O governo Leite e seus aliados aprovaram, na sessão plenária desta terça, 29, o Projeto de Lei 260, que libera o uso de agrotóxicos no Estado que têm seu uso proibido nos países onde são fabricados. A bancada do PT votou contra o projeto por entender, que na prática, esta liberação vai colocar mais veneno no prato da população. A liberação dos agrotóxicos foi aprovada por 37 votos favoráveis e 15 votos contrários.
O deputado Edegar Pretto observou que projeto muda a lei estadual aprovada em 1982, fruto de longo debate da sociedade com o deputado Antenor Ferrari. Na época, ouviu-se a academia, a representação da agricultura, engenheiros agrônomos, técnicos da Secretaria Estadual da Saúde e Secretaria Estadual do Meio ambiente. Quase 42 anos depois, a legislação ainda representa uma vanguarda nacional, pois elevou o RS ao patamar de países da Europa, que já debatiam a vida e não apenas o lucro de poucos. “Discutiam como países desenvolveriam técnicas seguras sem a necessidade de veneno que trouxessem ainda mais casos de câncer e disfunções hormonais O RS se antecipou à legislação nacional, vedando agrotóxicos proibidos no país onde são produzidos Agora por uma medida do governador Leite, veio para a AL em regime de urgência para ser votada em 30 dias”, afirmou Edegar, que chegou a reunir-se com o governador Eduardo Leite para entregar documento assinado por 242 entidades contra o projeto.
O deputado Jeferson Fernandes leu o parágrafo da lei de 1982 que colocou restrição a agrotóxicos que venham para nosso país e não são autorizados em seus países de origem. “Veja que me parece uma questão lógica que em 1982 Antenor Ferrari e um seleto grupo de pessoas e parlamentares protegia a saúde da nossa população. Não existe essa questão de proibição do uso de agrotóxicos, no entanto, se o país que fabricou não autorizou lá, não está autorizado aqui. É regredir aprovar esse projeto. De lá para cá o ambiente está mais protegido ou não do uso intensivo de agroquímicos?”, indagou.
O vice-líder da bancada petista, deputado Luiz Fernando Mainardi, comentou que esse talvez seja o mais importante projeto em debate neste ano, pois diz respeito à vida, que exige posicionamento ético. É um projeto que deveria ser estudado, pois se os agrotóxicos são proibidos nos países onde são produzidos, é porque criam graves problemas à saúde, são cancerígenos e geram mutagênese. “Isso nos parece uma espécie de vírus de longo prazo, que mata aos poucos. Mainardi questionou qual a razão que levou o governo a propor a mudança da legislação para permitir a utilização de venenos que comprometem a natureza e a vida das pessoas. “Se são proibidos nos países que os produzem, porque é que os legisladores brasileiros vão dizer que aqui pode?”, indagou, justificando que a bancada vota contra porque isso vai intoxicar os próprios produtores. O lucro acaba indo para os produtores dos insumos e não fica com quem produz.
Presidente da Comissão de Economia, o deputado Zé Nunes, que é engenheiro agrônomo, alertou que agrotóxicos ou defensivos agrícolas não são remédios. “Existe diferença entre o princípio ativo para combater uma praga a um remédio. Se o governo pretende com esse projeto resgatar a dignidade do campo, eu acho que o governo do estado ao acabar com a SDR já mostrou que não olha para o campo. Esse discurso de que esses produtos não são usados nos seus países de origem por conta do clima é um equívoco”, destacou. Zé Nunes reforçou que a lei atual é muito avançada, porque nós hoje estamos vendo os mercados dos produtos brasileiros se fechar por conta do alto índice de agrotóxicos utilizado.
O deputado Fernando Marroni disse que o PL 260 provoca muita tristeza e preocupação, pois contraria a Constituição do Estado e constitui um retrocesso ambiental. “A regra que criava uma barreira protege a saúde, a população e o meio ambiente. A lei vigente abriu caminho para uma legislação federal, portanto foi vanguarda”, lembrou. Marroni afirmou que “ao aprovar a lei em 1982, a Assembleia Legislativa seguiu a tendência de mercados europeus, onde os mercados estão cada vez mais controlados e a população mais desenvolvida não quer se envenenar”. Segundo o deputado, os países de origem observaram que esses produtos eram causadores de câncer e outros problemas de saúde. Ainda conforme o parlamentar, de 2008 a 2020, a Fepam indeferiu 38 pedidos de agrotóxicos. “Agora é muito temerário e estranho o que está acontecendo, que se queira aumentar substância tóxicas que possam prejudicar a saúde dos gaúchos e gaúchas”.
Titular da Comissão de Saúde e Meio Ambiente da ALRS, o deputado Valdeci Oliveira disse que este projeto não deveria estar na pauta neste momento, porque não deveria ter essa pressa, essa urgência diante do grande impacto muito grave na saúde e no meio ambiente do RS. “Esse PL já teve parecer contrário em julho de 2020, da Divisão de Agrotóxicos da Fepam. A Divisão de Vigilância Sanitária/CEVS também emitiu parecer contra a alteração da 7.747/1982. E julgamento muito próximo em que ministros do STF tiveram avaliação muito semelhante. Vejam o que a ministra Carmen Lúcia disse na tramitação final de um dos processos em uma das ações julgadas, em 2018, sobre a decisão da Fepam de manter proibição do agrotóxico Paraquat. “Pelo princípio da prevenção, acautela-se contra danos possíveis de serem previstos. Pelo princípio da precaução, previnem-se contra riscos de danos que não se tem certeza que não vão ocorrer”.
A falta de argumentos consistentes para sustentar a liberação de agrotóxicos proibidos nos países de origem foi ressaltada pela deputada Sofia Cavedon. De acordo com a parlamentar, mais de 800 agrotóxicos são liberados no RS e apenas 38 foram vedados. “Nos parece que há um vasto plantel que evidencia que o RS é extremamente competitivo no agronegócio. Não tem problemas de produção. Não há razão para isso. Resta a dúvida sobre o impacto na saúde da população”, argumentou. Sofia lembrou que em audiência pública com universidades e institutos federais muitos órgãos técnicos afirmaram que pelo princípio da precaução não deve ser liberada a utilização destes venenos. “Quero chamar a atenção que a Agapan fala que o último estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva verificou que, na pandemia, o volume de mortes teve influência dos agrotóxicos que fragilizam o sistema imunológico”. Conforme a deputada, os gaúchos receberam em 2020 uma carga 148.396 toneladas de agrotóxicos e as empresas fabricantes destes venenos tiveram R$ 182 milhões de isenção fiscal.
Líder da bancada, o deputado Pepe Vargas disse que está em jogo duas visões que tem se demonstrado antagônicas. “Eu vejo muitos aqui defenderem uma visão produtivista primitiva, que não leva em consideração, que é perfeitamente possível em sintonia com a produção, a preservação da saúde humana e do meio ambiente”, ponderou. Pepe argumentou que é sabido que agrotóxicos são substâncias que geram impactos no meio ambiente e na saúde humana e que podem gerar graves impactos tanto agudos como crônicos na saúde humana. “A pergunta que tem que ser colocada aqui é a seguinte: o RS é sabidamente um grande produtor de alimentos, tanto no agronegócio, exportador, quanto para o mercado interno. E há 40 anos temos essa legislação, ela atrapalhou o desenvolvimento da agricultura gaúcha? Evidentemente que não. O inseticida que mata uma praga aqui mata em qualquer lugar do mundo, a única diferença será o volume de inseticida a se usar. Eduardo Leite envia um projeto que se rende ao produtivíssimo primitivo e aos interesses das empresas que vendem agrotóxicos. Isto não é moderno, é atrasado”, criticou.
Ao encaminhar o voto contrário da bancada do PT, o deputado Edegar afirmou que tem concordância com algumas questões como a de que os agricultores não usam os agrotóxicos porque querem, pois sabem que o veneno faz mal, causa câncer, má-formação de fetos, alterações hormonais. Ele citou pareceres da Fepam, que afirma que a liberação destes venenos “caracteriza retrocesso ambiental e prejuízos para a Saúde” e o parecer da Divisão de Vigilância da Saúde do Estado, que afirma que “estes produtos fazem mal”. Edegar também fez uma crítica ao governo. “Eduardo Leite está perdendo a oportunidade de se diferenciar do governo federal. É ou não é a mesma postura do ex-ministro Ricardo Salles, que disse que ia aproveitar o momento para passar a boiada?”. Para finalizar, o parlamentar lembrou os colegas deputados que defendem a produção agrícola em larga escala que os assentados da reforma agrária no RS são os maiores produtores de arroz orgânico da América Latina sem utilização de uso de agrotóxicos. “É isso que eu quero para o meu estado: alimentação saudável para todos”.
Texto: Claiton Stumpf (MTB 9747), Eliane Silveira (MTE 7193) e Raquel Wunsch (MTE 12867)