Fotos: Mauro Mello
A cobrança de dívidas anteriores a regularização da conta de luz em bairros de baixa renda da Região Metropolitana; os serviços de manutenção inconsistentes, que não resolvem os problemas nos postes e na fiação; além da demora e a falta de retorno das demandas dos consumidores, foram os principais problemas apontados na audiência pública que tratou do atendimento da concessionária CEEE-Equatorial.
Protocolada em conjunto pela presidenta da Comissão de Segurança, Serviços Públicos e Modernização do Estado, deputada Stela Farias e pelo deputado Pepe Vargas, membro titular, a audiência lotou o Plenarinho da Assembleia Legislativa. Entre os presentes estavam moradores dos bairros Onze de Abril, Jardim Porto Alegre, Porto Seco, Vila Amazônia, Loteamento do Bosque, Lomba do Pinheiro, Condomínio Marista, localizados em Alvorada, Viamão e Porto Alegre.
A deputada Stela Farias, na abertura da audiência lembrou que exatamente há um ano, a Comissão de Serviços Públicos, realizou reunião similar para cobrar o péssimo serviço e a demora no atendimento do grupo Equatorial que havia adquirido a estatal CEEE. A parlamentar também afirmou que a empresa foi alvo de ação civil do Ministério Público Estadual. “São constantes as falhas na distribuição e no fornecimento de energia por parte da Equatorial em municípios da Região Metropolitana e eu posso falar por Alvorada e Viamão, cidades onde eu vivo e transito com frequência diária. Os problemas não acontecem apenas em períodos de intempéries climáticas, quando bairros inteiros ficam sem luz por mais de uma semana, até mesmo quando os clientes mudam de endereço, vem enfrentado semanas de vai e vem, com atendentes desinformados e orientações desencontradas para ter a luz ligada no novo endereço, problema que antes da privatização era solucionado em 24 horas” destacou a presidenta da Comissão.
Para o deputado Pepe Vargas, a privatização da CEEE Distribuidora marcou o declínio na qualidade dos serviços prestados à população. O parlamentar também cobrou o trabalho de fiscalização das agências de regulação, criadas para acompanhar a prestação de serviços estatais privatizados. “Desde que foi privatizado, o serviço, objetivamente, piorou muito. Essa é a realidade. Ou são estabelecidas penalidades severas ao que está acontecendo, para a empresa sentir no bolso o resultado desse péssimo atendimento e qualificar o serviço, ou ficará a visão de que para o interesse do consumidor ela não serve para coisa alguma. É preciso medidas urgentes, pois a quem o cidadão vai recorrer? O que a Assembleia Legislativa pode fazer a não ser fazer a denúncia, colocar luz sobre o problema? Quem tem o poder de estabelecer multa, procedimentos é a Agência Reguladora ou o MP. Independente de eventual ação, qualquer consumidor pode entrar, por dano econômico ou moral, mas a agência reguladora tem que tomar providência”, cobrou o parlamentar.
Compondo a mesa da audiência, a vereadora de Alvorada Giovana Thiago trouxe uma lista nominal de moradores dos bairros de Alvorada, onde o procedimento de regularização das ligações de luz, transformaram os usuários em devedores de dívidas contadas antes mesmo de qualquer relógio ser instalado na residência. “ No ano passado, a comunidade do Onze de Abril em Alvorada nos procurou. É uma comunidade que tem 100% de tarifa social da Corsan, porque comprovou que é de baixa renda. Quando houve a privatização, uma equipe da CEEE-Equatorial foi colocada para fazer a regularização. A comunidade sempre expressou sua vontade de que fosse regularizada os serviços, inclusive pela valorização dos seus imóveis. Foi informada que seria cobrada somente a partir do procedimento. No final do ano, começaram a aparecer dívidas em nome dessas pessoas que recém haviam regularizado o serviço. Nós temos multas que vão de R$ 1.200 até R$ 12 mil. Numa comunidade, onde os ganhos médios, não ultrapassam um salário mínimo”, afirmou.
A denúncia da vereadora foi confirmada pelo representante dos moradores do bairro Onze de Abril, Vinícius Olmes. Segundo ele, os funcionários das empresas que visitaram a comunidade garantiram que a conta só seria cobrada a partir da instalação do medidor. “Foi regularizado, colocado o relógio, recebi as contas dos três meses seguintes, então minha esposa foi verificar no site da empresa, não foi nenhum documento para nossa casa e lá estava avisando que havia uma multa de quase R$ 9 mil. Procurei a CEEE-Equatorial para tentar resolver e essa dívida foi mantida”, contou.
O vereador de Viamão, Alex Boscaini, convidado para a audiência chamou atenção para a precariedade dos serviços prestados pela CEEE-Equatorial no município. Segundo o vereador, além do trabalho mal feito, gerar novas chamadas, há demora no atendimento dos usuários. “A nossa comunidade tem falta de energia por longos períodos, além de afetar a vida das pessoas, afeta o comércio local. O mau atendimento continua acontecendo sistematicamente. Há um ano fizemos audiência pública em Viamão e houve a promessa de melhoria dos serviços, o que não aconteceu. Os serviços quando são feitos, são mal executados, desde a troca de postes, a fiação pendente. Se a solução era privatizar a CEEE, isso já aconteceu e os serviços não melhoraram”, cobrou.
Os problemas com a CEEE-Equatorial não estão circunscritos ao perímetro urbano, o deputado Zé Nunes, informou que há três semanas, houve uma audiência na Câmara de Vereadores de São Lourenço do Sul, com agricultores bastante indignados com os péssimos serviços e a demora no atendimento, ao ponto, dos próprios usuários fazerem a manutenção. “Eu tive relato de um agricultor que já religou cinco vezes, ele mesmo a energia. Vocês imaginam o perigo que isso representa? A CEEE-Equatorial só atende em horário comercial, fora dele, é dificílimo ser atendido. Nós tínhamos uma resolução da Aneel que orientava a instalação de rede elétrica somente pela estrada. Isso caiu por terra e a linha vai por qualquer lugar, o que é um problema, porque quando precisa fazer manutenção, o acesso é mais difícil! Há também dificuldade na compensação da geração de energia solar, ” ressaltou o deputado.
A precarização da CEEE enquanto era empresa estatal feita com vistas a sua privatização, foi destacada pelo deputado Adão Pretto Filho, ao responder ao deputado Issur Koch (PP) que justificou a precariedade dos serviços, afirmando que o grupo Equatorial havia herdado os problemas apontados na audiência. “ A gente sabe que a empresa CEEE tinha problemas e nós tínhamos algumas críticas, mas era infinitamente melhor do que é agora. Se tu ligavas para o 0800 era atendido, quando falta luz, era questão de horas. Agora nem precisa chover e já falta luz. Eu tenho recebido inúmeras reclamações. A demissão de servidores qualificados e a terceirização dos serviços, precarizaram o serviço, “ cobrou o deputado.
O Núcleo de Defesa do Consumidor da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, Rafael Magnanin, informou que o órgão tem feito mutirões públicos para atender a população e 40% dos problemas estão relacionados a cobrança da conta de luz pela CEEE-Equatorial. “Quando eles nos procuram, numa condição de bastante desespero, porque eles nos mostram as faturas com uma cobrança retroativa, com alguma multa. E o relato deles, é que em algum momento deste diálogo, há uma ruptura da informação. Eles chegam até nós sem conhecimento do porquê, ” relatou. Magnanin revelou que há uma fraude em curso, quando os consumidores acessam um falso site da CEEE-Equatorial, emitem um boleto, pagam e descobre que esse valor não foi para a empresa, mas para terceiros.
Muito aguardada, a fala do gerente de Regulação e Mercado da CEEE-Equatorial, Lázaro Soares limitou-se a apresentar um Power Point com o conjunto de operações da empresa a partir do segundo semestre de 2022. O gerente justificou as denúncias apresentada da audiência pela situação do setor elétrico, quando a empresa foi adquirida. “Nós estamos falando de uma empresa que estava com a rede, ela ainda está, em situação precária, uma situação que se degradou por anos, por falta de manutenção e investimento”, afirmou. Soares prometeu investimentos para os próximos anos, sem, no entanto, dizer objetivamente como os problemas apontados na audiência seriam resolvidos.
Como encaminhamento da audiência, a presidenta da Comissão, deputada Stela Farias, vai reunir com a direção da empresa para buscar soluções, principalmente para as cobranças indevidas. A parlamentar cobrou a ausência de representantes do Ministério Público Estadual, responsáveis pela ação civil e com poder para cobrar legalmente providências da empresa. Stela também cobrou que a Agergs passe a atuar com mais determinação, uma vez que as medidas adotadas até o momento, foram insuficientes. “ Esse é a quarta audiência com a CEEE-Equatorial que eu acompanho, desde o ano passado. Nós agora, vamos documentar tudo que foi apresentado hoje aqui pelas lideranças comunitárias, seguiremos mais uma vez até a direção da empresa para uma solução dialogada e se isso não acontecer, vamos tomar providências judiciais, porque não dá mais para as comunidades seguirem pagando por dívidas que muitas vezes, sequer foram contraídas pelas pessoas e que na maioria dos casos, são populações de baixa renda, que querem o serviço regularizado” concluiu a parlamentar.
Texto: Adriano Marcelo Santos