Servidores da Susepe denunciam falta de informações, de efetivo e de isolamento de presos na pandemia

Servidores da Susepe denunciam falta de informações, de efetivo e de isolamento de presos na pandemia
Foto Mauro Mello

O Fórum Interinstitucional Carcerário, órgão ligado ao Tribunal de Justiça do RS que reúne representantes do governo do estado, de entidades de servidores do sistema prisional, do Conselho de Psicologia, entre outros, para pensar o melhoramento do sistema, irá enviar documento à Secretaria de Administração Penitenciária do RS solicitando informações sobre as condições do combate às contaminações por Coronavírus nas prisões gaúchas e quanto ao número de infectados entre apenados e trabalhadores. O encaminhamento foi acordado na manhã desta quarta-feira (02/09), durante reunião ordinária do Fórum na qual, a convite do presidente da Comissão de Segurança e Serviços Públicos, deputado Jeferson Fernandes (PT), o presidente do Sindicato dos Servidores Penitenciários do RS (Amapergs – Sindicato), Saulo Basso denunciou as condições precárias dos servidores da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) e dos presos frente ao enfrentamento da Covid19.

De acordo com o presidente da Amapergs, há três principais problemas no que tange a contaminações por Covid 19 nas cadeias gaúchas. O primeiro destes, a dificuldade no acesso a informações sobre o número de contaminados, que seria maior do que o divulgado pelo governo. “Visitamos as casas prisionais e vemos a diferença entre os números apresentados e a realidade. Na PEJ, por exemplo, confirmaram a contaminação de 200 apenados, mas parece que já são 400. Não seria irresponsável a ponto de dizer que maquiam números, mas estes passam por pelo menos 3 servidores antes de serem divulgados”, alertou Saulo, destacando que a atual direção do Sindicato tem capilaridade nas 152 casas prisionais do RS. O segundo ponto de preocupação do Sindicato é quanto à falta de efetivo. “Temos déficit de 2800 servidores, segundo cálculo seguido pelo Ministério da Justiça, que determina o ideal de 5 servidores para cada apenado. Somos 7 mil servidores para 40 mil presos. Na prática, temos casas prisionais com apenas dois colegas no plantão”, confidenciou.

Neste sentido, Saulo defendeu que sejam chamados os aprovados no último concurso da Susepe, cerca de 1400 pessoas, em função de ser este um momento diferenciado pela pandemia. “Muitos se afastaram do serviço por estarem contaminados, por estarem no grupo de risco ou por viverem com familiares que estão no grupo”, detalhou. Além disso, lembrou que, no momento, estão suspensas as consultas médicas regulares, as visitas de familiares aos presos e as audiências do Poder Judiciário. “Imaginem quando voltarem estes atendimentos. Vamos estar ainda mais esgualepados”, frisou.

O presidente da Amapergs reforçou ainda, como terceiro ponto negativo, a necessidade do isolamento efetivo dos apenados, que não ocorre na prática. Ele lembrou que, no dia 20 de março, o Sindicato já havia formalizado em documento medidas que o governo estadual deveria adotar para impedir o contato dos presos com o exterior das cadeias, mas que não foram implementadas. Ele contou que, apesar da proibição das visitas às casas prisionais, a entrada de sacolas trazidas por familiares é permitida. “Os familiares fazem filas enormes do lado de fora para trazer as sacolas, muitos sem máscara. E estas sacolas podem trazer o vírus para dentro do sistema. Já oficiamos a Susepe sobre isso diversas vezes”, criticou, destacando que a própria engenharia das prisões gaúchas, já superlotadas, não favorece o isolamento de presos. O Sindicato sugeriu ainda que cada região do RS tivesse um centro de triagem para receber os apenados vindos das delegacias e de outras penitenciárias, impedindo que entrassem direto nas cadeias. “Deviam usar as penitenciárias moduladas, como a de Osório, Ijuí, Uruguaiana, que tem condições para esta finalidade”, detalhou, reiterando sugestão apresentada à Susepe.

A coordenadora do Núcleo do Sistema Prisional no Conselho Regional de Psicologia do RS, Maynar Patrícia Vorga Leite, além de corroborar com a narrativa de Saulo Basso, lembrou que a Susepe não disponibilizou Equipamentos de Proteção Individual – EPI- na qualidade e quantidade suficientes, mas que o Sindicato supriu esta carência com máscaras doadas por Ongs. Segundo ela, também não houve uma campanha mais eficiente para que os colegas utilizassem os EPIs de maneira adequada. “Recebemos apenas a máscara de pano da Susepe; os escudos faciais foram dados pelo Sindicato. Álcool gel ficou por nossa conta”, contou Maynar. Sobre a falta de efetivo, ela disse ainda que há casas prisionais que não contam com profissionais de psicologia e que não há concursos para esta finalidade e para outras áreas técnicas há bastante tempo. “Apesar disso, os psicólogos têm sido solicitados a fazer muito mais do que era solicitado antes da pandemia. Em número insuficiente e sem equipamentos adequados para proteção”, completou.

Pela Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Roque Reckziegel observou que o Fórum Interinstitucional Carcerário já se manifestou inúmeras vezes sobre a falta de efetivo da Susepe e se mostrou preocupado com a discrepância entre os números que dão conta das contaminações por Covid19. “Falta de servidores é um problema crônico do sistema carcerário, que merece a nossa atenção. É um trabalho que gera tensão, stress enorme e muito desgaste”, sublinhou.

O deputado Jeferson demonstrou inconformidade com a falta de transparência na divulgação dos números referentes a contaminações. “Não é razoável. Já tomamos várias iniciativas neste sentido, pela Comissão de Serviços Públicos. Inclusive propusemos um boletim diário apresentando os dados para checagem, ideia que logo foi abandonada pela Susepe, em função de causar ‘polêmica’”, contou o parlamentar. Ele entende que a falta de informações prejudica o papel fiscalizatório do Parlamento. “Não é possível que neste período de pandemia não tenhamos as informações corretas e fiquemos dependentes do que vem do gestor”, criticou o deputado, sugerindo a elaboração de documento do Fórum com a denúncia da Amapergs a ser endereçada a Secretaria de Administração Penitenciária.

Por fim, a desembargadora Jane Dutra, que coordenou a reunião do Fórum Institucional, complementou o encaminhamento sugerido pelo parlamentar e aprovado pelos demais, acrescentando o convite para que o secretário de Administração Penitenciária do RS, César Faccioli seja o convidado especial da próxima reunião do Fórum, que ocorre em outubro. A data ainda não foi definida.

Texto: Andréa Farias (MTE 10967)