baixadas nacionalmente, também em função da eleição de Bolsonaro, que foi quem propôs.”

O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), Cláudio Martinewksi afirmou que entidade foi procurada para tratar da adesão ao RRF e criou um grupo com técnicos da Fazenda, do Tribunal de Contas do Estado (TCE/RS) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) há dois anos. Martinewksi questionou a secretária que afirmou não haver alternativa ao RRF e afirmou que os alertas não foram ouvidos.

Miguel Rossetto lembrou que em 1999, o então governador Olívio Dutra denunciava o acordo da dívida com a União que comprometia 13% da receita do Estado por mês. Depois o governo Tarso, junto com a presidenta Dilma Rousseff, renegociou o indexador de dívidas favorecendo os Estados. Rossetto ressaltou que o Governo Federal, através do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mantém aberta uma mesa de negociação para tratar do RRF.

 

Aumento de impostos

Sobre a reforma tributária e o Projeto de Lei 534/2023, que propõe aumento de alíquotas do ICMS, a secretária Pricilla explicou que a situação financeira do Estado está vinculada ao equilíbrio fiscal. A titular da Fazenda alertou sobre as necessidades de atualizar o ICMS, que estão vinculadas às Leis Complementares 192 e 194, decididas pelo governo federal em 2022 e pela própria reforma tributária. Segunda ela, a perda, no cenário sem aumento do ICMS, será de R$ 5 bilhões e quem não mexeu nas alíquotas perdeu arrecadação.

Conforme Pricilla, o cenário nacional, de 2021 a perda de arrecadação foi de R$ 43 bi, passou para R$ 38 bi em 2022 e agora, em 2023, para R$ 36 bilhões. Para justificar o PL 534, Pricilla reforçou o fato de que o RS, na atualidade, tem a menor participação no bolo tributário nacional. Ela responsabilizou as novas regras da reforma tributária pelo aumento das alíquotas do ICMS para evitar as perdas no futuro.

Para o deputado Miguel Rossetto o texto da Reforma Tributária é claro ao afirmar que acima da alíquota nacional definida pela reforma, todo e qualquer aumento de percentuais, ficará integralmente com o Estado.

A desoneração das empresas para evitar que as empresas deixem o Estado em função da guerra fiscal está no fim, destacou o deputado Mainardi, porque a partir da Reforma Tributária haverá uma nova repartição do bolo tributária, que passará a ter a tributação no produto final e não mais na origem. O líder da Bancada do PT questionou se o governo Leite não está fazendo uma avaliação do futuro, com base em critérios que a partir da reforma serão alterados.

 

Texto: Adriano Marcello Santos
Foto: Joaquim Moura

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