sexta-feira, 22 novembro

 

Adão Villaverde (*)

A postura da bancada petista de construir o diálogo com o futuro governo do estado não evidencia nenhuma mudança de rumo na costumeira trajetória parlamentar do partido, mas realça, sim, uma compreensão e leitura do que o momento político gaúcho requer e, sobretudo, do que o cenário regressivo nacional sugere. Pois apostar irresponsavelmente em uma oposição descomprometida dos principais interesses dos gaúchos, é jogar apenas na demarcação e no pragmatismo político, sem saber lidar com as diferenças resultantes do exercício do contraditório, que ampara e vertebra a prática da democracia representativa.

Temos a compreensão que divergências não são problemas. Não saber enfrentá-las, sim, viram problemas. Não saber tratá-las, sempre implica em abdicar da construção de um processo que resulte na chegada a um consenso majoritário sólido, consistente e comprometido de forma plural – sem falar ainda da supressão do acúmulo emancipatório que a herança do pensamento crítico é capaz, invariavelmente, de aportar, de forma educativa às gerações atuais e às que nos seguirão.

Agora, com seu posicionamento construtivo reconhecido, pela primeira vez, por um inquilino do Palácio Piratini, do qual seremos oposição, a bancada petista deixou transparente, em suas conversas com o futuro executivo, a mesma disposição que sempre demonstrou junto aos governantes de outras siglas, priorizando invariavelmente os interesses de todos os rio-grandenses.

Tradicionalmente, a atitude sempre sugestiva da nossa bancada foi interpretada como indevida, desprezada pela arrogância do vitorioso ou tida como problemática já que foi elaborada pelo “inimigo político”.

Sartori foi o exemplo recente acabado desta ojeriza de cunho beligerante, que nunca admitiu as boas intenções dos representantes de parcelas expressivas do povo, legitimados pelo voto nas urnas.

Avesso a qualquer diálogo, o atual governador rejeitou toda tentativa de colaboração apresentada pelos deputados de oposição, como a revisão das isenções fiscais, a fiscalização rigorosa da sonegação dos tributos, o enfrentamento decidido à guerra fiscal e a articulação e ações no cenário nacional forçando a União a assumir suas responsabilidades pelas atuais dificuldades dos estados da federação, originadas na política monetária do governo federal, sobretudo nos ressarcimentos da Lei Kandir.

Na mesma toada de hostilidade, o vice- governador foi explícito no reforço à aversão aos oposicionistas e, pior ainda, ao próprio Poder Legislativo, cuja pluralidade institucional foi considerada como “entrave” às vontades do Executivo. O empresário não só aventou a hipótese de fechamento da Assembleia Legislativa, em maio último, como, após a derrota eleitoral, lamuriou-se pelo fracasso da estratégia de negociar individualmente “vagas de estágio” com deputados, que não nominou, método, aliás, estimulado por eles, talvez agora criticado, somente porque não deu certo.

Em uma segunda reunião na sala da bancada, no Palácio Farroupilha, na manhã de terça-feira, dia 4/12, reforçamos, de modo enfático, nossa firme contrariedade com o modelo tributário, regressivo e linear, penalizando os que ganham menos, agravando a situação de desigualdade no país e no RS, na qual os cidadãos de menor renda pagam mais impostos do que os mais ricos.

Apresentamos, em documento intitulado “Carta Aberta ao Governador Eleito do RS”, cinco de nossas cruciais preocupações no direcionamento dos recursos das alíquotas de ICMS pela gestão de Eduardo Leite, levando em conta todo o cenário da crise econômica e financeira do nosso estado:

i) colocar em dia os salários dos servidores do Executivo;

ii) regularizar os repasses da Saúde para as Santas Casas e municípios;

iii) incluir o gás de cozinha na cesta básica para reduzir a alíquota de ICMS de 12% para 7%;

iv) reduzir a alíquota do ICMS de energia elétrica para quem consome até 100 KW;

v) alterar a alíquota do imposto de herança, ampliando a faixa de isenção para os mais necessitados e aumentando a faixa de contribuição para aqueles que podem pagar mais.

São pontos que consideramos fundamentais para a retomada do desenvolvimento econômico a partir da estabilização da crise nos serviços públicos, especialmente na saúde e segurança, ao mesmo tempo que protegem a população mais pobre, com a garantia do atendimento público e a redução da carga tributária.

Acima de tudo, defendemos que a população não pode continuar sofrendo tanto com o abandono a que foi relegada nos últimos quatro anos e nem os servidores públicos podem seguir padecendo do desrespeito com que são tratados, sem receber em dia durante inacreditáveis 37 meses.

Reforçamos, evidentemente, que a crise estrutural só será superada com medidas de largo prazo, incluindo um obrigatório projeto de desenvolvimento para o Rio Grande do Sul, uma repactuação com as relações federativas e uma reforma tributária justa. Que supere o atual modelo regressivo e excludente e passe por um conceito progressivo, no qual quem pode pagar mais impostos, paga; quem pode pagar mais ou menos, paga mais ou menos; e quem não pode pagar fica isento.

Em tempos de obscurantismo e intolerância, nossa bancada, na prática atualiza a importância e o papel verdadeiro da representação política, fazendo a boa política, dialogando sem abrir mão dos seus mais valiosos princípios.

(*) Engenheiro, professor e deputado estadual (PT/RS)

 

Publicado no Sul21 em 05/12/2018

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