O governo Leite deveria estar totalmente dedicado à reconstrução do Estado e não à sua fantasiosa candidatura à presidência
Por Miguel Rossetto *
Há um ano, o Rio Grande do Sul vivia o maior desastre climático da sua história. As enchentes de maio de 2024 levaram vidas, ruas, casas, cidades, estradas, pontes, plantações, fábricas, e muito da esperança do povo gaúcho. Mas graças à força e resiliência da nossa gente, e à solidariedade do povo brasileiro, reagimos e estamos reconstruindo nosso Estado.
E esse esforço histórico dos gaúchos e gaúchas contou, desde o início, com o apoio do presidente Lula. Nunca antes na história do Rio Grande um presidente esteve tantas vezes no Estado e trabalhou tanto para mobilizar apoios, forças, poderes e recursos. Por decisão do presidente Lula, foram disponibilizados ao RS recursos na ordem de R$ 111,7 bilhões, e destes, mais de R$ 72 bilhões já foram pagos. Entre eles estão R$ 2,2 bilhões para o Auxílio Reconstrução (R$ 5,1 mil para 430 mil famílias); R$ 8,9 bilhões em rebates e crédito para agricultores; R$ 31 bilhões em medidas de apoio às empresas (66 mil empresas beneficiadas); R$ 18 bilhões em medidas para municípios; R$ 6,5 bilhões para o Fundo de Proteção Contra as Cheias; R$ 1,8 bilhão para infraestrutura (Aeroporto, Trensurb, rodovias); R$ 14,4 bilhões (previsão) referente à suspensão do pagamento das parcelas da dívida por três anos; entre outros.
Os impactos desse apoio se refletiram em 2025, com o crescimento de 4,9% do PIB gaúcho, o aumento da arrecadação de ICMS, a redução do desemprego e o controle da inflação no Estado. A verdade é que 2024 foi o ano que Lula governou o RS. No entanto, infelizmente, esse tipo de desastre pode se repetir. Diversos estudos apontam que o RS e o sul do Brasil poderão sofrer novos eventos climáticos extremos com 5 vezes mais frequência.
Pois é diante deste cenário alarmante que é preciso reconhecer que, apesar de todo o apoio e recursos disponibilizados pelo governo Lula, dos estudos realizados pelas universidades gaúchas e da disposição de trabalho da sociedade, o Estado ainda não está se preparando para novos eventos climáticos extremos. E isso se deve, especialmente, à lentidão e ineficiência do governador Eduardo Leite.
Relatório recente da Anistia Internacional aponta falhas no plano estadual para a reconstrução, baixa participação social, falta de obras do sistema de proteção, reflorestamento e recuperação de matas ciliares. Conforme o Painel da Reconstrução da RBS (dados de 30/04), o governo Leite destinou somente R$ 6,925 bilhões para o Fundo de Reconstrução, e destes, pagou apenas R$ 3,135 bilhões até agora. Do total pago, R$ 1,758 bilhão foram de recursos do Funrigs, originados da suspensão do pagamento da dívida com a União.
O chamado Plano Rio Grande, anunciado pelo governador, é um título em busca de um conteúdo. Um Plano que não apresenta uma nova agenda ambiental, de desenvolvimento sustentável, de participação social e de futuro para o Estado. Ao mesmo tempo, o governo Leite é lento na tomada de decisões e nas ações.
E a situação é ainda mais preocupante. Do ponto de vista ambiental, Leite segue sua marcha da insensatez e se recusa a revogar as alterações nefastas feitas por ele no código ambiental. Foi preciso o STF decidir este ano pela proibição do autolicenciamento de atividades de médio e alto potencial poluidor, liberado por Leite em 2019. A Fundação Zoobotânica e a Metroplan seguem em processo de extinção, e o governador ainda não alterou, nem melhorou, a estrutura da Defesa Civil.
As decisões sobre o uso dos R$ 14 bilhões do Funrigs têm ocorrido sem qualquer transparência e controle social. O governo Leite não escuta nem dialoga com a população e os municípios. Sequer a Assembleia Legislativa é consultada. Muitos municípios, por exemplo, têm projetos prontos para manutenção de bombas e diques, mas não conseguem acessar os recursos do Fundo.
Em dezembro de 2024, o presidente Lula liberou R$ 6,5 bilhões para obras do sistema de proteção contra cheias. Na época, Leite anunciou editais para contratação em dois meses. Passados quase seis meses, o governador anunciou que as contratações das obras do sistema de proteção só devem ocorrer em 2026.
Para piorar, Leite ainda tentou comprar um avião a jato, incluir obras para estradas não atingidas, suspendeu a contratação de radares meteorológicos para três cidades gaúchas, e não permitiu que sua base na Assembleia Legislativa aprovasse a criação da Comissão de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas.
Sem estado e sem participação, a reconstrução não será completa nem eficiente. Este processo cansado e tecnocrático, quase clandestino, conduzido pelo governador Leite, não será capaz de responder ao grande desafio do nosso tempo, talvez o maior deles.
O governo Leite deveria estar totalmente dedicado à reconstrução do Estado e não à sua fantasiosa candidatura à presidência. Deveria agir mais e promover espaços de participação social, audiências públicas regionalizadas, fóruns de debates, encontros dos conselhos. Precisamos de mais estado, mais governo e mais democracia. Esta é a fórmula que pode nos preparar para o futuro.
O povo gaúcho já demonstrou toda sua força diante da tragédia para reconstrução do estado e de suas próprias vidas. Mas essa caminhada ainda não acabou. Não queremos que aquela tragédia se repita. É preciso exigir do governo Leite mais ação e menos omissão, mais investimentos, obras, transparência e participação.
Artigo publicado originalmente em Sul 21, em 22/05/2025
(*) Líder da bancada do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Legislativa do RS