No apagar das luzes de 2021, em 30 de dezembro, Bolsonaro sancionou a lei que cria o Auxílio Brasil, programa social de transferência de renda que substitui o Bolsa Família após 18 anos. Apresentada incialmente como uma Medida Provisória e cheia de chantagens no Congresso Nacional, justificando inclusive o calote aos trabalhadores e trabalhadoras promovida pela PEC dos Precatórios.
A Medida Provisória já nascia com muitos problemas de entendimento sobre combate à pobreza, política de renda ou a própria determinação do Supremo Tribunal Federal, de quem 2022 devia ser regulamentada a Lei 10.835/2005, a lei que institui a Renda Básica de Cidadania no país.
Mesmo com a insistência do Governo em não debater e passar a patrola devoradora de direitos sociais por cima do Congresso e dos movimentos, alguns poucos avanços haviam sido conquistados: o debate sobre a fila zero, a continuidade do programa pós-eleições 2022 e metas para superação da pobreza e extrema-pobreza no Brasil. E pasmem (claro que não), os avanços morreram na mesa do Presidente da República!
Bolsonaro, vetou dois trechos da lei aprovada pelo Congresso Nacional. Em um deles, o presidente vetou o dispositivo que determinava que o governo deveria providenciar recursos suficientes para atender a todas as famílias elegíveis ao programa, ou seja, a fila zero. Com o veto, oficializa a manutenção da “fila” de pessoas que precisam do benefício, mas que por restrições orçamentárias, não poderão recebê-lo.
Usando o bom português, o veto diz que o governo não precisa disponibilizar verbas o suficiente para atender todo mundo que precisa do benefício. Esse já era um problema que havia no Bolsa Família, que mesmo antes da pandemia, mantinha mais de 2 milhões de famílias na lista de espera. O governo teve a chance de resolver e enfrentar com autoridade e compromisso os péssimos indicadores de fome e miséria e não o fez.
Mais do que isso, o grande empenho do governo, ao cortar recursos da assistência social, política pública responsável pela inclusão e acompanhamento do Cadastro Único para Programas Sociais, nem mesmo ter utilizado e qualificado os dados coletados pelo app do Auxílio Emergencial, é empurrar o povo para que nem na fila chegue.
O outro trecho vetado é o que estabelecia um conjunto de metas para a redução da pobreza e da pobreza extrema no país nos três anos seguintes ao início da vigência da lei. Para a pobreza, a meta era manter as taxas de pobreza menores a 12% em 2022, 11% em 2023 e 10% em 2024. Para a pobreza extrema, a era meta era manter a taxa menor que 6% em 2022, 4% em 2023 e 3% em 2024.O trecho também previa que se o governo não cumprisse as metas, ele deveria divulgar publicamente as razões que o teriam levado a isso.
Na justificativa sobre o veto, o governo disse que a proposta foi excluída do texto porque a tentativa de atingir as metas poderia levar a aumento de despesas e tiraria autonomia do governo para alocar verbas de forma discricionária e de acordo com o que o governo classificou como “gestão fiscal responsável”.
Mais uma vez, as metas e os tetos justificam uma ação irresponsável e perversa do Governo Bolsonaro. Ao não atender nem os que vivem em maior vulnerabilidade no país, nem estabelecer que a principal meta que temos a cumprir é combate à pobreza e a fome, com políticas públicas e objetivos fixados, estamos rasgando a nossa constituição e relegando o povo à sua própria sorte.
O que nos espera para 2022? Sem nenhuma dúvida, mais cenas tristes de fila dos ossos, comida no lixo e crianças em estado de desnutrição.
Paola Carvalho, Diretora de Relações Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica