sábado, 09 novembro
Foto RBA

O Brasil vive o grande desafio de superar a crise do corona vírus, os impactos na saúde, na vida e na economia. No entanto, o governo vem adotando posturas políticas frente à proteção social, que demonstram seu poder sobre a mortalidade, definindo quem importa e quem não importa, quem é “descartável” e quem não é. Relativizando a gravidade da situação, deixando a população complemente perdida e jogada à própria sorte.

Na contramão do que o mundo tem indicado, dos economistas, pesquisadores e principais organizações internacionais, o governo que já havia demonstrado a sua perversidade acabando com programas sociais, congelando por 20 anos os orçamentos da saúde e educação, aprimora a arte de negar direitos e permitir acesso à renda.

Sim, são mais benefícios negados do que concedidos! O INSS negou 1,2 milhões de pedidos de benefícios previdenciários, de janeiro a março de 2020. É a 1ª vez que os indeferimentos superam os deferimentos em pelo menos dez anos, segundo dados levantados nos números dos Boletins Estatísticos da Previdência, publicados de 2011 a 2020. Além de uma fila de 420 mil pessoas com deficiência e 70 mil idosos que aguardam para receber o Benefício de Prestação Continuada, previsto na Lei Orgânica de Assistência Social.

No auxílio emergencial, conquistado pela mobilização do Movimento “Renda Básica que Queremos” e uma grande articulação da oposição no Congresso Nacional, para garantir R$600,00 ou R$1.200,00 (mãe-solo), para trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados, pelo período de três meses, prorrogáveis por mais três, já são 47 milhões de solicitações negadas e mais de 10 milhões de pessoas em análise por mais de 60 dias, números que novamente superam os beneficiados. Ainda assim, o governo nega a possibilidade de ampliar pelos três meses adicionais, já previstos na lei, pelos mesmos valores conquistados, muito menos de solucionar os problemas e burocracias que tem mantido tantas pessoas desassistidas. Para garantir esse direito, a luta será intensa nos próximos dias e meses.

Tudo isso no período em que ao menos 5 milhões de empregados formais já foram afetados pela pandemia. Mais de 1 milhões de desempregados em março de abril de 2020 (Dados do CAGED) e pelo menos 4 milhões de contratos suspensos ou salários reduzidos. Somando-se a dura realidade que vivíamos anteriormente, de mais de 13 milhões de desempregados.

O que tem em comum nessas pautas? Todas negam o direito à renda, essencial não só para enfrentar a pandemia, mas como garantia de dignidade da população. Mas engana-se quem acha que isso é algo vinculado a dificuldade de execução ou erros burocráticos, ao contrário, segue a mesma lógica anterior, que desligou 1,2 famílias do Bolsa Família em 2019 e manteve quase 2 milhões de famílias na lista de espera do programa.

A ideia é a mesma, maquiar os dados, criminalizar os mais pobres, ampliar as falhas e colocar para o senso comum, que as políticas de renda e garantia de direitos são pesadas para as costas das contas brasileiras. Que não temos o direito a diminuir a curva da desigualdade, do abandono e da fome.

O tão falado “novo normal” não pode se basear na normalização do que não é normal, como a desigualdade, a pobreza e o privilégio de pouquíssimos. O futuro será dramático se não repensarmos nosso modelo de sociedade e redirecionarmos a atuação do Estado de modo a reduzir as imensas desigualdades do nosso país. Se não pensarmos como sobreviverá a população brasileira e como manterá a capacidade de distanciamento social, no momento em que curva de mortes e infecções pelo vírus batem números assustadores de quase 44 mil mortes e 900 mil confirmados, sem contar a subnotificação

Não podemos ter um Estado que precisa ser mínimo, demorado e cheio de negativas quando trata de direitos da população, ao mesmo tempo em que se mostra potente, dando respostas imediatas, como nos primeiros dias de março, disponibiliza pelo Banco Central, a soma de 1,2 trilhão de reais para os bancos no país, o que equivale a 16,7% do Produto Interno Bruto (PIB).

É preciso gritar alto: as vidas importam! Todas as vidas importam! É hora de chacoalhar a “normalidade” e rotina da desigualdade. O “novo normal” precisa impor condições imediatamente, para que quando tudo isso acabar, a nova normalidade seja um estado de bem-estar social para todos e todas.

Paola Loureiro Carvalho – Assistente Social, Diretora de Relações Institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica

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