A Assembleia Legislativa aprovou em primeiro turno, na noite desta terça-feira (23), por 40 votos a 13 a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 272, de autoria do governo do Estado, que retira da constituição a obrigatoriedade da realização de plebiscito para a venda da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE), Companhia Riograndense de Mineração (CRM) e Sulgás. Os votos contrários foram da bancadas do PT, PSOL e PDT. A proposta ainda precisa ser discutida em segundo turno.
Durante quase cinco horas de discussão, a bancada petista revezou-se na defesa do direito dos gaúchos decidirem o futuro das estatais. O líder da bancada do PT, Luiz Fernando Mainardi ocupou espaço de liderança para argumentar que o plebiscito foi incluído na Constituição para que a decisão de venda do patrimônio fosse compartilhada com a população. Ao final da votação, Mainardi avaliou que a decisão foi um erro histórico. “Restringe a democracia em nosso estado e retira das mãos da população um direito que foi conquistado e inserido na Constituição por conta de experiências do passado. Vender patrimônio é um recurso extremo e, em nosso entendimento, só deveria ser feito com a legitimidade da decisão popular através de uma consulta direta e específica”.
O líder afirmou ainda que ninguém deve se desmobilizar, pois a luta não está perdida. “Não vamos desistir. Ainda há a necessidade de uma votação em segundo turno e muita mobilização a ser feita até lá. Continuamos na luta pela democracia e pela proteção do patrimônio público. Quem tem medo da democracia e da participação vai precisar se explicar para a população gaúcha.”
O deputado Valdeci Oliveira avaliou que a batalha foi perdida hoje, mas a luta em defesa dos interesses da maioria da população continua. “Quando o assunto é o patrimônio do Estado, o povo gaúcho tem que ter voz. As privatizações já foram aplicadas no Rio Grande e o resultado não foi nada positivo para o conjunto da sociedade. Que o governador Leite mude a agenda velha e venha a apresentar um projeto efetivo de desenvolvimento”, disse.
Outro a utilizar comunicação de liderança foi o deputado Pepe Vargas que afirmou que o que está em jogo não é a representatividade do plenário ou a democracia, mas sim a importância que o parlamento eleito pelo voto popular dá ao princípio constitucional que diz que todo poder emana do povo. “Se o povo gaúcho tiver acesso às informações, saberá que houve uma gestão temerária na CEEE que propositadamente, atrasou os pagamentos de ICMS para justificar a privatização agora. Todo mundo sabe que a Sulgás será monopólio privado, todo mundo sabe que o que resta de distribuição de energia elétrica neste estado será objeto de um grande monopólio que vai tirar os recursos dos gaúchos, remetendo em forma de lucros e dividendos para o exterior, gerando riqueza lá fora, impedindo que esta riqueza circule aqui, gerando emprego e renda para o RS, é isto que está em jogo aqui.” Pepe também chamou a atenção para a quebra da palavra do governador que em campanha afirmou que, chegando ao governo, o plebiscito seria um dos primeiros pontos a ser encaminhado à Assembleia já nos primeiros seis meses. “Governador vossa excelência está cometendo estelionato eleitoral! O senhor prometeu a realização do Plebiscito. O que está em jogo é a possibilidade de participação do povo nas decisões do estado”.
O deputado Zé Nunes avaliou que o governador não quer ouvir a população, e não tem interesse no debate porque não tem argumentos. Pretende retirar da Constituição a obrigatoriedade de plebiscito para venda das empresas públicas (Sulgás, CEEE e CRM), de forma unilateral. “As empresas são patrimônio dos gaúchos e a sociedade tem o direito de saber o impacto que terá entregar 70% da concessão das reservas de carvão do RS, ou praticamente todo setor elétrico e energético para empresas privadas e capital internacional. Teremos um grande monopólio privado, em condição de submissão para qualquer projeto de investimento”, justificou, acrescentando que não são essas empresas as responsáveis pela crise do Estado. “A Sulgás, em 10 anos, botou R$ 500 milhões de dividendos nos cofres do governo do Estado. O Grupo CEEE tem enorme ativo judicial para receber, sofreu nos últimos quatro anos com uma administração temerária, e se precisar buscar capital, tem ativos que podem ajudar no seu reestabelecimento. Em relação à CRM, serão entregues 2,5 bilhões de toneladas de carvão por uma bagatela para o capital internacional”.
Para o deputado Fernando Marroni, desde Brizola, a sociedade gaúcha debate sobre as privatizações. O único momento em que a sociedade gaúcha poderia exercer a democracia plena está sendo impedido porque os argumentos econômicos não resistem a um debate. Segundo ele, o que está em jogo é a democracia. “A oportunidade ou não do monopólio não convence, então é preciso que se retire o direito do povo decidir”.
Deputados questionam cercamento da Assembleia
A deputada Sofia Cavedon lembrou que o governador Eduardo Leite vendeu a imagem de diálogo, de coesão e de não radicalidade, mas até agora só teve uma iniciativa de projeto de lei nesses dias, que foi a de suprimir a democracia no Rio Grande do Sul. A deputada lamentou que a Casa do Povo esteja submissa e para tentar esconder esse perfil autoritário do governador, restringindo a entrada do público. “Pior, a Assembleia desconhece que mais de 80 mil cidadãos e cidadãs pedem a realização do Plebiscito, mas nada disso tem importância para a presidência desta Casa, pois não acolheu a tramitação do PL de iniciativa popular, negando a possibilidade do povo gaúcho dizer que destino quer para as empresas estatais”. Sofia destacou ainda que mais de 50 Câmaras Municipais aprovaram moções de apoio a consulta popular e de repúdio a PEC do governador.
O Edegar Pretto lembrou que não existe democracia sem a presença do povo. “Não foi por acaso que esta casa aprovou a inclusão da obrigatoriedade do Plebiscito. O dia de hoje é histórico. Não querem ouvir o povo porque o governador tem pesquisa e nós também temos de que a maioria da população é contrária às privatizações”.
Jeferson Fernandes comentou que o aparato utilizado para impedir a manifestação dos servidores poderia estar reforçando a segurança pública em outros lugares. “A sensação que tive ao chegar no Legislativo hoje, ao ver gradis colocados ao longo de todo o quarteirão, é de estarmos em estado de sítio. Efetivo da Brigada que falta nos municípios gaúchos, que tem agências bancárias assaltadas todas as semanas, sobra aqui porque o governo manda vigiar trabalhadores e trabalhadoras que querem se manifestar livremente”. Relembrou que há mais de 50 anos, quando houve o golpe, se dizia que era em nome da democracia. O que mais Jeferson lamenta, no entanto, é ver o Legislativo fechando a possibilidade do povo participar das decisões do Estado. “Talvez nossas palavras de hoje só sejam ouvidas daqui há 50 anos, como no caso do golpe. Mas valerá o esforço de todos e todas que estão aqui lutando”.
No mundo todo, acontecem reestatizações e o Brasil segue na contramão, querendo privatizar tudo. Lá em 2002, os parlamentares que votaram a favor da venda das empresas públicas colocaram na Constituição uma cautela para que não mais se tivesse um aventureiro no Piratini entregando o patrimônio público, como foi o caso do governo Britto. Hoje, aqui, pisa-se na história, ignora-se aquele período em nome de uma questão “meramente ideológica”. E Leite, que se diz um democrata, um homem de diálogo, pisa na própria história ao colocar a tropa de Choque na porta do Legislativo e ao não permitir o debate com a população sobre as privatizações. Vai pesar sobre os ombros dele a irresponsabilidade de entregar um patrimônio dos gaúchos e gaúchas desta maneira.
Texto: Claiton Stumpf (MTB 9747) com informações das assessorias de imprensa