Uma audiência pública híbrida para debater as consequências da alteração do perfil de empreendimentos no Desenvolvimento Urbano de Municípios do Litoral Norte, foi realizada na segunda-feira (12/6) no Memorial do Legislativo. A iniciativa é dos deputados Sofia Cavedon, Jéferson Fernandes, Adão Pretto, Valdeci Oliveira e Laura Sito e foi aprovada pela Comissão de Assuntos Municipais da Assembleia. Os parlamentares atenderam ao pedido de diferentes grupos, coletivos e organizações da sociedade civil, preocupadas com o crescimento desordenado daqueles municípios, com a alteração de planos diretos sem consulta prévia à população e a desfiguração das cidades-balneários.
Conforme manifesto lido pela deputada Sofia Cavedon, que presidiu os trabalhos, assinado pelo movimento Xangri-Lá Vive, a prefeitura daquele município não consegue atender a demanda por serviços básicos de saneamento, coleta de lixo, trânsito e serviços locais de saúde. O texto afirma que o processo de elaboração do Plano Diretor, apesar de prever a participação da população nas definições, não têm atendido às demandas da sociedade, principalmente nos quesitos ambiental e sustentável, tampouco na infraestrutura necessária para resolver o adensamento populacional, servindo apenas aos interesses do setor imobiliário e da construção civil. O texto citou o embargo na Justiça do Plano Diretor de Torres, com as mesmas características e o Termo de Ajuste de Conduta assinado pela prefeitura de Xangri-Lá, depois de apontado o risco de construção em áreas de preservação permanente e da verticalização exagerada das construções.
Sofia citou a preocupação com a manutenção das características naturais do Litoral Norte gaúcho e lembrou que o processo de privatização da Corsan coloca em dúvida se haverá os investimentos necessários para garantir coleta e tratamento de água e esgoto na região. A parlamentar citou o caso do litoral catarinense, que tem praias contaminadas devido, principalmente, a grande densificação e a perda de solo natural.
O deputado Jeferson Fernandes afirmou que apesar dos planos diretores municipais não serem da alçada do Parlamento Gaúcho, o apelo feito por cidadãos da sociedade civil, junto ao fato de te se tratar de uma região que é frequentada pela maioria dos gaúchos no verão, revelou que o caso de Xangri-Lá, não é isolado, mas tem se repetido em outros municípios litorâneos. “Nós estamos percebendo que várias cidades gaúchas de flexibilização de normas ambientais, em nome do exclusivo crescimento econômico, quando é necessário considerar o o menor impacto ambiental possível. Por isso, inclusive, o estudo prévio é fundamental”, destacou. Para o deputado, o discurso ideológico e sedutor de geração de emprego, não tem vindo acompanhado dos possíveis impactos, principalmente no ambiente natural.
Jeferson assim como Sofia também lembrou que, ao contrário do que fora publicizado nas redes sociais, o prefeito de Xangri-Lá, Celso Barbosa foi convidado a estar presente na audiência. “Eu estou há quatro mandatos como deputado, nós nunca cometemos o desrespeito com o poder público municipal, de deixar um prefeito de fora dos debates” asseverou.
Com uma apresentação em Power Point, o professor do Departamento de Engenharia Mecânica da UFRGS, Darci Campani, integrante do Movimento Xangri-Lá Horizontal mostrou a diferença entre as opções de plano diretor, comparando Capão da Canoa, que optou pela verticalidade e hoje tem a praia sombreada e Xangri-Lá que manteve uma urbanização horizontalizada garantindo o máximo de insolação na areia. Campani afirmou que as experiências de horizontalização já estão provocando alterações climáticas nas cidades, em geral, barrando o vento marítimo e tornado as cidades mais quentes. Outro problema apontado pelo professor diz respeito ao aumento populacional e a falta de água potável para garantir o abastecimento de uma população com previsão de ser cinco vezes maior. Campani chamou atenção para a legislação que exige sustentabilidade, como o Estatuto das Cidades e a necessidade do controle social de qualquer alteração nos planos diretores. O professor denunciou que o Governo do Estado não tem cumprido suas prerrogativas junto aos municípios, nos temas que requerem planejamento ambiental. Na apresentação, o professor afirmou ainda que há ausência de controle e regulação das condições ambientais, problemas de mobilidade da população, afetada pela construção das edificações, além da ausência de previsões sobre a estrutura urbana.
A representante do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB/RS), Bruna Tavares, também falou utilizando uma apresentação de Power Point, onde destacou que a situação de flexibilização das normas ambientais na elaboração dos Planos Diretores, já não é uma exceção. Para a arquiteta, muitas prefeituras têm agido como porta-vozes do setor privado e este comportamento atende a demandas do mercado imobiliário e ignora completamente o Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001).
O promotor de Justiça Cláudio Ari Pinheiro de Mello, com longa atuação no setor de Habitação e Ordem Urbanística do Ministério Público Estadual, chamou atenção para a regulamentação existente nas leis brasileiras, em especial com base no Estatuto das Cidades, sendo boa parte construída com conhecimento técnico e científico do setor. Para Mello, o conceito de desenvolvimento precisa sempre estar submetido ao conceito de sustentabilidade e o protagonismo do desenvolvimento urbano é do poder público, que regula as iniciativas privadas. O promotor também destacou o papel da participação e do controle social, como um imperativo para as políticas urbanas no Brasil.
Para a presidenta da Fundação Gaia, a bióloga Lara Lutzenberger é situação do Litoral Norte é crítica e este é um momento de inflexão e escolha. Segundo ela, a concepção de que é a construção civil é que gera emprego e desenvolvimento é bastante ingênua quando não mal-intencionada. Lara defendeu o regramento, mas disse que o problema não se resume a verticalização, mas sobretudo ao adensamento populacional que ameaça o ambiente dessas regiões.
O deputado Jeferson Fernandes retomou a palavra para denunciar que há um esforço de deputados da base do Governo Leite em destruir com a Fepam, porque na visão desses parlamentares, os estudos técnicos, os pareceres e laudos que impedem a destruição do meio ambiente, são o grande problema do RS. “Há uma discussão preliminar para um novo zoneamento ecológico e econômico do Rio Grande do Sul e não é para melhorar. Isso foi anunciado numa audiência pública, pela secretaria estadual de Meio Ambiente e nós cobramos que este debate tem que ser público. ”
Sofia disse que a audiência teve muito conteúdo. Adorou o conceito de “envolvimento sustentável”. Ao encaminhar disse que é preciso propor audiência do Ministério Público para fazer escuta institucional em que possa “criminalizar e ajuizar”. “Queria encaminhar que a primeira iniciativa nossa fosse uma audiência do MP. Se não for, nós encaminhamos uma audiência pela Assembleia em Xangri-Lá”. O segundo encaminhamento foi de solicitar todas as denúncias que estão no MP sem resposta, relativas à ocupação fora da lei. “Temos que fazer um protocolo formal, levando os relatórios que foram apresentados na audiência, pois o MP precisa monitorar”, disse. Por terceiro, disse, acolhendo uma sugestão, criar uma Comissão Legislativa Institucional Comunitária para Diagnóstico Técnico-ambiental das Limitações Ambientais do Litoral Norte. E pensar junto com os deputados os instrumentos que podem ser utilizados. “Pensei em uma subcomissão e me comprometo a conversar com os deputados para pensar que instrumentos utilizar”. Por fim, outro encaminhamento, foi de pensar para o segundo semestre um seminário.
Texto: Adriano Marcello Santos
Foto: Debora Beina