Debater a fome, causas, buscar soluções, compartilhar experiências, trocar informações e ouvir quem está na ponta do atendimento social, pois diante da falta de ações, dados e mecanismos de acompanhamento por parte dos governos, cabe à sociedade somar esforços e pressionar para minimizar esse grande problema e indicar diretrizes para políticas públicas de segurança alimentar. E neste sentido, Santa Maria sai na frente e abre o calendário de atividades. Nesta segunda-feira (16), na Câmara de Vereadores local, foi realizada a abertura do seminário preparatório à VIII Conferência Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do RS, que acontece entre os dias 27 e 28/7, em Porto Alegre, e que antecede o encontro nacional. Fruto de uma parceria entre o Parlamento gaúcho e Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional do RS (CONSEA-RS), tais seminários serão realizados em todas as regiões do estado. Cidades-polo como Pelotas, Passo Fundo e Caxias do Sul já confirmaram a realização de seus encontros para as próximas semanas. E muitas outras estão se organizando. Desses encontros é que sairão uma diversidade de propostas – que dialogam com as áreas da educação, saúde, renda e emprego, entre outras – que deverão ser entregues, inclusive, aos candidatos e candidatas aos legislativos e executivos estadual e nacional, além de propor a criação de políticas públicas. Só no RS – campeão na produção de alimentos – são mais de 1,2 milhão de pessoas que sobrevivem abaixo da linha da pobreza.
“Se trata de um tema sério, urgente e não podemos permitir a naturalização da fome. E não apenas com solidariedade, que é importante, mas com políticas sérias que deem conta de enfrentar a falta de comida sobre as mesas de uma parcela considerável de irmãos e irmãs. Ter acesso a alimentos de qualidade e quantidade suficientes não se trata de caridade, mas de direitos, de dignidade e de cidadania”, avaliou o presidente da Assembleia, deputado Valdeci Oliveira (PT), em sua fala na abertura dos trabalhos. Valdeci lembrou que a questão do combate à fome é também uma questão política, de escolhas. “Apresentamos no início de 2020 um projeto para a criação de uma política estadual para garantir pelo menos o mínimo necessário às parcelas socialmente mais vulneráveis. Indicamos como fazer, mostramos a fonte dos recursos, etc. Mas, depois de ser aprovado em todas as Comissões de mérito do parlamento, a proposta, faz mais de ano, está parada na Comissão de Economia, pois não há interesse de segmentos e setores que ela seja aprovada”, explicou o deputado. Pela proposta de Valdeci, os recursos a serem utilizados viriam do Fundo Ampara, criado para este fim e que hoje possui mais de R$ 400 milhões em caixa. “Com esses recursos, seria possível atender as 355 mil famílias gaúchas que sobrevivem abaixo da linha da pobreza com duas parcelas de R$ 400 e sobraria dinheiro para canalizar aos outros segmentos previstos. Não estamos defendendo auxílio para quem tem, mas para quem não tem nem como alimentar os filhos. E esse é apenas um exemplo entre vários outros que podem ser colocados em prática”, avaliou, acrescentando que a sociedade precisa se organizar e exigir medidas práticas dos poderes públicos.
“A fome tem gênero, raça e classe social. Ela afeta principalmente as mulheres, os negros e negras e, por óbvio, os pobres.Estudo realizado em todo o país pela Rede PENSSAN, que é integrada por pesquisadores de várias universidades brasileiras, aponta que há no país cerca de 19 milhões de pessoas que passam fome. Esses encontros que estamos fazendo por todo estado não são apenas para combater a fome, mas para restabelecer e avançar em políticas que existiam e eram eficientes”, afirmou Juliano de Sá, presidente do Consea-RS. “Aqui estão presentes aqueles e aquelas que dão suporte ao que as ações dos governos não conseguem assegurar. Não fossem eles, a fome seria mais devastadora. Temos de convencer os agentes públicos de que não podemos, enquanto sociedade, estar ausentes neste processo. Não podemos fechar os olhos para isso”, frisou o presidente do legislativo santa-mariense, Valdir Oliveira.
Em Santa Maria, a reunião, que continuaria ao longo da manhã, contou com as presenças de representantes do Ministério Público Estadual, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), do Projeto Esperança/Cooesperança e ONGs e entidades vinculadas ao acolhimento de pessoas em situação de rua, catadores de materiais recicláveis, associações e hortas comunitárias e restaurantes populares – sendo que muitos desses atores o fazem de forma anônima e voluntária. A atividade também foi acompanhada por lideranças políticas como o padre Júlio, prefeito de Itaara, os vereadores Ricardo Blattes, Flavius Dajulia e Plabo Milani, respectivamente de Santa Maria, Bagé e Formigueiro, além do secretário de Saúde de Paraíso do Sul, Juliano Machado.