Para compreender os movimentos de Bolsonaro, a chave está em uma manifestação recente dele.
No dia 19 de março de 2021, em vídeo divulgado por um canal de YouTube de apoiadores, Bolsonaro disse: “O povo não tem nem pé de galinha para comer mais. Agora, o que eu tenho falado, o caos vem aí. A fome vai tirar o pessoal de casa. Vamos ter problemas que nunca esperávamos ter problemas sociais gravíssimos”. E depois completou: “O terreno fértil para a ditadura é a miséria, a fome, a pobreza, onde o homem com necessidade perde a razão. Estão esperando o que? Vai chegar o momento? Gostaria que não chegasse, mas vai acabar chegando esse momento…”
É o desejo pelo caos que explica sua insensibilidade frente às mortes evitáveis. Sua pregação em desfavor da ciência. A oposição por meses a fio à busca por vacinas. Sua concordância com a radical ortodoxia fiscal de Paulo Guedes, que impede qualquer possibilidade de medidas econômicas emergenciais consistentes, muito menos qualquer pacote de estímulos à recuperação da terra arrasada em que se transformou a economia nacional.
É na busca deste objetivo que a horda de seguidores do profeta do caos dissemina falsas notícias contra governadores que não o seguem. Também é o que os motiva a pregarem o motim de policiais militares contra estes mesmos governadores.
A demissão do ministro da defesa, general Fernando Azevedo e Silva e sua já pública defenestração do general comandante do Exército, Edson Pujol, revela um não alinhamento da cúpula das Forças Armadas a este projeto antidemocrático. A troca do comando é uma tentativa de subordinar as Forças Armadas ao seu projeto de poder.
Resta saber se o movimento dará certo. Conseguirá alojar nestes postos chaves militares comprometidos com seu projeto ditatorial? Militares que frente ao caos que profetiza e persegue darão guarida a uma aventura autoritária?
Há quem aposte que não. A demissão da cúpula das Forças Armadas afastaria de vez os generais da ativa, descontentes com os impactos dos desgastes do governo na imagem dos militares. Confirmariam o que seu ministro da Defesa, recém demitido, verberou aos ministros do STF: que não haverá respaldo às ofensivas de Bolsonaro contra a democracia.
Por outro lado, há quem lembre da posição dos militares frente ao golpe de 2016 e dos tuítes do Comandante do Exército, General Villas Boas, fazendo ameaças quando do julgamento de um Habeas Corpus impetrado pela defesa do ex-presidente Lula no STF.
O certo é que há uma clara tentativa de Bolsonaro trazer os militares para o centro da crise política, econômica e sanitária em curso. Já era difícil separar a imagem dos militares da de um governo com tantos militares à frente de ministérios, mesmo que a maioria seja da reserva. Agora, com a intervenção de Bolsonaro passa a ser quase impossível. Exceto, se de fato, o alto oficialato da ativa não der respaldo a ofensivas autoritárias do profeta do caos que ocupa a cadeira presidencial.
A sociedade civil democrática não pode assistir passivamente este embate entre militares comprometidos com a ordem constitucional e os que flertam ou fazem parte de um “Partido Militar” com projeto de poder autoritário. É preciso forte reação dos partidos políticos democráticos, das entidades empresariais de expressão nacional e das principais entidades da sociedade civil organizada. É fundamental o imediato repúdio à tentativa de Bolsonaro de partidarizar as Forças Armadas e uma firme defesa da ordem democrática.
Pepe Vargas, Líder da bancada do PT na AL.