Parlamentares pedem mais tempo e mais diálogo ao governo Leite sobre privatização da Corsan

Raquel Wunsch

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Na primeira e única Audiência Pública que o Executivo compareceu para debater o PL 210/2021 que cria a Unidade Regional de Saneamento Básico Central – URSB Central e o PL 211/2021 que autoriza a desestatização da Companhia Rio-grandense de Saneamento (CORSAN) ficou claro que a atual gestão não está aberta ao diálogo e a dirimir as dúvidas dos parlamentares. A atividade ocorreu na noite desta quinta-feira (26) e foi coordenada pelo deputado Mateus Wesp (PSDB) por meio da Comissão de Finanças, Fiscalização e Controle.

O deputado Jeferson Fernandes (PT) lembrou que “estamos há quatro dias de votar dois projetos que vão impactar a vida de todos os gaúchos e gaúchas. Na semana passada, fomos surpreendidos pela proposta de uma nova conformação das regionais de saneamento em 25 microbacias, conforme sugestão do deputado Gabriel Souza, que parecia em acordo com o governo. Agora ficamos ainda mais confusos. Hoje, estamos debatendo o quê? Vai ter um substitutivo aos projetos? Este projeto de regionalização precisa ter estudo técnico. Aliás, não sei se estamos debatendo os 307 municípios atendidos pela Corsan ou as 25 microbacias” lamentou. O parlamentar lembrou que Marco Regulatório do Saneamento não afirma que precisa privatizar a Companhia, “diz que tem de ter estudo de viabilidade financeira de cada unidade criada e que esta tem até 2023 para alcançar a meta, prorrogável até 2040. O governo está colocando a carroça na frente dos bois. Quer vender a empresa superavitária, que tem elementos para alcançar as metas do Marco Regulatório e não mostra estudo que prove o contrário”.

O líder da bancada, deputado Pepe Vargas (PT), disse esperar que o governo do Estado tenha bom senso e retire o regime de urgência para possibilitar o debate. Se não retirar, disse, satisfará outros interesses que não o público. “O governo quer que os municípios façam termos aditivos aos contratos que tem com a Corsan e estimula sem ouvir as Câmaras de Vereadores, o que é questionável inclusive do ponto de vista jurídico”. Segundo o parlamentar, vários prefeitos estão aguardando o que vai acontecer e há municípios que podem inclusive renunciar o contrato. “Os de maior porte, por exemplo, podem fazer eles mesmo o processo de privatização, que não através do estado. Como fica essa situação de municípios que tem dificuldade? É só ver o que aconteceu em processos semelhantes que aconteceram Brasil afora”, arguentou.

Em relação a regionalização, o deputado observou que governo mandou a proposta na última hora. Pepe lembrou que o presidente da AL apresentou uma proposta que também não resolve o problema. “Como é que fica o caso de municípios que participam de mais de uma bacia hidrográfica? Caxias tem 57% no taquari antas e 43% na Bacia do Cai”, exemplificou, questionando onde estão os estudos técnicos. “Teremos acesso a eles ou votaremos sem acesso a eles? Então espero que o governo retire o regime de urgência e o debate siga nas câmaras de vereadores”.

Já, o vice-líder da bancada, deputado Luiz Fernando Mainardi (PT) pediu mais prazo para esclarecimentos por parte do governo. “É uma estratégia do governo não se expor, mas a história vai cobrar fortemente. A Constituição, no capítulo dos direitos políticos fundamentais, diz que a soberania popular se faz pelo voto, pelo plebiscito. Eu fico pensando, quando fizeram a Constituição em que momento queriam ouvir o povo? A gente pode viver sem luz, mas sem água ninguém vive. É complexo o tema sim, mas isso não significa que não deve ser debatido. Estão dizendo que a Corsan é má gerenciada, então por que não debater?” questionou. Mainardi fez um apelo para que o governo dialogue com os prefeitos e vereadores para saber o que vai acontecer. “Retire a urgência, vamos debater melhor, entender esse projeto e garantir que a sociedade, os prefeitos e os vereadores avaliem qual a melhor decisão e se esse for o melhor caminho, bem então a gente ao menos sabe o que vai acontecer”.

O que diz o governo

Roberto Correa Bartuti, Diretor-Presidente da Corsan: o que está em jogo é que o RS tem apenas 17% do esgoto tratado e a necessidade de aprimorar a segurança hídrica. O poder concedente é o município e cabe a ele resolver a questão por ser titular do serviço e a Corsan corresponsável por ser concedente. A Corsan contratou consultoria especializada para que pudesse ter certeza do encaminhamento do melhor plano possível, nos temas como o regulatório, avaliação CAPEX, revisão organizacional, modelagem econômica, avaliação dos administradores, benefício previdenciário, passivo trabalhista, produtividade e geração de valor. É necessário um choque de eficiência para atender aos requisitos do Novo Marco Regulatório. A proposta passa pela assinatura de aditivos que prevê o novo Marco, além da criação de unidades regionais. A privatização se dará por meio de uma oferta pública de ações na ordem de R$ 1 bilhão, com isso o Estado deixará de ter 99,99% da companhia para ter menos de 50%, pode-se dizer que em torno de 30% ficaria com o Estado.

Luiz Henrique Viana, Secretário do Meio-Ambiente e Infraestrutura: o Estado sabe da importância do saneamento, que está diretamente ligado à saúde, desenvolvimento econômico e social e a proteção da vida. As dificuldades de investimentos para a satisfação da demanda não são novidade. A desestatização de um lado encontra-se em uma conjuntura que a impõe; por outro lado, propõe ir ao encontro dos municípios e proteger o meio ambiente e à vida. “O propósito é criar um ambiente favorável aos municípios, mas no fim das contas às pessoas.

O que afirmaram prefeitos, sindicatos e sociedade

Evandro Luis, Prefeito de Palmeiras das Missões: existe uma grande preocupação que já foi levantada a algum tempo na questão da privatização da Corsan e eu tenho os números oficiais da empresa que são de domínio público. O que se nota no balanço de 2020 é que hoje a Companhia, do ponto de vista da água, já atende 98% e para chegar a 99% não demora muito. O grande desafio é o esgoto mesmo. A companhia se mostra extremamente saudável do ponto de vista financeiro e econômico. Uma companhia que no ano passo teve mais de R$ 1 bilhão de lucro, tem imunidade tributária, tem em seu plano plurianual o planejamento de investimento de R$ 800 milhões esse ano, mais de R$ 1 bilhão em 2022 e mais R$ 1 bilhão em 2023, isso de recursos próprios, isso significa que ela tem dinheiro. Causa estranheza privatizar se ela tem dinheiro. Nós temos que entregar um patrimônio que é do município para o estado, mas se quisermos ter ações da Corsan teremos que comprar. Isso me parece muito estranho, não acham? O plano de negócios a gente não sabe, enquanto prefeito, quando será feito? Quanto será investido? No momento em que eu desestatizar ela vai continuar prestando serviço para aqueles municípios menores?

Marcos Rogério dos Santos, representante da FAMURS: disse que a entidade tem ouvido os municípios em inúmeras audiências e reuniões sempre com o intuito de esclarecer a situação, manter o diálogo com o presidente, com os secretários. Reafirmou a defesa aos municípios e aos cidadãos.

Arilson Wunsch, presidente do Sindiagua: que futuro a Corsan terá se tudo será vendido? Segundo ele, o saneamento não é uma novidade, pois a Corsan já tem 19,05% das economias faturadas com esgoto e se levassem em conta as obras em andamento e em contratação e as PPPs, poderia se chegar a 42% de esgotamento sanitário. “Então os números passados pelo representante da Corsan não estão corretos. Desde 2015, a Corsan desenvolveu o sistema SoluTrat, que agora apresenta-se como solução nos aditivos, e que se estivessem em prática teríamos mais 42% de municípios com esgoto. Então não precisamos de privatização. Precisamos de uma gestão séria”. Wunsch acrescentou que o que mais polui são os agrotóxicos que Eduardo leite e a base governistas liberaram. “São venenos proibidos nos países de origem e no RS passaram a ser permitidos”. No último ano do governo Sartori, disse o sindicalista, 30 projetos de esgotamento foram aprovados. Já no governo Leite, até agora, apenas cinco foram aprovados. São mais de 70 dias para aprovação de um projeto. Sobre o aditivo contratual, disse que é importante, mas os prefeitos não podem entrar no “engambelamento” que estão sofrendo com essa privatização que entregará mais 40 anos de saneamento. “Temos que colocar nos aditivos as metas e a qualidade de prestação de serviços. Não basta querermos privatizar. Temos que ter gestão dentro da companhia e hoje não temos”.

Tarcísio Zimmermann, ex-presidente da Corsan: o saneamento é uma área muito complexa e infelizmente, durante muitos anos não havia projeto de universalização, pois não havia nem dinheiro para isso. O primeiro plano que surgiu, segundo o ex-deputado, foi no PAC, a partir do qual todas as companhias e autarquias conseguiram avançar. “A regionalização, prevista na legislação de 2020 precisa levar em consideração que municípios menores não têm condições e por isso é importante termos um sistema como o da Corsan que atende aos grandes e pequenos, garantindo a operação em todos os municípios”, defendeu. O maior prejuízo, para Zimmermann, é essa proposta que o governo do estado está trazendo em regime de urgência, que coloca em risco o patrimônio dos gaúchos. “É muito grave. Se acontecer, os maiores municípios que tem contratos firmados com a Corsan, havendo a possibilidade de romper o contrato, eles farão isso. Esse projeto pode desvalorizar o patrimônio de todos os gaúchos. A pressa passa e o mal fica.”

Texto: Raquel Wunsch (MTE 12867) e Claiton Stumpf (MTB 9747)

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