O papel estratégico da Procergs na organização da política estadual da saúde e os efeitos negativos sobre a área diante da iminente privatização da empresa pelo governo gaúcho estiveram no centro do debate realizado na manhã desta quarta-feira, 6, pela Comissão de Saúde e do Meio Ambiente (CSMA) da Assembleia Legislativa. Realizada de forma virtual, a audiência pública, proposta pelo deputado Valdeci Oliveira (PT), contou com a participação de mais de 40 pessoas, entre técnicos, trabalhadores do setor e gestores públicos. Apesar de convidada, a Secretaria Estadual da Saúde (SES) não enviou representante.
“A Procergs é o computador do estado. E sua importância inclui o tratamento e armazenagem segura dos dados do governo, da Secretaria da Fazenda, da Segurança e da Saúde, entre outros. Além de, a partir da interligação de cadastros, históricos e controles, planejar e programar políticas públicas (nessas áreas) e em todos os aspectos da administração estadual. Ela é o resultado de 40 anos de atuação e investimentos”, afirmou Omar Emilio Rosa, presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados do RS (SINDPPD). O dirigente também chamou atenção para o que considera ser o primeiro passo rumo à privatização da empresa: o fechamento das seis coordenadorias regionais do órgão no interior do estado – Santa Maria, Passo Fundo, Alegrete, Santo Ângelo, Caxias do Sul e Pelotas -, o que irá refletir diretamente em questões ligadas ao desenvolvimento regional nos seus mais diferentes aspectos. “Uma pesquisa interna mostra que a Procergs está no pior clima de toda a sua história com o fechamento das regionais, que irá impactar na saúde, pois irá implicar no tráfego de dados com o interior do estado. Está se desrespeitando as cidades do interior e os comitês municipais de saúde quando se fecha todas as Regionais da empresa. E sem nenhuma explicação lógica de economicidade, técnica ou de planejamento. O que se está fazendo é perdendo a conectividade (com essas localidades), o que vai dificultar o trabalho”, alertou.
O deputado Valdeci também criticou e cobrou informações sobre o fechamento das unidades regionais. “Na minha avaliação, isso é um sinal bastante evidente da deflagração de uma política de desmonte, esvaziamento e desestruturação que, ao fim e ao cabo, vai atingir e prejudicar a sociedade gaúcha como um todo. Portanto, seria muito importante que os planos existentes do governo do Estado para a Procergs fossem aqui repassados e explicados de forma muito transparente e republicana”, enfatizou Valdeci. Como nem o governo nem a Procergs enviaram representantes à audiência, a observação do parlamentar, que esperava que o encontro servisse para esclarecer a medida tomada logo depois da aprovação da PEC que retirou o direito da população em se manifestar via plebiscito sobre privatizações, acabou ficando sem resposta.
A relação direta entre a companhia e as ações voltadas à saúde pública foi destacada por Valdeci logo na abertura dos debates. “Foi a Procergs que ajudou a criar processos para enfrentamento da pandemia no RS, como o Sistema de Distanciamento Controlado e depois o Sistema 3 As de Monitoramento (Alerta, Aviso e Ação). E a partir de ações como essa o estado conquistou importante reconhecimento em nível nacional, chegando em junho ao topo do ranking de transparência sobre dados epidemiológicos da Covid-19 ao lado de Ceará, Goiás, Minas Gerais e Rondônia”, lembrou o deputado, frisando que a companhia é a principal empresa de tecnologia da informação no Rio Grande do Sul e é uma das empresas públicas de tecnologia mais reconhecidas de todo o Brasil, sendo responsável, por exemplo, pela Nota Fiscal Eletrônica de quase todas as empresas do País.
Como processos vinculados à saúde desenvolvidos pela Procergs, Valdeci destacou também o Sistema de Administração de Medicamentos (AME), que permite administrar o processo de aquisição, estoque e distribuição de medicamentos pelos diversos setores da Secretaria da Saúde em todo o estado, e o Gerenciamento de Usuários com Deficiências (GUD), que tem por missão organizar os dados das pessoas com deficiência física ou mental, além de prestar informações sobre custos e distribuição de materiais. O parlamentar citou ainda o Sistema de Gestão dos Contratos Ambulatoriais e Hospitalares (SIGAH), o Sistema de Apoio do Centro de Informações Toxicológicas (CIT), o Sistema de Apoio à Vigilância Sanitária (VIS), o Controle de Doações de Sangue (VGS), o (Saúde do Trabalhador (IST), o ISUS (Integração com o SUS), o Monitoramento Gestão em Saúde (MGS), o ESUS (que subsidia os profissionais da Atenção Básica), e os sistemas do IPE (tanto na área da saúde quanto na área da previdência).
“Em menos de uma semana após a decretação da pandemia, a Procergs conseguiu colocar milhares de trabalhadores públicos em atividade via home office. O estado não parou um segundo sequer por conta da crise sanitária”, afirmou Vera Guasso, coordenadora do SINDPPD. “Foi um momento que nos trouxe muitos desafios. A área de TI (tecnologia da informação) deu um salto de 10 a 20 anos. É inadmissível que o governo coloque em risco uma empresa que tem relação direta com a saúde da sociedade”, completou Guasso. “Todos os gráficos e (a formatação dos) estudos sobre a pandemia foram desenvolvidos em parceria entre a SES e a Procergs, que se for privatizada irá precarizar tanto a saúde quanto outras áreas. Os profissionais (da companhia) são a linha de frente do estado lá na ponta (com a sociedade)”, sustentou Marco Baldino, técnico em telecomunicações da empresa. E sobre o fechamento das seis Regionais da companhia no interior, Baldino informou que a direção da empresa, em reunião com o Ministério Público do Trabalho, teria afirmado ter um estudo robusto que justificava a decisão. “E não apresentaram nenhuma linha. Mas nós temos estudo que mostra o contrário”, disse.
Para Carlos Alberto Castro, da coordenação do Movimento Software Livre, a Procergs, além de acúmulo e história, é centro de referência e informação. “Foi ela que ajudou na recuperação do sistema do Tribunal de Justiça”, afirmou, em referência ao ataque hacker sofrido pela instituição meses atrás. Para ele, é impensável governar qualquer coisa sem ter controle sobre o que se chama hoje de governo eletrônico. “As informações aqui recebidas serão levadas ao conhecimento do procurador-geral”, assegurou Charlene Cortes, assessora de Geraldo Costa da Camino, procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC).
“Esse debate não se encerra aqui. E nesse sentido, queremos, de antemão e pelo o que foi apresentado, defender com muita ênfase o caráter estratégico e público da Procergs. O Rio Grande do Sul pode e deve, cada vez mais, procurar qualificar, racionalizar e reestruturar a ação dessa grande ferramenta que é a empresa. Mas o nosso estado não pode e não deve abrir mão de um instrumento tão valioso e potente de promoção do desenvolvimento, ainda mais quando vivemos na era do conhecimento, da informação e da tecnologia”, disse Valdeci ao final do encontro.