Assunto pouco discutido, apesar da grande incidência junto à população, as doenças oculares e a judicialização do acesso ao tratamento foram o tema central da audiência pública realizada nesta quarta-feira, 18, pela Comissão de Saúde e de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa. Proposta pelo deputado Valdeci Oliveira, a audiência contou com a participação de especialistas, pacientes, gestores públicos e representantes de órgãos de Estado, como a Defensoria Pública, Ministério Público e Tribunal de Justiça. A Secretaria Estadual de Saúde, apesar da confirmação, não enviou representante. “O tema desta audiência afeta a milhões de pessoas. Nosso objetivo aqui é o de fomentar o debate e buscar encaminhamentos que possam auxiliar na resolução dos entraves, tanto em relação aos diagnósticos como ao acesso ao tratamento das doenças intraoculares, que tem levado as pessoas à judicialização”, destacou Valdeci na abertura dos trabalhos.
Segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça, no período de 2008 a 2017, houve um aumento de 130% no número de demandas judiciais na área da saúde. Já um estudo do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO) aponta, baseado em índices do IBGE, que existem cerca de 1,6 milhão de indivíduos com algum grau de perda da visão no país, o equivalente a 0,75% da população nacional.
O diretor do Hospital Banco de Olhos, de Porto Alegre, Luciano Mello, taxou como “perverso” o tempo que os pacientes aguardam por uma resposta do Poder Judiciário acerca do fornecimento de medicamentos destinados a tratamentos oculares. “Há casos em que a Justiça aprova (o pedido) depois de um ano, quando não há mais indicação de tratamento. A espera aceitável é de poucas semanas. Depois de seis meses, as chances se reduzem muito”, destacou.
Outro problema apontado, esse trazido pelo presidente do Conselho das Secretarias Municipais de Saúde do RS (Cosems/RS), Diego Espíndola, é a aplicação dos fármacos, pois após receberem o aval da justiça, os pacientes recebem kits com quantidade para até um ano, sendo que esses precisam de acondicionamento especiais e manipulação cuidadosa. E em ambos os casos a responsabilidade é do paciente. Segundo ele, no interior muitos médicos ficam temerosos, pois não sabem se o material trazido pelos pacientes (injeções que devem ser aplicadas) foi guardado respeitando as especificações de segurança. “A medicação deve ser otimizada. Saúde é um direito de todos, é prevenção e é um dever do estado”, afirmou Karina Züge, representante do Conselho Estadual de Saúde (SES).
Outros entraves apontados foram a demanda reprimida por consultas, a grande fila de espera por cirurgias oftalmológicas no serviço público, ausência de protocolos junto ao SUS que devem ser elaborados pelo Ministério da Saúde e a revogação, por parte da ANVISA, em 2016, de portaria que regulava o fracionamento dos medicamentos. “Nós não enxergamos, mas somos insistentes. É preciso que (o Estado) se sensibilize e traga políticas públicas. Assim como há diferenças entre pessoas cadeirantes, há diferenças entre cegos e pessoas com doenças monoculares”, lembrou Joseane Santos, do Movimento Brasileiro de Mulheres Cegas e de Baixa Visão e do Movimento Nacional das Pessoas com Deficiência.
Como deliberação do encontro, será elaborada uma ata detalhada da audiência e agendada, pela Comissão de Saúde da Assembleia, uma reunião com a Secretaria Estadual de Saúde. “Vamos dialogar e cobrar da secretária Arita Bergmann que as pessoas tenham acesso, de fato, ao diagnóstico e ao tratamento das doenças oculares”, afirmou Valdeci ao final do encontro.
Texto: Tiago Machado (MTE 9415)