Precarização do sistema foi debatida em audiência pública promovida pelas Comissões de Economia e de Segurança e Serviços Públicos na manhã desta quarta-feira
Pedir uma reunião de trabalho com a Casa Civil, IPE Saúde, IPE Prev e a Secretaria Estadual da Saúde para tratar da revisão do quadro de pessoal e a matriz salarial, da reabertura das unidades de atendimento no interior do Estado, da adoção de providências para garantir o acesso dos usuários, especialmente no interior do Estado a consultas especializadas e a serviços de urgência e emergência; para também estabelecer um cronograma de desembolsos aos serviços hospitalares e de apoio diagnóstico, com liquidação dos valores em atraso com os prestadores de serviços; discutir o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos; como estabelecer um canal ágil para recebimento de denúncias de cobranças irregulares aos seus segurados; para garantir a manutenção do caráter contributivo e solidário do IPE Saúde, mediante contribuição do Estado e dos Segurados, e a gestão paritária dos órgãos colegiados; sobre a publicação urgente de Edital para recomposição de pessoal; além da revisão das ferramentas de acesso ao Programa IPE, a fim de garantir a universalização de atendimentos. Estes foram os encaminhamentos tirados da audiência pública promovida pela Comissão de Economia, Desenvolvimento Sustentável e Turismo, em conjunto com a Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa, realizou na manhã desta quarta-feira (1) para discutir sobre o “desmonte do sistema IPE-Saúde, o fechamento de pontos de atendimento e a falta de profissionais credenciados”.
A reunião foi proposta pelos deputados Pepe Vargas e Zé Nunes, do PT. Este último, que coordenou a Audiência Pública, disse ter percorrido o estado e conversado com os beneficiários do IPE, que são 966 mil, e tem recebido solicitações para abrir um debate sobe o fechamento de postos e o número cada vez maior de profissionais que se descredenciam. Especialmente nos municípios pequenos e médios. “Tivemos um conjunto de iniciativas do Executivo para a separação do IPE previdência e o IPE saúde até a dotação de pessoal. Verificamos muita dificuldade. É uma característica deste governo que tem o viés privatizador”. Para Zé Nunes, o plano colocado pela direção do IPE Saúde, que admitiu a perda de profissionais credenciados, devido aos atrasos dos pagamentos, precisa ser levado em consideração com urgência. O deputado se propôs a contribuir com reuniões regionais que devem ser propostas pelos representantes dos usuários. Sobre as unidades no interior do Estado, Zé Nunes disse que faltou uma amarração por parte dos gestores para que não acontecessem.
O deputado Pepe Vargas recordou a lei que criou o IPE Prev em 2018 e que, após transcorridos três anos e meio, o “Projeto de Especialização” do IPE deveria se chamar “Projeto de Precarização”, pois foi o que aconteceu. Pepe foi coordenador de uma subcomissão criada em 2019 para tratar da situação do IPE. “Nos debruçamos sobre os problemas do IPE Saúde à época. Fizemos um conjunto de recomendações ao poder público. Colocamos uma série de questões e a maioria delas não foi atendida”. Até agora, não foi realizado concurso público para contratação de servidores, por exemplo. Em julho deste ano, o governo também decidiu que toda a estrutura do IPE Prev deve ser lotada na capital, o que significa o fechamento das unidades no interior. “É um problema grave. Mesmo com o chamamento às prefeituras e parcerias, pois muitos municípios não estão ligados ao atendimento pelo IPE. Então queremos saber qual é a intenção mesmo”. Outra questão levantada pelo deputado foi sobre as consultas especializadas em pediatria, obstetrícia e traumatologia, além da anestesiologia. Pepe lembrou que não há reposição de profissionais e que houve venda de patrimônio, fechando assim muitos postos de atendimento. Questionou os valores que foram repassados a partir da venda dos imóveis. Segundo o parlamentar, o presidente anterior nunca participou de nenhuma audiência, por isso, reconheceu a presença do atual presidente Júlio César Ruivo. “Estamos falando de uma instituição com quase 1 milhão de usuários. O IPE pode cumprir o papel importante de regulador na saúde”.
Para o deputado Fernando Marroni, a forma como o governo encaminha a situação formou quase que um colapso no sistema que se agravou ainda mais com a crise econômica e sanitária. “Já que foi falado que o governo tem colaborado bastante, e se essa colaboração passa pela questão da venda dos imóveis do IPE, já que o governo tem o superávit de R$ 2 bilhões, então não seria um problema o governo ajudar o IPE se temos condições de superar isso com um teto de gastos”. Sobre o teto de gastos, acrescentou, “vivemos esse caos atual”.
Usuários reclamam do descaso do governo
Na audiência pública realizada nesta quarta, representantes de diversas entidades de categorias de servidores e usuários do IPE Saúde relataram problemas que vêm se agravando. Rogério Viana, vice-presidente do Sindicato dos Servidores Públicos do RS (SindiSepe), por exemplo, apontou descaso do governo, que até agora não abriu o diálogo com os servidores. “Leite é responsável por esta situação dramática. Elaboram planos mirabolantes para retirar cada vez mais direitos dos servidores. Já amargamos 7 anos sem reajustes e essa semana retirou o risco de vida dos servidores do sistema carcerário”, enumerou. Para Viana, o Estado está retirando a dignidade dos servidores, com a fome e com o desmonte do IPE. “Isso é um ataque aos nossos direitos e quem acaba sendo prejudicada é a própria sociedade. Os servidores do sistema carcerários já perderam a insalubridade e agora sem o risco de vida ficam com o trabalho e a remuneração ainda mais precarizados”.
Vera Lesses, diretora do Cpers, disse que o IPE Saúde é imprescindível para o magistério, mas sobretudo para evitar a sobrecarga do SUS. No entanto, segundo ela, faltam médicos especialistas no interior do estado, onde também não há escritórios para oferecer atendimento e faltam especialmente anestesistas. “Muitas vezes, os nossos sócios precisam fazer cirurgia e o valor da anestesia é superior ao próprio salário. Faço um apelo para que tenhamos uma política pública que ofereça qualidade aos profissionais e aos beneficiários”.
A dificuldade que os usuários enfrentam diariamente foi relatada pela professora Luciane Pires Rodrigues, que há 14 anos enfrentou uma gravidez complicada mas teve toda assistência necessária pelo IPE sem precisar pagar nada. Já no segundo parto, quatro anos depois, teve que recorrer ao SUS. Em 2019, na terceira gravidez, para conseguir consulta pelo IPE precisou entrar em fila de espera e ser atendida somente no terceiro mês, quando soube que o IPE não cobria mais partos na sua cidade. “Tive mais uma gestação complicada e eu só pude contar com o SUS. Acredito que seja uma falta de respeito, pois sou usuária do IPE há 36 anos e não posso contar com ele.” Outro usuário, Antonio Alberto Andrezza, dirigente do CPERS e membro do conselho do IPE, disse que a categoria, com 80 mil sócios e em sua maioria aposentados, tem dificuldade de acesso online. “É inadmissível que o IPE, com 1 milhão de usuários, seja somente virtual. Em defesa dos usuários do IPE Saúde do RS, não vamos admitir o fechamento dos locais e regionais de acesso direto”.
Érico Corrêa, do Sindcaixa avaliou que na fala do presidente do IPE “não parece que ele é do governo, porque ele pede socorro para o sindicato”. O sindicalista também levantou o problema de não se ter mais atendimento presencial. “Se um servidor mora em Alegrete e for chamado para Porto Alegre quem vai pagar as passagens? Quem está atendendo em São Borja é a servidora do CPERS os atendimentos do IPE, sabiam disso? Em Bagé, um dos servidores do IPE morreu em 31 de dezembro de 2020, quando a viúva legítima começou a receber a pensão? Em julho. Ela viveu do que até julho? O objetivo é desmanchar e sucatear o plano, o IPE”, disparou.
Raquel Fiori, do Sindicato dos Servidores de Nível Superior do Poder Executivo (Sintergs) falou que entre os associados há inúmeros casos que não foram atendidos. “Me preocupa que nem todos os municípios vão ter facilitadores. Nós do sindicato estamos ajudando mas que não é o correto. Vamos lá pra frente do Palácio fazer nosso sinetaço, panelaço, pois não temos outra escolha que não fazer uma briga direta com o governador Eduardo Leite”, garantiu. Com entendimento semelhante, Kátia Moraes, da União Gaúcha em Defesa da Previdência, disse que é uma política de governo o sucateamento das sedes no interior, que fizeram com que os próprios servidores tirassem dinheiro do bolso para garantir o funcionamento por algum tempo. “Em 2016, os imóveis do IPE foram sequestrados, com previsão de aporte ao IPE Saúde. No entanto até agora o IPE não viu o dinheiro e a dívida já chega a R$ 196 milhões. O governo deveria estar repassando valores da venda para o FAS, além da sua contrapartida como patronal”, sentenciou.
Ives Lucas, da União Gaúcha em Defesa da Previdência disse que a legislação não está sendo atendida pois o IPE não está aproximando o atendimento médico dos usuários. “Temos presenciado um IPE que está sendo conduzido por bravos servidores que, mesmo com quadro reduzido, conseguem manter o Instituto. É um descaso e um desmonte programado”. Para ele é preciso que projetos novos atendam as necessidades do IPE e os repasses do poder Executivo sejam cumpridos. “A saúde é um bem social e deve ser mantido pelo Estado”.
Gestores dizem que um plano está sendo montado
O presidente do IPE Saúde, Júlio César Ruivo, que está há cinco meses à frente da Instituição, afirmou que a pandemia e o agravamento da crise financeira trouxeram muitos problemas que prejudicaram o trabalho do IPE. “Os problemas precisam ser enfrentados e junto com a equipe, adotamos 15 medidas. Ruivo admitiu que o IPE Saúde sofre de problemas estruturais, mas que a equipe “extremamente qualificada” tem feito de tudo para superar as dificuldades. “O IPE teve que adaptar-se à pandemia, com digitalização, fechamento de agências, que tinham a gestão do IPE Prev. Recentemente circular do IPE Previdência fechou a totalidade destas agências. Não somos gestores destes locais. Estávamos de favor alocados nestes escritórios”, disse. Segundo o presidente, há 67 pedidos de parceria com prefeituras para tentar ajudar as pessoas que não conseguem atendimento. A visão da gestão do IPE, disse, é de fazer o necessário para amenizar os problemas e garantir atendimento. Segundo o presidente o deficit é de R$ 40 milhões por mês. “Os hospitais que recebiam com 60 dias, hoje estão com 86 dias e até 130 dias, com dificuldades e possibilidade de parar o atendimento”, revelou. Ainda conforme Ruivo, o que está equilibrando as contas são os contratos com as prefeituras e a consequência é a não atualização de tabela e a dificuldade de pagar os médicos e para credenciar médicos na pediatria, por exemplo. “Na pandemia, 50 profissionais da saúde se descadastraram e quase 300 cadastraram-se”. Por outro lado, segundo ele, o IPE Saúde conta com 100 servidores para atender a quase 1 milhão de beneficiários.