O atual presidente da Companhia Riograndense de Saneamento, Roberto Barbuti, foi trazido sob encomenda pelo governador Eduardo Leite (PSDB) para implodir a Corsan pública. Homem de confiança do sistema financeiro, com carreira construída em bancos privados nacionais e estrangeiros, o presidente que gasta com aluguel em Porto Alegre mais do que ganha de salário, não está no RS por acaso. Veio fazer o serviço infame de entregar aos ávidos “investidores privados” o filé mignon do pouco que ainda resta de estatais gaúchas.
O que fica evidente com os movimentos realizados a partir da posse de Barbuti na presidência da estatal, é que o governador já tinha a Corsan na mira dos seus projetos de privatizações. Atingir as metas do chamado Novo Marco Regulatório do Saneamento foi apenas uma boa desculpa encontrada para buscar minimizar o impacto do anúncio de uma traição. Afinal, Leite havia empenhado a sua palavra diante da opinião pública durante o processo eleitoral, jurando de pés juntos que não a venderia.
Na frente administrativa, o senhor Barbuti está escandalosamente utilizando dinheiro público para preparar a entrega da Corsan aos futuros acionistas privados. Para tanto, tem usado e abusado do expediente de dispensa de licitação e inexigibilidade para contratar ao seu bel prazer serviços advocatícios e de consultoria a peso de ouro. Em 19 contratos firmados em 2020 e 2021, a imensa maioria por inexigibilidade, serão gastos mais de R$ 32 milhões de reais. Analisando o objeto de alguns desses contratos, fica evidente a desfaçatez da utilização de vultosos recursos públicos para atuar contra o interesse público. É a certeza de que o crime compensa.
Somente o escritório de advocacia Carvalho, Machado e Timm Advogados, do RS, abocanhará a generosa quantia de R$ 5.370.000,00 para dar suporte especializado nas negociações com os municípios (TC 229/20). Essa é uma ação preventiva à crise jurídica gigantesca que surgirá junto às prefeituras com as quais a Corsan possui contratos de programa, caso se consume a privatização. O escritório de advocacia Lefosse Advogados, de SP, receberá a quantia de R$ 1.627.935,90 para oferecer assessoria jurídica especializada na venda do capital acionário da Corsan (TC 090/21). Já a empresa MZ Consult, também de SP, receberá R$ 916.500,00, através de assessoria para prestação de serviços técnicos especializados visando o desenvolvimento da área de relação com os “investidores”(TC 040/21). A empresa Abdo, Ellery & Associados, de Brasília, receberá R$ 500.000,00 para elaborar Notas Técnicas para processos futuros de Revisão Tarifária (TC 063/21).
Todos os contratos referidos acima foram firmados através da inexigibilidade. Esta modalidade de contratação direta, que deveria ser uma exceção mediante sólida justificativa, se transformou na regra. Estamos diante de um escândalo de grandes proporções que não pode ser acobertado pelo manto da legalidade. Os demais órgãos de fiscalização e controle (MP, TCE, MPC) precisam se manifestar sobre esses fatos. Esses procedimentos nebulosos, que já envolveram gastos de milhões em recursos públicos, caminham em uma única direção: a liquidação de 70% do patrimônio público da Corsan, subordinando os interesses coletivos à voracidade de meia dúzia de investidores privados.
O último governador que ousou cometer tamanha afronta ao povo gaúcho foi politicamente banido deste estado. O senhor Antônio Britto virou umapersona non grata em território gaúcho após os processos de privatizações que conduziu, contribuindo sobremaneira para a crise financeira sem precedentes que o RS vive hoje. Espero, sinceramente, que o atual governador não tenha a mesma sina. Para tanto, basta ter a grandeza de cumprir com as suas palavras e recolocar os interesses do Rio Grande acima de benefícios privados. Ainda há tempo.
Jeferson Fernandes, Deputado estadual (PT), presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Água Pública