Em oitiva durante a reunião da Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia, presidida pela deputada Sofia Cavedon, foi concedida oportunidade ao diretor da Escola Estadual de Educação Básica Erico Verissimo, no município de Jacutinga, Flávio Gabardo, defender-se publicamente das acusações de injúria racial que motivaram seu afastamento da função, por decisão da Secretaria Estadual de Educação. Gabardo responde processo administrativo depois de ler artigo do colunista José Roberto Guzzo, intitulado “À sombra da corrupção sem limites” publicado na revista Oeste, onde afirma: “ (…) o Brasil do progresso, entre Mato Grosso e Rio Grande do Sul, incluindo São Paulo e Rio de Janeiro, preferiu Bolsonaro. O Brasil da senzala, entre Bahia e o Maranhão, ficou com Lula”.
Assim que o diretor afastado encerrou sua defesa, o deputado Leonel Radde, membro titular da Comissão, leu o Artigo 20 do texto da Lei 7.716/1989 que tipifica os crimes de racismo e injúria racial. Na sequência o parlamentar também leu trecho do artigo lido pelo diretor e transmitido pela Rádio Campinas, onde Gabardo era comentarista. Em seguida, Radde passou a informar aos membros da Comissão, o teor de diversos outros comentários feitos pelo diretor na mesma emissora.
“O senhor pode achar o que quiser sobre o tema ‘senzala’, mas é um termo racista. O senhor fala tanto em perseguição política e o senhor tem uma linha política clara aqui. Mas vamos supor que o senhor foi mal interpretado a primeira vez na vida, a primeira vez que o senhor falou algo polêmico. O senhor chamou o governador do Estado do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, que é seu chefe hierárquico, de ‘calcinha apertada do Rio Grande do Sul’ (…), outro comentário seu na rádio. LGBT fobia é crime também, análogo à Lei 7716, conforme o STF”, alertou Radde.
O deputado seguiu lendo outras declarações homofóbicas de Gabardo na rádio: “ O grande problema é que os movimentos LGBT transformaram inclinação ou opção sexual (sic), numa bandeira política populista e esquerdista. (…). Eu conheço gays que abominam esses movimentos, por promoverem a promiscuidade e a baixaria, como se todo gay tivesse que agir dessa forma. É por isso que usar a homossexualidade como uma bandeira política no ocidente, em pleno século XXI, é na minha opinião, falta de consistência, politicamente é ridículo. Quase ninguém liga o que adultos fazem entre quatro paredes. Eduardo Leite revelou que é gay. Com quem ele dorme, é problema dele. Quem transforma saída do armário em manifestação política e quem faz a crítica pelos mesmos motivos, esses não passam de cafetões da viadagem”.
Por fim, Radde ressaltou ao diretor a recente onda de ataques em escolas, com facas, machados e armas, para ler outro comentário feito na mesma emissora, sobre o bullyng: “Eu ando de saco cheio da geração mimimi. Se brigasse na rua (falando do seu tempo) e chegasse chorando, apanhava de novo. Um amigo meu me disse outro dia, sou de pele escura, muito mais negro que branco, nem por isso morri por causa das piadas de preto. Assim como era engraçado rir de outros casos, hoje soa como preconceito”. O deputado lembrou que o Brasil é o país que mais mata negros no mundo. Ainda sobre o tema do bullyng, Radde leu ainda outro trecho de comentário transmitido pela rádio: “ Saí de casa as 17h para andar de bicicleta, voltei lá pelas 19h. Não tinha celular e meus pais não tinham contato comigo. Claro que apanhei ao chegar em casa. Graças a Deus que não existia Conselho Tutelar para me proteger”. O parlamentar lembrou que trata-se de um professor de escola infantil fazendo esse tipo de afirmação.
A deputada Laura Sito, que também preside a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, participou da oitiva e considerou que alguém que foi eleito por uma comunidade escolar com mais de mil estudantes, que recebe uma função gratificada do Estado para ser diretor de escola, não tem como ser dissociado do cargo que ocupa. “É um equívoco, tratar dessa maneira, apenas um subterfúgio para tentar fugir de responder administrativamente. O senhor responderá enquanto diretor de uma escola que foi a uma rádio propagar ideias que atingem o povo, que retiraram a humanidade de uma parcela, que inclusive é a maior parcela da sociedade brasileira, de fato, não devem ser ideias que devem ter espaço em meios de comunicação e aqueles e aquelas que compactuam com essas ideias, não é liberdade de expressão, é crime. Deve ser respondido na esfera penal. É disso que nós estamos falando aqui”, afirmou.
Laura também se solidarizou com a vereadora do PT de Jacutinga, Sandra Mari Soares, que foi uma das denunciantes e agora sofre perseguição na cidade. “Liberdade de expressão tem limite. É quando fere uma pessoa, um grupo. Defender liberdade irrestrita é uma forma feroz de opressão”.
Assim que o comentário que gerou a denúncia de injúria racial foi feito, em novembro do ano passado, o diretor entrou com um pedido de licença saúde na 9° Coordenadoria Regional de Educação. A medida não impediu que o processo de afastamento fosse levado adiante pela Seduc e agora se encontre na Procuradoria Geral do Estado.
Texto: Adriano Marcello Santos
Foto: Joaquim Moura