domingo, 24 novembro

Moradores das regiões Sul e Campanha participaram, na noite desta sexta-feira (16), de Audiência Popular sobre o Projeto de Lei 115/2021 que trata do Crédito Emergencial para Agricultura Familiar. A atividade, promovida pela Frente Parlamentar que trata da pauta, foi coordenada por Miqueli Shiavon (MPA) e a vereadora Iasmin Roloff. A proposta foi construída em conjunto com a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar RS (Fetraf), Movimento do Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Cooperativa Central dos Assentamentos do RS (COCEARGS), União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes RS), Conselho Estadual de Segurança Alimentar (Consea), Bancada do PT e tramita na Assembleia Legislativa.

Antes de abrir a audiência, o ex-reitor da Universidade de Pelotas, epidemiologista Pedro Hallal deu um panorama sobre a situação da pandemia. “Provavelmente neste segundo semestre as coisas vão melhorando aos poucos, infelizmente nos próximos meses a gente ainda vai sofrer com a questão do vírus. Os números não irão baixar rapidamente. Se o Brasil parasse agora, fizesse três semanas de paralisação total, de lockdown e seguisse vacinando neste ritmo, em setembro nós voltávamos às atividades normais, já que o Brasil não vai fazer isso, a gente vai voltar às atividades normais em janeiro de 2021”.

Logo em seguida, o coordenador da Frente Parlamentar, deputado Edegar Pretto abriu a reunião lembrando o quão importante é a unidade dos movimentos sociais em tempos tão difíceis. “Estamos num momento histórico de compromisso, amadurecimento e unidade das forças políticas que atuam no parlamento ou em movimentos populares do campo e da cidade para que tenhamos uma pauta única”. Para ele, “o governador Eduardo Leite tem que olhar para agricultura como um todo, pois não há políticas, e o governo do estado deu as costas para agricultura no Rio Grande do Sul. Sabemos que a monocultura da soja vai bem porque depende basicamente da China, que no ano passado comprou 97% do valor que foi exportado. É uma economia que não depende nem do governo Leite, e nem de Bolsonaro. A agricultura familiar, de modo geral, tem muita dificuldade de sobreviver num tempo como esse, diante de um governo que não está nem aí para formular e fomentar políticas que incentivem a produção diferenciada de alimentos”.

O parlamentar ainda lembrou que cerca de 60% do salário dos trabalhadores é comprometido com a compra de alimentos e que esses se tornaram muito caros, o que fez com que o Brasil voltasse ao mapa da fome. “Conforme pesquisa recente divulgada na imprensa, a região Metropolitana de Porto Alegre é a segunda do país onde mais gente entrou para a linha da pobreza. Que estado é esse que não se preocupa com seu povo? Que deixa seu povo passar fome. É incompreensível”.

O deputado Fernando Marroni lembrou que a bancada do PT colocou como prioridade nesta pandemia três temas para tensionar o governo. “Três projetos no caso, o auxílio emergencial, um fundo de aval para socorrer micro e pequenas empresas que perderam o crédito e o crédito emergencial para a agricultura familiar. É uma aberração o que estamos vivendo no RS, nunca na história do RS com seca ou estiagem faltou socorro dos governos estadual e nacional e agora nada”. Para ele, o PL 115 é um primeiro passo para reconstruir a agricultura familiar no RS. “A nossa grande tarefa é colocar os pobres no orçamento, como sempre disse Lula, e a nossa é de colocar os agricultores no orçamento”.

O vice-líder petista, deputado Luiz Fernando Mainardi observou que quando o Lula foi presidente “criamos um forte programa de produção de alimentos no país para o pequeno, médio e grande produtor. Nós tivemos política para praticamente tudo, mas nós não conseguimos equacionar o problema ainda dos agricultores assentados que não têm crédito porque não tem garantia. É inaceitável isso, aqueles que mais precisam têm restrições. O governo federal nos deve isso. Lutamos por esse crédito emergencial, por esses recursos para a gente poder atender minimamente esses setores tão prejudicados nos últimos tempos e tão importantes, não só porque estamos tratando da subsistência e da vida digna para esses milhares de produtores do nosso estado, mas estamos tratando de alguém que produz alimentação para nós”. Mainardi afirmou ainda que esse é um programa de crédito, um programa de investimentos no meio rural para a garantia da subsistência.

Já Ildo Pereira, dirigente do MST, que falou em nome das entidades parceiras do projeto, ressaltou que se o governador tiver bons olhos para agricultura familiar não tem como este projeto não avançar, diante da conjuntura de hoje no estado e no país. “Esse modelo de agricultura capitalista, neste exato momento, está deixando cada vez mais o povo brasileiro com fome. Quero ressaltar que este governo do estado, e o governo que o antecedeu, tem poucas pessoas preparadas para atender o setor da agricultura familiar. Oferecemos produtos de qualidade para merenda escolar, e tive o descontentamento de ouvir de uma técnica do governo dizer que na região Sul não tem agricultores capacitados para atender as demandas do governo do Estado. Quero dizer que essas pessoas não conhecem o Rio Grande do Sul”, lamentou.

Também esteve presente o deputado federal e líder da bancada federal, Elvino Bohn Gass, que falou sobre o total abandono dos governos federal e estadual com a agricultura. “Nós conseguimos aprovar a Lei Assis Carvalho como a luta que está sendo travada aqui no Estado, isso é pensar no desenvolvimento do RS. Essa é a nossa marca. Eles acabaram com a Secretaria de Desenvolvimento Rural assim como não temos mais o Ministério do Desenvolvimento Agrário a nível nacional, isso é não pensar em quem faz a comida para o povo”.

Veja as manifestações dos presentes:

Adilson Schuch, dirigente do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) – Ao mesmo tempo em que é anunciado recordes de produção de commodities, nós temos uma contradição muito grande do agronegócio que é o tema da fome. Além da gente fazer esse debate se enraizar nas nossas bases, no movimento social e sindical, nas Câmaras de Vereadores, nós teríamos que fazer um movimento para ampliar, porque a fome chegou. Só na Grande Porto Alegre, mais de 280 mil pessoas vieram para a linha de pobreza. Esse projeto vem ao encontro de uma realidade muito dura que é a fome, que chegou às periferias. A questão do alimento durante o período de pandemia e pós-pandemia, eu acredito que vai ser a preocupação mais forte das pessoas.

Luis Weber, Fetraf – Estamos diante de um desafio para fazer com que este projeto de crédito emergencial aconteça. Para isso, buscamos todo apoio para que os pequenos agricultores possam produzir alimentos. Sabemos que o pequeno produtor não está dentro de um processo de commodities e das empresas que dominam o mercado. Com isso, têm um prejuízo muito grande. A política para que as pequenas propriedades consigam agregar valor à produção, depende de incentivos, caso contrário as famílias deixam de ter interesse para trabalhar no campo. Assim, a gente vê muitos trabalhadores do campo indo trabalhar de empregado nas cidades. Isso ocorre pela omissão do governo. Mais uma vez é preciso que todos os movimentos sociais estejam unidos, assim vamos conseguir produzir alimentos mais saudáveis e garantir que nossos produtos cheguem até a mesa dos consumidores.

César Demenech – A nossa região é a mais diversificada do Estado, temos quilombola, indígenas, pescadores, agricultor familiar e historicamente mais carente. A gente vê neste governo o encolhimento das políticas públicas, a gente vê pela Emater. O encarecimento do crédito e sua limitação. Uma seca não é só o que se perde naquele dia, é uma vaca que se vende e demora para se recuperar. Esse projeto vem a calhar muito bem para a nossa região.

Juliano de Sá, Presidente Consea/RS – A fome se agravou a partir do golpe de 2016, com o desmonte de políticas públicas. O problema do Brasil não é falta de alimentos, mas uma questão de acesso aos alimentos. E uma das questões que temos visto é o preço dos alimentos. O desmonte de políticas públicas de compras institucionais causam também um desabastecimento, que causa desequilíbrio na balança comercial. O governo gaúcho não tem um programa institucional de combate à fome, e as secretarias não conversam. Isso resulta num fiasco, como aquela compra de mais de R$ 25 milhões de produtos de um atacadão, sem comprar nenhum produto da nossa agricultura familiar. Por isso, o projeto de crédito emergencial, que é fruto de longa discussão, além de ajuda é uma forma de denunciarmos o desmonte das políticas públicas.

Texto: Raquel Wunsch (MTE 12867) com informações de Catiana Medeiros e Leandro Molina

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