Silvicultura: Comissão de Saúde vai realizar nova audiência para discutir alterações no zoneamento 

A realização de uma nova audiência pública para dar continuidade ao debate sobre as mudanças que estão sendo propostas pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente para o zoneamento da Silvicultura do RS foi o principal encaminhamento da audiência pública da Comissão de Saúde e Meio Ambiente, que discutiu o tema na noite de quarta-feira (25/05), por proposição dos deputados estaduais petistas Jeferson Fernandes e Miguel Rossetto. A necessidade de um novo encontro se justifica, conforme os proponentes, pela não apresentação detalhada da proposta do governo e a comparação com o atual zoneamento pelos participantes, entre os quais, representantes da Fundação Estadual de Proteção Ambiental, Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural, Conselho Estadual do Meio Ambiente, Secretaria Estadual do Meio Ambiente, Movimento Coalizão pelo Pampa, entre outras entidades. “A silvicultura tem importância econômica e pelo impacto ambiental que gera. Já temos legislação neste sentido. Por isso, temos de ter cuidado ao alterá-la para que não haja perdas ao meio ambiente. Neste sentido, é fundamental ouvir os especialistas e compreender com bastante clareza o que está sendo proposto e o que está em jogo. Por isso, um novo encontro se faz necessário”, explicou.

A audiência iniciou com falas da secretária estadual do Meio Ambiente, Marjorie Kauffmann e do secretário adjunto, presidente do Conselho Estadual do Meio Ambiente, Consema, Marcelo Camardelli, que fizeram um histórico das etapas de elaboração e avaliação do novo projeto de zoneamento nos órgãos do Estado, desde 2008.

Opositores da proposta defenderam o atual modelo de zoneamento, implementado em 2009, questionaram o fato de as alterações terem sido elaboradas por iniciativa de empresários do setor de florestamento, a partir de empresa contratada; solicitaram mais prazo para discutir a ideia de ampliação de limites de plantação, o tamanho do maciço e o espaçamento entre as plantações. “Não podemos aceitar um projeto meramente submetido aos interesses econômicos. O atual zoneamento foi fruto de um consenso de todos os setores, que saíram ganhando do ponto de vista técnico e científico”, disse Paulo Brack, representante da Coalizão do Pampa. Ele lembrou que a silvicultura ocupa 1 milhão de hectares, tendo tido um crescimento de 1500%, enquanto o Bioma Pampa, onde se localiza boa parte desta, perdeu 29,6%, num período de 37 anos.

Segundo Luís Augusto Alves, da Associação Gaúcha de Empresas Florestais, Ageflor, entidade que representa toda a cadeia florestal do RS, o setor preserva 50% das suas áreas e atende à legislação ambiental, atuando com empresas certificadas internacionalmente. “Setor que depende do meio ambiente não pode ser a favor de degradação”, argumentou.

Domingos Antônio Velho Lopes, da Federação de Agricultura do Estado do RS, Farsul, e presidente da Câmara Técnica de Agropecuária e Agroindústria do Consema, um dos órgãos que avaliou as alterações, argumenta que já na instalação do primeiro zoneamento houve a prerrogativa de que a revisão do mesmo ocorresse 5 anos após, o que não houve. Ele também rebateu a alegação de que houve pouco tempo para discussão da proposta. “Em 2022, início do ano, tivemos reuniões ordinárias e extraordinárias sobre o tema. Não existe a possibilidade em absoluto da citação de que não houve tempo”, rechaçou.   Lopes destacou ainda o fato de a Consulta Pública sobre o novo projeto ter recebido 215 contribuições. “Nunca houve nenhuma consulta com mais de 50 contribuições. E tivemos 175 de 215 contribuições favoráveis, 26 indefinidos e 17 contrárias”. Ele admitiu que a Câmara Técnica irá avaliar a questão da ampliação dos maciços, como recomendam os ambientalistas.

Representando o Ministério Público do RS, a promotora de Meio Ambiente, Dra. Anelise Steigleder salientou que o tema é importante porque se refere à normatização do ordenamento do território. “É uma grande oportunidade trabalhar ordenamento porque se consegue viabilizar as alternativas de desenvolvimento e as vulnerabilidades”, opinou. Ela informou que o papel do órgão tem sido na perspectiva procedimental e que, no caso dos maciços, alertou o grupo para a necessidade de atenção a essa questão na nova proposta. “Ficamos felizes de saber pelo Domingos que isso será revisto. É um documento que vai fazer muita diferença, que vai dar segurança jurídica para os empreendedores”, sublinhou a promotora. A pedido dela, a Consulta Pública que era de 30 dias passou a 60 dias.

Simone Azambuja, da Agapan, argumentou que o zoneamento atual foi fruto de um trabalho intenso de muitos especialistas do RS. “A gente estranha que se invista tanto no aprimoramento dos nossos técnicos e especialistas para depois não se dar o devido valor ao trabalho que eles produzem”, criticou reportando-se à ideia de revisão do zoneamento. Ela argumentou que a fauna e flora gaúchas levam anos para se adaptar. “A fauna possui territórios nítidos. Eu não acredito que isso tenha se modificado tanto desde a vigência do primeiro zoneamento”, afirmou.

Alten Teixeira, da Universidade Federal de Pelotas destacou que o agronegócio é o setor que menos gera empregos, por conta da utilização de maquinário, e questionou “por que estamos fazendo reflorestamento. Está faltando papel ou empregos?”. O pesquisador também rejeitou a ideia de ampliação de plantio de eucaliptos num cenário de secas no RS. “O Estado tem seca; e estamos fazendo plantio de árvores com grande consumo de água? Esses plantios são colonialistas porque nós exportamos pasta de celulose e não o papel”, alertou Teixeira, lembrando que, em 2022, o Brasil importou R$ 800 milhões em papel. “Ficamos sem água, com poluição, entregamos a pasta de celulose e compramos o papel. Está na hora de pensarmos numa economia circular, que aproveita, que recicla, ao invés de linear, que destrói”, disse Alten.

Marjorie Kauffmann reforçou que a sociedade está representada no Consema por força da legislação e, assim como o representante da Farsul, reiterou que o debate sobre as alterações não se deu apenas no período de 60 dias de Consulta Pública, mas em 3 anos. Ela ponderou que, embora produzido pelo setor produtivo, o projeto teria sido elaborado por técnicos da Ufrgs. “Não existe invenção de fazer o zoneamento da silvicultura. A gente está cumprindo a Lei”, decretou a secretária, solicitando que todas as considerações da audiência pública fossem encaminhadas à Sema para serem avaliadas pelos Conselheiros do órgão.

Texto: Andreia Martins

Foto: Vanessa Vargas