CSSP formará GT para ajudar empregados de Empresas terceirizadas em débito com direitos trabalhistas

Foto: Vanessa Vargas

A formação de um grupo de trabalho com a participação de representantes do Sindicato dos Trabalhadores Terceirizados em Asseio e Conservação do Estado do RS, do Ministério Público do Trabalho, do Legislativo e relacionados à prestação de serviços terceirizados foi o principal encaminhamento de audiência pública da Comissão de Segurança, Serviços Públicos e Modernização do Estado, que discutiu a Precarização dos Serviços Terceirizados nos órgãos Públicos das 3 esferas,  na manhã desta quinta-feira (1407). O encontro foi proposto pelo vice-presidente da Comissão, deputado Jeferson Fernandes (PT), que recebeu inúmeras denúncias de irregularidades praticadas por empresas que mantêm contratos, inclusive a Assembleia Legislativa. “Só com entes públicos, são cerca de 50 mil trabalhadores terceirizados. Milhares em situações terríveis e desumanas pela exploração inescrupulosa de empresas que, infelizmente, não são responsabilizadas”, lamentou o parlamentar.

O presidente do Sindicato da categoria, Francisco Roso iniciou a fala rogando por uma nova forma de o estado considerar os trabalhadores das empresas terceirizadas. “Que deixem de vê-los como postos de trabalho. Eles não são números em planilhas, são pessoas com nomes e famílias”, ressaltou. Ele citou uma série de situações em que empresas “mal-intencionadas” atrasam salários, não pagam direitos dos trabalhadores e, quando pressionadas, “quebram”, deixando essas pessoas sem o recebimento desses encargos. “A empresa que presta serviços no Daer saiu sem pagar as rescisões. E pior: recentemente, ganhou contrato do Ipê e da Secretaria de Agricultura”, narrou o sindicalista. Ele acrescentou que os abusos são ainda mais graves, uma vez que, mesmo sem receber, os trabalhadores obrigam-se e/ou são coagidos a seguirem trabalhando, na expectativa de serem mantidos na nova empresa que assumirá um novo contrato, geralmente ligada ao proprietário anterior, mas com diferente CNPJ. “Eles dizem que quem não for trabalhar não vai atuar na nova empresa. Os trabalhadores viram reféns desses empresários”, denunciou.

Roso também contou que funcionários terceirizados do Hospital de Pronto Socorro e da Secretaria Estadual de Educação e Cultura estão há 3 meses sem receber direitos. “Na Assembleia tinha a empresa AnaClau, que sumiu sem pagar ninguém. A Alergs nos respondeu que usou o dinheiro referente às parcelas da empresa para pagar o que seria a multa pelo não cumprimento do contrato. Ou seja, a Assembleia ganhou duas vezes: com a prestação do serviço e com o não pagamento da fatura”, detalhou. Para o sindicalista, é necessário fiscalização rigorosa sobre as empresas que prestam serviços, desde o início do contrato, treinamento para essa tarefa, além da responsabilização do fiscal pelo erro administrativo. “O Estado não cobra nada dessas empresas, que estão enriquecendo às custas da exploração dos trabalhadores”, criticou Roso, que resumiu: “O Estado está preocupado com a prestação do serviço e não com o trabalhador. Chega de abuso, chega de descaso e humilhação. Que este dia seja o início da mudança”.

Evaristo Heis, advogado do Sindicato reforçou a tese de que o Estado não tem dado apoio suficiente para amparar as pessoas que trabalham em empresas terceirizadas, na maioria das vezes, pela sobrevivência. Ele entende que o “Estado se locupleta de forma indevida dos créditos das empresas, mas esquece de que quem limpa o chão e serve o cafezinho está sem receber os salários”. Heis lembrou que a União adota postura contrária. “Eles têm nos procurado para tratar do tema e tem dado apoio total ao Sindicato. O Ministério Público do Trabalho também”, informou. Para ele, as multas pelo descumprimento dos contratos, que são de 10% do valor total destes, não podem ser descontadas das faturas. “O certo era o Estado entrar com ação civil para buscar esses valores e não apenas ficar com o dinheiro das parcelas que pagaria à empresa. Esses valores deveriam ser usados para pagar os funcionários”, opinou, referindo-se ao que ocorre no Legislativo gaúcho. “A gente tem de unir esforços para garantir o dinheiro dos empregados”, frisou.

O presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região, Dr. Francisco Rossal de Araújo contou que as terceirizações tanto de entes privados quanto públicos geram “um número imenso de reclamações trabalhistas no órgão”. Ele disse que o TRT é conhecedor da situação delicada enfrentada pelos trabalhadores quando do não pagamento de direitos e destacou dois aspectos principais a serem observados nesse sentido: administrativos e ações trabalhistas. Rossal de Araújo ressaltou que o ente público deve considerar salvaguardas na confecção dos editais, tais como possibilidade de retenção de valores, compensação de repasses de valores, depósito prévio para eventual inadimplemento da empresa. Ele também reforçou a responsabilidade do administrador público. “Quem contrata tem obrigação de fiscalizar. As empresas vão dando sinais. Os próprios trabalhadores percebem isso, quando ocorre atraso de salários, etc. Isso exige atenção do ente público, lembrou o presidente, acrescentando que os trabalhadores são credores de salário que tem função alimentar e não podem ficar desprotegidos. “A fiscalização estabelece a possibilidade de retenção dos valores. Não se paga a fatura enquanto não houver pagamento de parcelas trabalhistas”, exemplificou.

O presidente do TRT também lembrou a necessidade de o empregado guardar provas do não pagamento das obrigações da empresa. “Em 2017, O Supremo manifestou que é do empregado o ônus da prova do inadimplemento numa reclamatória trabalhista”.

Ana Paula Zacarias, diretora de Logística do Tribunal de Justiça do RS, lembrou que há 2002 postos de trabalho terceirizados no órgão, que atua de forma cautelar quanto à questão, a partir do uso da Instrução Normativa n° 5/2017. Ela destacou a importância da observação pelos administradores, quando do ato convocatório, da qualificação técnica e financeira da empresa. E, na hora da pesquisa de preços, haver razoabilidade na consideração não somente da que oferece o valor mais baixo. Também destacou a fiscalização como ponto fundamental, além do contato constante entre fiscal e empregado para a verificação da efetividade dos pagamentos pela empresa. “Quando chega a fatura da empresa, vemos primeiro se a verba foi paga. Se não, retemos o dinheiro e priorizamos o pagamento direto aos funcionários”, frisou.

Marco Aurélio Cordeiro da Cunha, coordenador regional da Coordenadoria Nacional de Combate às irregularidades trabalhistas, do Ministério Público do Trabalho citou o exemplo do Piauí, onde atuou na fiscalização de terceirizações. Ele observou que, apesar da assinatura de um grande número de Termos de Ajustamento de Conduta entre o MPT e empresas em irregularidade, em dado momento, as empresas voltavam a cometê-las. “Tínhamos instrumento jurídico, porém, na hora da fiscalização, a gente não podia pesar a mão porque a multa já tinha incidido em grande valor e precisávamos equalizar a situação”, detalhou. Ele disse que o MPT tem pouco pessoal para a fiscalização e, por isso, ressaltou que a demanda deve chegar ao órgão antes que se assevere. “Quanto mais o MPT se mostrar atuante pelo resguardo dos direitos trabalhistas, mais a sociedade ganha. Peço que vocês sejam multiplicadores para que as demandas cheguem a nosso conhecimento”, assinalou.

O vereador Jonas Reis (PT), de Porto Alegre, acompanha casos de empresas que deixaram de pagar funcionários e atuam na secretaria de Saúde, na Fase, no Dmae, nos Hospitais Presidente Vargas de Pronto Socorro, entre outros órgãos. Ele considera a situação dos empregados similar à escravidão, já que se veem obrigados a seguirem trabalhando, muitas vezes, sem vale-tranporte, refeição, salário. “É direito humano que ninguém possa ser colocado em servidão; há o direito de se alimentar. Mas os funcionários das terceirizadas, que trabalham sem receber, não estariam em servidão?”, questionou, lembrando que são pessoas que, em sua maioria, recebem valores líquidos inferiores ao salário mínimo e tem 2 ou mais filhos. Ele denunciou que essas empresas se mantêm ativas de estados para municípios, sem que haja uma fiscalização sobre as atuações. E sugeriu a criação de um selo de “Empresa inimiga dos Trabalhadores” para classificá-las.

O vereador lembrou que as terceirizadas sequer respeitam o dissídio da categoria  e que a Câmara Municipal não as cobra. “O que essas empresas fazem beira a ação criminosa, porque retira direitos das pessoas. A terceirização veio para fragilizar os trabalhadores”, opinou.

Mirceia Ramos, Superintendente Executiva do Banrisul disse que o Banco tem 3 mil terceirizados  espalhados em 400 municípios. Ela contou que a instituição retém os pagamentos se a empresa não estiver em dia com os funcionários. Também adotam o 4º dia útil como prazo. “Se eles não tiverem feito o pagamento nesta data, o Banco paga diretamente aos empregados. As multas existem, mas o desconto só acontece se sobrar dinheiro. Primeiro é garantido o direito dos funcionários”, reiterou. Para ela, é possível fazer a fiscalização da atuação das terceirizadas. “Depende da vontade do órgão de fiscalizar, de acompanhar e de reter o pagamento se necessário”, decretou.

Luciane Mancuzo, da Susepe salientou que, embora não haja funcionários terceirizados na sede da Superintendência no momento, já realizou fiscalizações de contratos. “Conseguimos desabilitar uma empresa e destinar recursos para pagar os empregados”, contou. Ela informou que está ocorrendo um curso de capacitação para fiscalização de contratos de terceirizadas na Susepe.

Jeferson relacionou as sugestões feitas pelos participantes, com ênfase na prevenção. Além do Grupo de Trabalho para tratar da situação urgente dos funcionários que estão sem salários e direitos, propôs  união de esforços para a preparação de quem trabalha no setor, uma força-tarefa para atuar na realização dos editais e na fiscalização; um selo para empresa terceirizada, canal de denúncia de irregularidades, o reforço e reconhecimento do Sindicato da categoria pela Administração Pública, a criação de conta vinculada ou Fundo para garantir direitos trabalhistas em caso de inadimplemento e retenção dos recursos. “Somos parceiros na organização destas demandas bem como no contato com os órgãos, especialmente com o Legislativo, que, infelizmente, também é parte do problema. Mas pode e deve fazer parte da solução”, concluiu o deputado.

Texto: Andréa Farias (MTE 10967)