segunda-feira, 25 novembro

Precária infraestrutura das escolas e carência de docentes estão entre as maiores preocupações da comunidade escolar

Foto: Marta Resing

Audiência Pública da Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa, proposta e coordenada pela deputada estadual Sofia Cavedon (PT), foi realizada nesta sexta-feira (24) e avaliou o processo de implementação do novo  ensino médio no Rio Grande do Sul.

A deputada Sofia afirmou que o tema tem grande impacto para os estudantes gaúchos. Ela anunciou que irá fazer uma apelo à Secretaria de Educação no sentido de adiar a implantação da reforma, prevista para o próximo ano. Sofia Cavedon pediu que todas as escolas-piloto encaminhassem ao Conselho de Educação e a Comissão de Educação um balanço do que foi feito nas escolas. Ela informou que o Colegiado irá propor ao Conselho que faça uma escuta destes depoimentos, antes de deliberar sobre o novo diferencial curricular.

Desde 2019, 264 escolas da rede estadual de ensino estão progressivamente adotando em seus currículos escolares as mudanças propostas no novo ensino médio. Implementado por iniciativa federal, ele entrará em vigor em 2022 para os alunos do 1° ano e até 2024 atingirá todas as turmas do país. A carga horária terá um total de 3 mil horas ao longo dos três anos. Destas, 1.800 horas serão destinadas para as disciplinas que são obrigatórias da Base Nacional Comum Curricular e 1.200 horas serão destinadas para o aluno decidir, por meio de itinerários formativos oferecidos pelas escolas, nas áreas de linguagem e suas tecnologias; matemática e suas tecnologias; ciências da natureza e suas tecnologias; humanas e sociais aplicadas  e formação técnica e profissional.

No RS, segundo a versão do referencial curricular gaúcho, as 3 mil horas/aulas deverão ser divididas em duas modalidades: a formação geral básica, que representa 60% da carga horária e é composta pelo currículo obrigatório comum a todos os anos e os itinerários formativos por áreas de conhecimento e de formação técnica e profissional, que representam pelo menos 49% da carga horária. Estes itinerários são compostos por dez opções: Cidadania e Gênero, Educação Financeira, Empreendedorismo, Expressão Corporal, Expressão Cultural, Profissões,  Relações Interpessoais, Saúde, Sustentabilidade e Tecnologia.

Depoimentos
Em depoimento que denominou de “chão de escola”, a diretora da escola Tuiuti, de Gravataí, Geovana Affeldt, considerou impossível colocar em prática a reforma pretendida, com os problemas crônicos de infraestrutura dos prédios escolares, a carência de professores e falta de recomposição. Ela questionou a elaboração do referencial curricular gaúcho e as suas intenções. “Como foi construído esse referencial, de onde vão sair os professores para os itinerários alternativos e a quem serve essa mudança?”, questionou. Lembrando que os profissionais de educação não tiveram tempo e nem incentivo para participar de debate sobre o novo ensino médio durante a pandemia, Geovana apelou para um novo processo de elaboração com a participação efetiva dos professores professores e gestores e levando em conta  a falta de estrutura das escolas.

Coordenadora do Grupo de Estudos em Políticas Públicas para o Ensino Médio (GEEPEM/UFRGS), a professora  Mariângela Bairros afirmou que o novo ensino médio está alicerçado em apenas dois pontos, currículo e carga horária, não levando em consideração informações econômicas e sociais do grupo que frequenta as escolas. Para ela, a reforma está descolada do ensino fundamental e está separada do momento em que vivemos. “Esta proposta não conversa com a realidade, que é de evasão de alunos e drástica redução de docentes”. Mariângela Bairros sustentou que, na prática, a reforma aprofunda a desigualdade entre escolas públicas e particulares.

Já o representantes da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (UBES), Alejandro Guerrero, disse ver na reforma um projeto neoliberal de ataque ao acesso à universidade pública, ao distanciar estudantes da escola pública de disciplinas que são requeridas no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). “É um projeto que nasce de um governo golpista (2016) e é colocado em um momento de grande evasão escolar”, destacou.

O diretor da escola Estadual Érico Veríssimo, de Jacutinga, uma das escolas-piloto da reforma, confirmou que os alunos não querem perder as disciplinas do Enem. “Muitas coisas precisam ser arrumadas, precisamos repensar a nova matriz curricular que suprime importantes”, salientou. Ele assegurou que os estudantes, cada vez mais, estão optando pelo trabalho em detrimento dos estudos.

Diretora do Instituto Imaculada de Tapera, outra escola-piloto, Luciana Rizzi considerou a reforma uma colcha de retalhos, de difícil implementação e contou que a mudança não foi aceita pela comunidade escolar. Luciana questionou a base teórica do novo ensino médio.

Emocionada, a professora Maria Helena Andrade, da escola Rondon, de Canoas, assegurou que os alunos não querem os itinerários propostos e que se consideram prejudicados na preparação para o Enem. “É com muita tristeza que vejo uma geração ser subtraída da formação básica. Por favor, Seduc, olhe para aqueles que são os mais importantes no processo educacional”, lastimou.

Como contraponto, o depoimento da diretora da Escola Airton Senna, de Viamão, Niara Cardoso, garantiu que os seus alunos estão “apaixonados” pelos itinerários. “Talvez pela forma como implantamos a reforma aqui na escola”, explicou. A professora solicitou uma escuta real de todos os processos de implantação nas escolas-piloto. “Todos os exemplos precisam ser compartilhados”, sugeriu.

A deputada Luciana Genro (PSol) disse que a Seduc, ao se manifestar sobre o assunto, não leva em conta a realidade dramática das escolas gaúchas. “Um drama vivenciado cotidianamente pelos educadores, com seus contracheques sendo reduzidos mês a mês. Ela abstrai que as escolas estão caindo aos pedaços, com infraestrutura precaríssima, que não há instrumentos para atrair os estudantes que evadiram das escolas”, avaliou. Ela cumprimentou os educadores que estão fazendo um esforço gigantesco em busca do melhor para os alunos, mesmo diante de todas as adversidades.

Também se manifestaram a diretora do Departamento Pedagógico da Secretaria Estadual da Educação (Seduc), Letícia Grogoletto; a presidente do Conselho Estadual de Educação (CEED), Márcia de Carvalho; a representante do CPERS/Sindicato,  Rosane Zan; a representante da UNCME/RS, Adriana Cassol; a promotora de Justiça Cristiane Corrales e a diretora da escola do Colégio Estadual Sananduva, Maristela Spironello.

Fonte: Agência de Notícias ALRS
Compartilhe