quarta-feira, 27 novembro

O Dia Nacional de Conscientização sobre Esclerose Múltipla, 30 de agosto, foi marcado na Assembleia Legislativa pela realização de uma audiência pública e pela exibição, em sessão especial de pré-lançamento, do documentário Esclerosoda não é a avó. A atividade foi promovida pela Comissão de Saúde e Meio Ambiente, por iniciativa do deputado Valdeci Oliveira (PT). O curta-metragem, dirigido pelas jornalistas Erenice de Oliveira e Marcia Denardin e pelo cineasta Luiz Alberto Cassol, retrata a vida de mulheres diagnosticadas com a doença, que é progressiva e incapacitante. Na obra, quatro delas (Aline Souza, Bruna Rocha Silveira, além de Erenice e Márcia) falam – como pacientes ou como familiar cuidadora – sobre as angústias, desafios, cuidados, capacitismo e discriminações sociais que emergem diante de uma doença crônica, e também sobre as vitórias em um cotidiano dificultado por estigmas e rótulos. “Não somos um rótulo, uma estatística. Temos identidade e importância para as pessoas que nos rodeiam. Muitas vezes, não podemos fazer coisas simples como lavar a louça ou varrer, mas somos capazes de fazer outras coisas”, apontou Márcia. “Teve um dia que eu falei para minha mãe que eu iria raspar a minha cabeça (….) porque as pessoas respeitam quem tem câncer. Quem tem esclerose múltipla não, porque ninguém sabe o que é”, relata Bruna no filme. Segundo apontado pelos presentes, pesquisas indicam que 80% da população desconhece a moléstia e como ela se manifesta.

A esclerose múltipla é uma doença neurológica, crônica e autoimune, ou seja, as células de defesa do organismo atacam o sistema nervoso central, produzindo lesões cerebrais e medulares. Atinge principalmente mulheres e jovens e é a segunda causa de afastamento do trabalho nesta faixa etária. “Não é uma doença de idosos e nem uma sentença de morte. Não há cura, mas há tratamento, cuja eficácia é maior quando a doença é diagnosticada logo”, frisou Márcia. “Não somos portadores de EM, nós temos EM e precisamos de respeito. Não temos o privilégio de poder esperar (diagnóstico e medicamentos)”, destacou Ricardo Farias, paciente e presidente da Associação Gaúcha de Pessoas com Esclerose Múltipla (AGAPEM). O diagnóstico, no entanto, tem sido o principal obstáculo enfrentado pelas pessoas com esclerose múltipla. Segundo Farias, normalmente os doentes vivem uma verdadeira saga. “Achar um médico que entenda da doença nem sempre é fácil. E depois disso, temos outra batalha, que é lutar pelo fornecimento dos medicamentos em dia”, revelou.

O neurologista Jefferson Becker, coordenador do Comitê Brasileiro de Tratamento e Pesquisa em EM, ressaltou que a gama de medicamentos para tratar a doença aumentou muito nos últimos anos, mas que as dificuldades para obtê-los também. Segundo ele, pacientes têm, sistematicamente, pedidos negados pela Secretaria Estadual de Saúde e pela Justiça. Ele defendeu a criação de um protocolo de tratamento para o Rio Grande do Sul, além da desburocratização do atendimento multidisciplinar para evitar o vai e vem de pacientes por diversos estabelecimentos de saúde para fazer o acompanhamento da doença. “Ter dois surtos por ano (o que é comum na conjuntura hoje posta) é inadmissível, pois vai acumulando incapacidades enquanto podemos oferecer treatamento”, protestou Becker. Já o defensor público Tiago Rodrigo dos Santos, que também é paciente, defendeu a criação de centros especializados em Neurologia e atendimento de pacientes com EM. Para ele, “Todo atraso pode ocasionar em uma lesão no cérebro e levar à dependência (da pessoa acometida) de parentes ou cuidadores. E isso não é bom para ninguém, nem para as famílias nem para o próprio estado (em termos de custos)”, afirmou.

“Além das ações necessárias que precisam ser tomadas pelos governos em termos de políticas públicas, esta audiência demonstrou que a sociedade gaúcha e brasileira precisa debater muito mais sobre a esclerose múltipla, que é invisível, degenerativa e que precisa ter seu diagnóstico feito de forma rápida e precoce. O estado, enquanto ente público, seja na esfera municipal, estadual ou nacional, precisa urgentemente enxergar essas pessoas, assumir sua obrigação. Pelo documentário aqui apresentado, pelos depoimentos dados, experiências relatadas e pelas condições das pessoas com EM – necessidade de judicialização para acesso a medicamentos, isolamento e preconceito, entre outras -, podemos dizer que foi uma audiência pública histórica”, avaliou Valdeci Oliveira.

No final do encontro, o parlamentar propôs como encaminhamento a realização, a ser requerida pela Comissão de Saúde, de uma reunião com a secretária de Saúde, Arita Bergmann, para discutir a adoção de um protocolo que atenda desde a disponibilização de medicamentos a consultas, respeite os prazos e as características do tratamento e para discutir a possibilidade de criação de centros especializados em esclerose múltipla. Também será realizado audiência em Santa Maria (que tem maior índice de diagnóstico de EM por 100 mil habitantes – o RS tem mais do que o dobro da média nacional) para articular a reabertura do ambulatório para atendimento da EM no Hospital Universitário (HUSM) e avaliar o papel do Hospital Regional, que ainda conta com parte de sua estrutura ociosa, neste contexto. Articular a distribuição e divulgação do documentário para hospitais e profissionais de saúde também constou na deliberação dos presentes, público este formado majoritariamente por pacientes e familiares.

Em seu percurso de festivais, Esclerosada Não é a Vó recebeu, recentemente, o Cisne de Ouro de Melhor Documentário no Festival de Curta Metragens de Santo Ângelo (RS), participou de Categoria Especial no Festival Guarnicê, do Maranhão, e será apresentado, em outubro, no Festival de Jaraguá do Sul (SC) como Documentário Convidado. Nesta quarta, o documentário foi selecionado para integrar a Mostra SESC e deverá ser exibido nas atividades culturais da entidade em todo o país.

Texto: Marcelo Antunes – MTE 8.511 – (51) 9 8029.0146
Fotos: Christiano Ercolani

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