sábado, 23 novembro
Foto Leandro Molina/Reprodução

A Comissão Mista Permanente de Defesa do Consumidor e Participação Legislativa Popular realizou, na manhã desta segunda-feira (03), Audiência Pública sobre as perdas dos agricultores familiares e assentados da reforma agrária com a seca, vendavais e enchentes no RS. A atividade foi proposta pelos deputados petistas Edegar Pretto e Zé Nunes e contou com a participação de mais de 130 pessoas de 62 municípios gaúchos na sala virtual destinada às entidades da agricultura do RS.

O deputado Edegar Pretto explicou os motivos que levaram à realização da audiência. Lembrou que em dezembro de 2019 foram registrados os primeiros pedidos de decretos dos municípios, e que hoje chegam a 400 que decretaram situação de emergência. “A situação é dramática, e é necessário que o poder público estenda a mão para quem precisa de ajuda, pois o que foi feito até agora está aquém do esperado” lamentou. Pretto lembrou que em janeiro, quando esteve como presidente interino da Assembleia Legislativa, foi realizada uma reunião com o governador e representações de diversos municípios e entidades da agricultura familiar. Uma das reivindicações entregue com a pauta geral dos movimentos do campo foi a sugestão da criação de um Comitê do governo para centralizar ações contra a seca, que não foi atendida. O deputado ainda citou reuniões com o secretário de Agricultura do Estado, Covatti Filho, e em Brasília com a ministra da Agricultura Tereza Cristina, e lamentou que a expectativa era bem diferente em relação ao tratamento esperado com o setor que produz o essencial para vida humana, que é o alimento.

O deputado ainda lembrou que dias atrás o Governo do Estado fez um anúncio de R$ 55 milhões para atender o setor, sendo que a maior parte do valor não foi fonte do governo. “É muito pouco e não estamos conformados que um estado agrícola não tenha ação efetiva diante de tudo que está acontecendo, agravado pelo momento de pandemia”. Pretto ainda citou a rede de solidariedade que se formou no RS para ajudar as famílias em situação de vulnerabilidade, com doações de movimentos do campo para trabalhadores e trabalhadoras da cidade.

O deputado Zé Nunes lembrou que o Estado vive uma situação muito particular no que diz respeito à atenção dada ao sinistro da estiagem no Rio Grande do Sul desde novembro de 2019. “Nos últimos 20 anos, nosso Estado enfrentou cinco fenômenos de estiagem, o que se consolida como um problema cíclico e não ocasional. Porém, nunca tivemos um distanciamento, nunca vivemos tão pouco caso de um governo, como o que tivemos no atual período. Os R$ 29 milhões em emendas federais mais os R$ 10 milhões da Assembleia são troco para o tamanho deste problema. Dividindo estes valores para os municípios, se torna impossível amenizar o problema, com tão pouco recurso” afirmou ele.

Para Zé Nunes, mesmo após as chuvas, é impossível não lembrar que os agricultores já estão endividados e por conta disso que defende que é fundamental pensar em políticas permanentes, de longo prazo para estruturar o Estado em relação a este tipo de sinistro. “Precisamos refletir a partir de políticas preventivas, para enfrentar as próximas estiagens, porque, infelizmente, elas virão. No início deste governo, tivemos desmantelamento da Secretaria do Desenvolvimento Rural (SDR), e com todo respeito, não temos uma política concreta na Secretaria de Estado da Agricultura. O atual governo não teve centralidade, não teve nem altivez para cobrar ações do governo federal”. Por fim, o deputado sugeriu a criação de um fundo público para secas e desastres com recursos que não caiam no caixa único, sejam utilizados apenas para este fim.

Veja a manifestação das entidades do campo:

Rui Valença (presidente da FETRAF/RS): Estamos vivendo no RS um dos piores momentos, o que nos deixa indignados e tristes é que começamos a tratar do tema da seca lá no meio de janeiro. Desde lá entregamos nossa pauta e tentamos dialogar com a Secretaria da Agricultura. São oito meses aí. Dia 8 de abril tivemos uma audiência com o Covatti Filho onde foi acertado algumas coisas sobre a estiagem como a criação de um comitê de enfrentamento a estiagem, infelizmente passado quatro meses nada foi feito. Então, 15 ou 20 dias depois da enchente, o governo do estado faz um anúncio sobre a estiagem. O que deveria é ser feito sobre a enchente. Não lembro de uma falta de atenção e de respeito com as entidades. Os poços de água são importantes, mas não são suficientes. Esperávamos recursos para minimizar a estiagem. Rui apresentou a Carta da Agricultura Familiar e Camponesa que foi enviada aos deputados proponentes e será enviada ao Presidente da Assembleia Legislativa, Ernani Polo e ao Governador Eduardo Leite.

CARTA_Agricultura Familiar e Camponesa 29 julho_final

Adelar Pretto (dirigente do MST e integrante da Via Campesina): existe um descaso da situação que vivemos no campo hoje. Tivemos um ano atípico e esperamos que nunca mais volte a acontecer uma coisa dessas, porque nós na roça estamos sofrendo muito. Temos seis meses de estiagem e praticamente nada foi feito. A única ação que teve do Governo do Estado que nós pautamos desde o começo foi a semente do milho do Troca a Troca. Isso nos mostra o descaso deste governo com a nossa pauta e com a agricultura do Estado do RS. Sendo que houve governadores em secas semelhantes que essa, em 2012 por exemplo, o Governador Tarso Genro mandou até trigo para dar para os animais, cesta básica e o cartão estiagem. E com esse governo não saiu nada e não foi por falta de alerta.

Gervácio Plucinski (presidente da UNICAFES/RS): se pegarmos a agricultura familiar no RS, no último censo, somos quase 300 mil famílias. Pegando todas as propriedades nós representamos mais de 80% de propriedades rurais do Estado. E nós representamos 70% dos alimentos que vão à mesa das pessoas. Trago esses elementos para mostrar a importância deste setor. Com relação a estiagem foi a maior e eu não lembro de termos 400 municípios decretando emergência por conta disso. Abrimos negociação com o governo federal e o estadual. Tínhamos promessa de avançar, mas não avançou. A nossa solicitação de criar um grupo de trabalho com outras secretarias além da Agricultura, centro do governo, isso foi prometido em audiência. É um descaso muito grande do governo conosco.

Frei Sérgio Göergen (Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA): eu acho que o Covatti Filho está sendo injustiçado. Quem deveria fazer alguma coisa é o governador Eduardo Leite, mas ele ficou de costas, insensível, ausente, omisso. O que o governo fez até agora é perfumaria. A seca, estiagem, já passou. Hoje nós temos chuva até em excesso em algumas regiões. As consequências e os efeitos dessa seca não passaram e não passarão tão rapidamente. Então o papel do governo não passou e vai demorar para passar. Essa teoria neoliberal de que não há necessidade de governo é uma furada. E é essa teoria com que governa o atual governo, por isso ele ficou de costa, ausente, omisso. Neste ato tão grave que atingiu o RS.

Kaliton Prestes (representando a FETAG): o RS passou por uma seca das mais severas e temos muitas dificuldades para que os agricultores familiares possam continuar produzindo. Tudo o que foi pautado com o governo federal e o governo estadual nós tivemos avanços, mas que ficaram muito aquém das nossas expectativas e das necessidades dos nossos agricultores. E a agricultura não espera, pois é uma atividade muito dinâmica.

Juliano de Sá (presidente do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável do RS – Consea): nós entendemos que a questão da estiagem e da seca mexe com uma questão estratégica, que é a segurança alimentar do Estado e que não começou agora. Inclusive entendemos de grande relevância uma das iniciativas do Governo do Estado de, lá em fevereiro, via decreto regulamentou a Câmara Setorial da Segurança Alimentar, pois é por meio dessa câmara que se pode construir uma estratégia de uma secretaria dialogar com a outra. Porém não ocorreu nenhuma reunião ainda dessa câmara setorial. Aliás o Consea emitiu diversas recomendações ao governador sobre medidas específicas e nenhuma foi aceita até agora. Nem em relação a pandemia, nem a estiagem.

Rafael Rafaelli (Defensor Público): percebemos as dificuldades que o agricultor passa em tempos de normalidade, imagina em tempos como esse de anormalidade. A Defensoria vem atuando de forma muito forte na renegociação de dívidas. Coloco aqui a instituição à disposição pois muitos agricultores ainda vão passar por dificuldades no quesito econômico. Temos a câmara de conciliação que pode ser uma ajuda a todos os agricultores familiares do RS.

Mario Nascimento (representando a FAMURS): o que acontece é a demora para responder as demandas das entidades e municípios e quem está na ponta sofre as consequências. Temos pautado o governo federal, o governo do estado para que seja rapidamente liberado esses recursos. Existe um problema na Funasa pela a liberação desses recursos. Nos somamos à luta da Assembleia e entidades por políticas permanentes neste setor e que irão ajudar na prevenção de estiagem.

Pelo Governo do Estado e representando a Secretaria da Agricultura, esteve presente na audiência o chefe de gabinete da Secretaria, Erli Teixeira. Ele afirmou que o Ministério da Agricultura estará no RS ao longo desta semana para tratar da última fase do Estado livre da Aftosa. Além disso, foi realizada a construção de um site para que produtores da agricultura familiar possam continuar comercializando seus produtos. Afirmou que faz poucos dias que o secretário Covatti assinou um convênio de R$ 600 mil com 3 escolas agrícolas do RS. Que no ano de 2019 foi dada anistia de 100% da safrinha e 60% do Troca Troca. Lembrou que cerca de 400 famílias de comunidades quilombolas do Rio Grande do Sul estão sendo beneficiadas com o fornecimento de 1.450 toneladas de calcário dolomítico pela Secretaria da Agricultura.

Participaram da reunião o deputado Elton Weber, que como presidente da Comissão abriu a audiência pública e os parlamentares Fábio Branco e Silvana Covatti. Também participaram a suplente ao Senado Cleonice Back; Salete Carollo, da Cooperativa Central do Assentados do RS; Bruno Justim, do Coletivo de Desenvolvimento Regional do Litoral Norte; e, Douglas Cenci, do Sindicato Unificado dos Trabalhadores na Agricultura Familiar do Alto Uruguai – Sutraf.

Texto: Raquel Wunsch (MTE 12867)

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