Na sessão plenária extraordinária na tarde desta quarta-feira (2), que discutiu o PL 224/2018 do governo Eduardo Leite (PSDB) prevendo a extinção da Secretaria de Desenvolvimento Rural, Pesca e Cooperativismo (SDR), incorporando-a à Secretaria da Agricultura, e da Secretaria do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável com a da Infraestrutura, os deputados do PT se posicionaram contra as medidas. A matéria acabou aprovada pela base de apoio do atual governador por 36 votos contra 13.
“A fusão da secretaria do Meio Ambiente com a secretaria de Infraestrutura vai nos levar a ferirmos o princípio da segregação ao colocar no mesmo órgão a competência de fiscalização e execução de projetos que devem ser fiscalizados e regulados. Ora, a secretaria que vai desenvolver ações de infraestrutura, por exemplo, para a realização de obras de pequenos barramentos em pequenas propriedades do Estado, é a mesma secretaria que estará sob o comando do mesmo secretário, que vai fazer a fiscalização sobre isso. Não pode a mesma secretaria executar e fiscalizar. Não pode uma obra pública ter uma só empresa a fazer uma obra e a mesma empresa fiscalizar. Quem executa não fiscaliza. O próprio governo federal, que lançou a primeira ideia de extinção da Ministério do Meio Ambiente recuou e uma das razões foi exatamente essa”, destacou o líder da bancada petista Luiz Fernando Mainardi.
Sobre a extinção da SDR, Mainardi lembrou à base do novo governo: “Quem criou pela primeira vez um órgão para a pequena propriedade e deu o nome de ministério foi Fernando Henrique Cardoso, quando criou o MDA e criou o Pronaf. Aqui está a primeira contradição programática do PSDB, em propor a extinção da SDR, da secretaria que tem 380 mil pequenos agricultores, que tem que ser muito bem cuidados”, alertou o parlamentar. Para exemplificar a necessidade de haver um órgão próprio para o segmento, Mainardi citou o caso do setor leiteiro no estado. “Olhemos o que está acontecendo com relação aos nossos produtores de leite. Mais de 25 mil já abandonaram as propriedades. Precisamos de uma atenção diferente, a secretaria da Agricultura é uma, a secretaria do Desenvolvimento Rural é outra. O campo é muito forte e precisa de duas secretarias”, defendeu.
Outra dura crítica ao projeto partiu do deputado Altemir Tortelli, principalmente pelo fato que ambas as estruturas – SDR e Agricultura – possuírem naturezas distintas. Para o parlamentar, não ter um instrumento, secretaria ou representação que coordene a ação dentro de um governo, assim como equipes técnicas que deem suporte a essas políticas, “perde-se a autoridade, a representatividade e a condição efetiva das políticas que construímos nas últimas duas décadas”, frisou, salientando que o projeto se trata de um verdadeiro retrocesso. “É importante que fique claro, que fique registrado que, não reconhecendo esse destaque, estamos diante de um início de um governo que diz claramente que a agricultura familiar não é importante nem estratégica para o Rio Grande do Sul”, disse Tortelli.
Tortelli lembrou que há mais de 30 anos vem acompanhando a criação de um conjunto de políticas publicas voltadas à agricultura familiar, verdadeiros avanços construídos juntamente com cooperativas, sindicatos e ONGS. “Essa luta foi fundamental para conquistarmos espaços nas estruturas do estado e fazendo com que estas compreendessem a importância para o desenvolvimento de setores que historicamente não tinham apoio e pudessem ser assistidas pelo poder público brasileiro”, recordou.
Tortelli também lembrou que foi a partir do MDA e do Pronaf que outras políticas públicas se estruturaram e se dinamizaram em todo o país, principalmente nos governos Lula e Dilma, mas que infelizmente foram sendo destruídas nos últimos dois anos pela gestão de Michel Temer (MDB). “Em quase todo o Brasil existem espaços e secretarias específicas para o apoio da agricultura familiar, quilombolas, indígenas e reforma agrária. São resultados de uma caminhada histórica e da sensibilidade de vários parlamentos e governos”, assegurou Tortelli.
O deputado Jeferson Fernandes destacou que “não podemos deixar passar duas questões que são fundamentais do ponto de vista de políticas públicas. Uma delas é a extinção da SDR, que incentiva e fomenta o setor mais importante para o interior gaúcho”, explicou. Segundo Fernandes, a grande maioria dos municípios depende direta ou indiretamente da agricultura familiar. Para ele, estas famílias, responsáveis pela produção de cerca de 70% dos alimentos consumidos, que já enfrentam dificuldades no campo, sem políticas específicas de incentivo serão obrigadas a migrarem para o meio urbano. “Não adianta dizer que vão colocar a agricultura familiar num apêndice dentro da Secretaria da Agricultura, porque isso é o mesmo que Temer fez quando extinguiu o MDA, que acabou destruindo uma série de políticas voltadas ao setor. Não é uma questão ideológica. Afinal, o MDA e o Pronaf criados no governo FHC.
“A SDR é uma secretaria que dialoga com a agricultura familiar, atividade econômica das mais importantes do Rio Grande do Sul. Nossa visão é que esta fusão é equivocada. Este setor responde por mais de 85% do PIB dos municípios gaúchos, e tem características e situação próprias, justamente pela importância social e econômica que ocupa, por isso requer uma política e espaços próprios”, avaliou o deputado Zé Nunes. Dessa forma, de acordo com ele, sem um órgão próprio, o setor deixa de ter uma função estratégica para o desenvolvimento do Estado. Ao lamentar a proposta do novo governo, Zé Nunes lembrou que a agricultura familiar emprega quase um milhão de pessoas e gera mais de R$ 9 bilhões para a economia gaúcha, enquanto que a não familiar emprega pouco menos de 240 mil pessoas e gera R$ 7,6 bilhões.
Zé Nunes questionou também se a mudança em relação à Secretaria do Meio Ambiente seria compatível – legal e eticamente. “Deve-se questionar se a proposta visa melhorar a gestão ambiental no sentido da proteção ecológica ou apenas busca ‘destravar’ projetos e obras de interesse do governo e de setores da economia, que funcionariam de forma mais célere tendo o mesmo gestor. Ao que tudo indica a fusão atende mais a interesse econômicos do que de proteção ambiental”, declarou, alertando que é preciso ter o cuidado de não correr o risco de subordinar os órgãos ambientais aos interesses setoriais, da economia e da produção.
Texto: Marcelo Antunes (MTE 8511)