O governador Eduardo Leite (PSDB) deu continuidade ao pior da política gaúcha, ao retomar a agenda de privatizações, arrocho salarial e desmonte do aparato estatal. A concepção neoliberal de “estado mínimo” nunca levou desenvolvimento a lugar algum onde foi implantada. Ao contrário, é uma via de uma única mão a escoar patrimônio e riqueza da sociedade para grandes grupos privados.
Concluindo o trabalho iniciado por Antônio Britto (PMDB), que desenvolveu uma agressiva política de privatizações de serviços estratégicos à população, Leite vendeu a CEEE-D pela insignificância de 100 mil reais. A empresa que a adquiriu, a Equatorial, pertencente ao homem mais rico do Brasil, Paulo Lemann, já deu provas de a que veio. Tarifaço no bolso do consumidor (em 2021, a conta de energia acumulou alta de 114%), ao mesmo tempo em que precarizou os serviços através da demissão de quase 1.000 servidores qualificados.
O resultado é o que temos visto cotidianamente: um verdadeiro apagão, deixando comunidades por dias sem o fornecimento de energia elétrica. Nada que não tivesse sido anunciado como uma iminente tragédia pela saudosa Ana Maria Spadari, presidente do Senergisul, que no início de dezembro do ano passado profetizou o que ocorreria em razão do processo de privatização. Há poucos dias essa guerreira de luz nos deixou, vitimada por um câncer contra o qual lutava há tempos.
A Sulgás, uma empresa superavitária, que lucrou R$ 79,4 milhões em 2020 e investiu R$ 41,5 milhões, foi outra estatal gaúcha entregue à voracidade dos chamados investidores privados. Denunciei na época que isso era uma vergonha nacional; que não fazia nenhum sentido abrir mão de uma empresa enxuta, moderna e que já tinha 49% de ações nas mãos da iniciativa privada. Mas ela foi vendida e, no dia seguinte, já foi anunciado aumento do metro cúbico do gás para os consumidores.
Vejam que essa lógica é contrária ao interesse público e jamais trouxe benefícios às comunidades que utilizam esses serviços. Essa é uma concepção atrasada e elitista, porque favorece grandes grupos econômicos que buscam ampliar seus lucros milionários às custas do saque ao bolso da população consumidora desses serviços.
Outro processo de privatização vergonhoso que está em curso é o da Companhia Rio-grandense de Saneamento, a Corsan. É outra empresa superavitária, que em 2020 teve um lucro de quase R$ 2 bilhões e que atende mais de 300 municípios gaúchos. Além disso, a Corsan redistribui seus lucros atendendo mais de uma centena de municípios cuja arrecadação não cobre seus custos operacionais.
Mas Eduardo Leite, desonrando a sua palavra e comprometido até o pescoço com o grande capital privado, insiste em vendê-la. E o pior, quer entregar um valioso patrimônio cuja titularidade de gestão pertence aos municípios, sem sequer consultá-los. Esse foi o principal motivo da baixíssima adesão dos prefeitos às propostas dos chamados “aditivos contratuais”, o que fez com que o leilão, previsto para fevereiro, fosse adiado. É uma heroica resistência dos municípios que sabem quem pagará a conta dessa irresponsabilidade se a privatização for consumada.
As diversas categorias de servidores públicos têm recebido do governo Leite o mais absoluto desrespeito através de arrocho salarial e retirada de direitos dos seus planos de carreira, arduamente conquistados ao longo de anos de luta sindical. E como se não bastasse, as promessas vazias e mentiras têm sido recorrentes de parte de um governador que demonstrou ser um homem sem palavra.
Uma reivindicação justa dos servidores da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe), que a transforma em Polícia Penal, deverá ir à votação em breve. Contudo, nós sempre defendemos que fosse para todos os servidores, ao contrário da proposta do governador, que contempla apenas os agentes penitenciários. Por isso articulei uma emenda assinada por vários deputados, a fim de corrigir essa injustiça. Além disso, Leite quer começar a privatizar o sistema prisional, transformando-o em fonte de lucros fabulosos para agentes privados.
Outro tema que dialoga com esse vício do governador em enrolar e mentir é a proposta do novo Plano de Carreira da Brigada Militar, que tramita na Assembleia Legislativa. O governador apregoou que Praças teriam uma modernização na carreira, tendo nível superior para ingresso como soldado, não ter mais os 3 níveis e menos dificuldade nas promoções, sem falar na parafernália do concurso interno confuso. Contudo, o que chegou no legislativo gaúcho é um engodo, que não contempla o que as Associações de Praças de todo o estado almejavam.
Em relação ao magistério estadual, a falta de respeito com professores e funcionários de escola é revoltante. Além de ter retirado direitos do Plano de Carreira, como os triênios, que foram transformados em parcela autônoma, que será extinta e não incidirá sobre o básico para a aposentadoria, o governador, fazendo coro a Bolsonaro, mente que concedeu 32% de reajuste, quando na verdade uma parcela muito pequena da categoria dos professores receberá esse percentual. A maioria receberá reajustes que sequer cobrem as perdas da inflação. Além disso, os funcionários de escola foram completamente alijados de qualquer reajuste, como se não existissem.
Por fim, o abandono dos agricultores familiares em uma das piores estiagens que assola o campo gaúcho. Eduardo Leite promete, sinaliza ações, mas até agora nada de concreto foi feito para proteger aqueles que são responsáveis por colocar em nossa mesa a maior parte dos alimentos que consumimos. Os agricultores estão endividados no banco, na cooperativa. E até o momento não tem uma única medida para socorrê-los. O atual presidente da Assembleia Legislativa, o deputado Valdeci Oliveira (PT), já apresentou ao governador a pauta de reivindicações dos agricultores familiares e aguarda uma manifestação oficial que tenha algo de concreto para socorrer a famílias, para além da conversa fiada de sempre.
Em suma, infelizmente, para se livrar de Sartori, a população gaúcha fez a opção por uma figura pública que não honra a palavra e demonstrou não possuir nenhum compromisso com o futuro do Rio Grande. Essa ladainha de que tem que privatizar para melhorar escutamos desde a época do Britto, há 25 anos atrás. Seus resultados foram nefastos para o RS e continuarão a sê-lo enquanto tivermos governadores que abrem mão dos principais instrumentos públicos que poderiam alavancar o nosso desenvolvimento. Tudo em nome de velhas concepções que só trouxeram precariedade de serviços essenciais à população e concentração de mais renda nas mãos de meia dúzia. É governar para os amigos do rei.
Jeferson Fernandes, Deputado estadual (PT)