Bancada do PT encaminha denúncia ao Ministério Público de Contas sobre irregularidades na venda da CEEE

Bancada do PT encaminha denúncia ao Ministério Público de Contas sobre irregularidades na venda da CEEE
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A bancada do PT encaminhou ao procurador-geral do Ministério Público de Contas, Geraldo da Camino, um documento com a denúncia de que todo o patrimônio da Companhia Estadual de Energia Elétrica – Distribuição (CEEE-D) será vendida por um valor muito abaixo do que vale ao mesmo tempo em que o Estado abre mão de impostos e investe grande montante de recursos públicos para viabilizar a transação. A denúncia foi oficializada em reunião virtual realizada na tarde desta quinta-feira (19).

O documento subscrito pelos deputados Edegar Pretto, Fernando Marroni, Jeferson Fernandes, Luiz Fernando Mainardi, Pepe Vargas, Sofia Cavedon, Valdeci Oliveira e Zé Nunes, aponta problemas no modelo adotado para a alienação, que indicam, possível ocorrência de irregularidades administrativas, com prejuízos ao patrimônio público.

O deputado Jeferson Fernandes disse ter sido surpreendido pelo valor de venda anunciado em audiência pública promovida pelo governo do Estado no início da semana. Pelo que informou o secretário do Meio Ambiente e Infraestrutura do Estado do Rio Grande do Sul, Artur Lemos Júnior, o edital deverá ser lançado agora em dezembro, o leilão será realizado em fevereiro próximo e o preço de venda será por um valor mínimo de R$ 50.000. “No primeiro momento imaginamos que tínhamos ouvido mal o valor, mas é isso mesmo. Queremos ouvir que tipo de procedimento podemos ter por parte do MPC, uma vez que há nítida desistência de valores e para o povo gaúcho resta a preocupação com a prestação de serviços e tarifas pelos próximos 30 anos”, argumentou, lembrando que a área de concessão da CEEE-D ocupa 26% do território do Estado do Rio Grande do Sul. Nessa área, existem 72 municípios, com uma população de cerca de 4 milhões de pessoas, representando 35% da população do estado, atendendo a 1,75 milhão de clientes.

Conforme anunciou o governo, para viabilizar a transação, o Estado terá que fazer um aporte escritural de R$ 2,8 bilhões na companhia, que serão abatidos do crédito que o controlador tem a receber em ICMS atrasados, sem aporte de dinheiro e sim um aumento de capital, resolvendo a maior dívida da companhia. Os passivos ficarão com o povo gaúcho e a companhia será entregue à iniciativa privada quase isenta de dívidas, para prestar serviço público essencial à população, fazendo a distribuição de energia em 1/3 do território gaúcho, com uma concessão de 30 anos. Em outras palavras, o Estado “limpa” a CEEE-D dessa dívida de ICMS e nada recebe, num processo de renúncia fiscal pois com isso a venda restará pelo simples valor de R$ 50 mil. “O governo vai abrir mão da arrecadação de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), vai vender a empresa limpa sem nenhuma dívida. Entendemos que só temos chance de reverter isso no Tribunal de Contas”, afirmou a deputada Sofia Cavedon, lembrando a situação do Amapá, estado em que o fornecimento de energia foi privatizado e que vem passando por diversos apagões. A deputada afirmou também que para privatização, a CEEE rompe com fundo de aposentadoria dos funcionários. “Em algum momento da história, a Fundação vai buscar a reposição junto ao poder público e não junto à empresa que adquirir”.

O procurador-geral do MPC, Gerando da Camino anunciou suspeição em face de um possível parentesco com presidente da CEEE, mas comprometeu-se a encaminhar a representação para outra procuradora que já está acompanhando o caso. “É um tema complexo. Certamente será analisado com o cuidado que demanda”. Da Camino lembrou a privatização da CRT em que o Tribunal de Contas precisou se manifestar em função da remuneração do agente BNDES Par, que tereia recebido um ganho de “capital alheio”. “Como neste caso da CEEE há interesse, se impõe uma análise criteriosa e avaliação de cenário. O sistema de consulta está em andamento e será fornecido aos deputados”, garantiu.

Também participaram do encontro virtual os deputados Fernando Marroni e Valdeci Oliveira.

Confira o documento encaminhado pela bancada do PT ao Ministério Público de Contas:

EXMº SR. DR. GERALDO DA CAMINO
PROCURADOR GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO RIO GRANDE DO SUL

Os Deputados Estaduais do Rio Grande do Sul, abaixo signatários, vêm perante V. Exª para formalizar a comunicação de fatos graves sobre a denominada privatização dos ativos pertencentes ao Estado do Rio Grande do Sul na COMPANHIA ESTADUAL DE ENERGIA ELÉTRICA DISTRIBUIDORA (CEEE-D), especialmente quanto à orientação oficial do Governo do Estado, sobre o modelo a ser adotado para a alienação, que indicam, em tese, eventual ocorrência de irregularidades administrativas, com prejuízos ao patrimônio público, requerendo a adoção de providências cabíveis por parte desse Eg. Ministério Público de Contas.

O atual Governo do Estado avança no processo de alienação das ações de controle do Grupo CEEE, visando a entrega das empresas públicas para a iniciativa privada, como vem de ser amplamente noticiado em todas as mídias.
Para tanto, editou uma apresentação para a imprensa, onde lançou dados que apresentam situação caótica das empresas, em especial a CEEE-D, para justificar o modelo que adotará para vender as ações, com decréscimo acentuado do valor das ações e resultados gerarão enormes prejuízos futuros aos cofres públicos, inclusive com renúncia (perdão/anistia) de tributos que constituem um dos elementos que alega tornarem essa empresa deficitária (apresentação em anexo; arquivo digital).

Em 16 de novembro de 2020, continuando, o Governo realizou a audiência pública virtual 001/2020, para tratar do processo de desestatização da CEEE-D, em que participaram o Secretario de Meio Ambiente e Infraestrutura, Artur Lemos e o Presidente do Grupo CEEE, Marcos Soligo, pelo BNDES, Marcos Sorial e Banco Plural, por Ricardo Justo, reafirmando taxativamente a intenção, em tese, irregular e danosa ao patrimônio público estadual.  Segundo informaram, o edital de privatização será publicado em dezembro, e a expectativa do governo é de que o leilão ocorra em fevereiro de 2021. O preço mínimo de venda definido pelo Governo é de R$ 50 mil, o que significa um preço irrisório para o real patrimônio da CEEE-D, que é muito mais elevado.

O Governo estima que a estatal gaúcha de distribuição de energia tenha R$ 7 bilhões em dívidas, a maior parte é referente ao ICMS não pago, cerca de R$ 3,4 bilhões, mais os custos previdenciários de cerca de R$ 1 bilhão, além de dívidas de R$ 465 milhões com servidores denominados ex-autarquicos, funcionários da época em que a companhia era uma autarquia, com o BID da ordem de R$ 1 bilhão, além de passivos trabalhistas, dividas para com a Fundação CEEE e despesas decorrentes do próprio processo de alienação.

Porém, o surpreendente é que o caminho adotado pelo Governo do Estado para, segundo alega, viabilizar a CEEE-D para a venda é o mesmo que poderia realizar para viabilizar a sua manutenção como patrimônio público. Atente-se a que será feito um aporte escritural de R$ 2,8 bilhões na companhia, que serão abatidos do crédito que o controlador tem a receber em ICMS atrasados, sem aporte de dinheiro e sim um aumento de capital, resolvendo a maior dívida da companhia. Em outras palavras, o Estado “limpa” a CEEE-D dessa dívida de ICMS e nada recebe, num processo de renúncia fiscal pois com isso a venda restará pelo simples valor de R$ 50 mil.

Essa modelagem do negócio ocorreu por meio de contrato com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A execução do processo fica a cargo da empresa Ernst & Young e pelo consórcio Minuano Energia, composto pelas empresas Machado Meyer, Thymos Energia e Banco Plural.

Com isso, o Governo faz crer que a situação financeira da empresa é grave, e não vender a CEEE-D significaria perder a concessão e os ativos, embora para vendê-la, basta uma simples operação contábil para estabilizá-la. E o governador ameaça, caso a CEEE-D não seja repassada à iniciativa privada, de que não haverá novos investimentos na área de energia devido à grave situação fiscal e financeira do Grupo CEEE. Essa situação implica forte indício de que pode haver irregularidade na operação, com enormes prejuízos ao patrimônio público estadual, insista-se, em face do diminuto valor atribuído à participação na CEEE-D.

Em suma, o Governo fará um leilão da empresa CEEE-D com um valor mínimo de R$ 50 mil, os passivos ficarão com o povo gaúcho e a companhia será entregue à iniciativa privada quase isenta de dívidas, para prestar serviço público essencial à população, fazendo a distribuição de energia em 1/3 do território gaúcho, com uma concessão de 30 anos. Isso é assustar, ainda mais levando em conta a atual situação passada no Estado do Amapá, onde o serviço de prestação de energia elétrica é privatizado e enfrenta um prolongado apagão.

O contribuinte gaúcho está apreensivo com um isso e com o provável aumento nas tarifas após a privatização da companhia gaúcha, que hoje atende a 1,75 milhão de consumidores distribuídos em 72 municípios gaúchos.
Toda a operação sugere, em tese, possibilidade de prática de atos irregulares e lesivos aos cofres públicos, o que, acaso comprovados implicam a necessária adoção de correções pelos órgãos institucionais de fiscalização e controle. É necessário investigar esses fatos.

Por isso, vêm os signatários apresentar esses indícios, a fim de que o Ministério Público do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul adote os procedimentos urgentes e adequados para averiguar profundamente os fatos, apurar as eventuais irregularidades e adotar as providências cabíveis para responsabilização dos envolvidos, acaso assim seja concluído.

Porto Alegre, 19 de novembro de 2020.
Luiz Fernando Mainardi, Fernando Marroni, Jeferson Fernandes, Pepe Vargas, Sofia Cavedon, Valdeci Oliveira e Zé Nunes.

Texto: Claiton Stumpf (MTB 9747)