sábado, 23 novembro

Jeferson Miola                   

Em entrevista, o ex-chefe da Procuradoria-Geral da República Rodrigo Janot disse textualmente ao jornalista, com espantosa naturalidade:

Fui armado. A minha ideia é que ia dar um tiro na cara dele. E depois me suicidava. Na sala do Supremo. E fui armado”.

Os detalhes são horripilantes:

1] Janot disse – e fez questão de repetir – que foi armado à sede do STF. Ele não disse que foi com arma a um clube de tiro ou a alguma competição de tiro ao alvo. Ele foi armado, por deliberação prévia e com plano de assassinato pré-concebido, à sede do STF!

2] Janot premeditava assassinar com “um tiro na cara” ninguém menos que um ministro da Suprema Corte!

3] Janot disse que depois do homicídio pretendia se suicidar. Não forneceu detalhes – se, também, com “um tiro na cara”, ou por outro método.

4] Janot escolheu um cenário simbólico e teatral para o homicídio seguido de suicídio: a “sala do Supremo”!

A confissão assassina do Janot dispensa interpretações. É uma confissão claríssima, auto-explicativa, feita sem mesuras por quem até 2017 dava guarida às ilegalidades e crimes perpetrados por procuradores e procuradoras da força-tarefa da Lava Jato – em conluio com policiais, juízes e a mídia liderada pela Rede Globo – contra o Estado de Direito e contra a ordem política e social do país.

A despeito da grave confissão do plano de Janot para assassinar um ministro do STF, a Associação Nacional dos Procuradores da República [ANPR] publicou comunicado [aqui] que, além de inacreditavelmente defender um integrante da corporação com declarada inclinação homicida-suicida, representa grave ataque à democracia e ao Estado de Direito.

O assunto é sério e gravíssimo, mas o comunicado da ANPR é hilário.

A Associação começa afirmando que “os membros do MPF repudiam qualquer ato de violência que se cogite ou seja praticado em detrimento de qualquer pessoa, seja autoridade pública ou não […]”.

E segue divagando que a pistolagem não é o método para a solução de “divergências de ideias e diferenças pessoais”, que devem ser “solucionadas a partir do diálogo, da conciliação”.

Numa demonstração do mais absoluto descolamento da realidade, a ANPR “lastima que o episódio negativo possa, por oportunismo, servir de pretexto para ações que busquem enfraquecer a instituição”.

Por fim, a ANPR condena a busca e apreensão na residência de Janot, talvez entendendo razoável manter o direito de posse de arma e a própria arma nas mãos de um confesso homicida-suicida que representa risco de morte para a sociedade.

É importante ficar atento à linguagem do sindicatão dos procuradores: para eles, o plano confesso de Janot de matar ninguém menos que um ministro do STF com “um tiro na cara” e “na sala do Supremo” é eufemisticamente tratado como mero “ato de violência”.

Além disso, o sindicatão considera a confissão do plano de matar o ministro do STF como simples “episódio negativo” que não pode ser pretextado para “enfraquecer a instituição”, como se algo pudesse enfraquecer a PGR mais que a confissão do homicida-suicida que a liderou durante 4 anos.

A atuação corporativa e a defesa dos crimes cometidos por procuradores/as da Lava Jato é uma marca da ANPR e do CNMP, da Corregedoria do MP e da antiga chefe da PGR.

Por isso o comunicado oficial da ANPR não surpreende e inclusive contrasta com a manifestação do recém empossado chefe da PGR Augusto Aras, que considera “inaceitáveis as atitudes” de Rodrigo Janot.

O que sim chama a atenção é a ausência de reação e até mesmo de dissidências de procuradores e procuradoras decentes e dignos, que não se sentem representados tanto pela ANPR como pelos órgãos correcionais, de controle e de direção do MP – aqui e aqui.

Não é crível que dentre os 1.151 procuradores e procuradoras ativos/as do MPF não existam aqueles com coragem para se insurgir contra as patifarias e barbaridades de bandidos que usurpam as funções públicas em nome de interesses pessoais e de um projeto de poder e que, apesar de agirem assim, são acobertadas pelas entidades corporativas e pela própria instituição.

É triste mas necessário constatar que faltam “Rogérios Favretos” no Ministério Público.

Faz falta no Ministério Público alguém com a têmpera, com a dignidade e com a coragem do desembargador Rogério Favreto.

Em 8 de julho de 2018, Favreto se interpôs à engrenagem fascista do judiciário quando Moro e seus comparsas do TRF4 e da PF impediram a libertação do Lula para ser candidato, vencer a eleição presidencial e impedir a barbárie instalada no Brasil [a esse respeito, ler aqui].

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