Vivemos uma crise mundial sem precedentes, os padrões civilizatórios que nos trouxeram até aqui estão em xeque. É hora de insights lúcidos e humanistas, para que as brumas e sombras da insensatez não sejam o único caminho rumo a um grande naufrágio.
Todo exemplo é reducionista, mas permitam-me referir o caso brasileiro na área da pesquisa, ele é singular. Enquanto países centrais fazem aí investimentos vultosos, aqui ocorre o inverso.
Nosso arcabouço institucional levou gerações para ser construído e agora parece estar mareando aceleradamente para a submersão. Foi no século 20 que consolidou-se nosso capital científico, perpetuando-se até o início deste. Período em que noções de inteligência, nação e soberania, tinham nexo causal, indo da sociedade civil, passando por governos e chegando a setores das Forças Armadas.
Mas práticas regressivas, no desapiedado jogo de os fins justificarem os meios, sempre rondam a humanidade. Na Idade Média, por exemplo, se abrigavam na autoridade de Aristóteles, confundiam-se com o obscuro mito da religião e com o poder feudal. Hoje, configuram-se também como um aspecto de barbárie, embora certamente não possam ser identificadas com inocência ou ingenuidade.
O culto ao obscurantismo e seu séquito sentem-se autorizados em quererem implantar um período de trevas, visão tão antiga quanto o mundo humano, que se produziram antes e se reproduzem ainda hoje, mutuamente.
Um mundo assim, onde sonhos e utopias terminam confundidos com medíocres desejos, traz consequências de deparamos com um universo ausente de sonhos e, sobretudo, privado da fugidia e essencial sensibilidade das quimeras.
Não há nada de estranhar que palavras como segurança e estabilidade possam adquirir nuanças de idílicas promessas. Para todos aqueles que entendem que elas constituam apenas um outro nome, às formas precárias com que vive seu pertencimento à sociedade humana.
Recapturar, pois, o caráter crítico do saber, implicaria contrariar o espírito de nossa época. Remeteria a reencontrar o processo da razão, em oposição àquele que só nutre ódios e dicotomias. E faz agudizar a paralisia e os enormes desafios que nos separam ainda do século 21 e da chamada Sociedade do Conhecimento.
Adão Villaverde, professor, engenheiro. ex-secretário de Estado e ex-presidente da ALERGS