Stela Farias faz despedida da Assembleia e alerta para ameaças à democracia

Crédito Ronaldo Quadrado

Durante o Grande Expediente da sessão plenária desta quarta-feira (19), a deputada Stela Farias (PT) fez uma prestação de contas dos três mandatos legislativos e também de sua trajetória política, iniciada em Alvorada, na Região Metropolitana, como vereadora, prefeita, deputada estadual e secretária estadual da Administração e Recursos Humanos.

Há 38 anos, no final dos anos 80, Stela Farias deu início à militância política através de ações da Pastoral em vilas de Alvorada, onde constatou o padrão de miséria e abandono das famílias. “Nunca mais fui a mesma”, revelou. Foi a partir dessa experiência que decidiu abraçar a luta para mudar a vida das pessoas. Cursou o Magistério no Ensino Médio e se deparou com a histórica greve de 1987 pela manutenção dos 2,5 salários mínimos, momento em que passou a militar no Partido dos Trabalhadores. Graduada em História, ingressou no magistério estadual através de concurso público e deu continuidade à profissão da mãe, dona Inácia, a quem sempre acompanhou nas batalhas pela educação de qualidade.

Política e educação, acredita a deputada, “são os dois instrumentos de melhoria de vida da população”, razão pela qual também se filiou ao CPERS-Sindicato e ingressou na vida sindical. Disposta a cumprir sua meta de agente da mudança, disputou uma vaga na Câmara de Vereadores de Alvorada pelo PT, naquela época despontando com as inovadoras gestões públicas em Porto Alegre, com Olívio Dutra e Tarso Genro. “Fui eleita a primeira vereadora do PT em Alvorada com o ímpeto desafiador da juventude, num ambiente autoritário e masculinizado, que pouco mudou em 30 anos”, disse ela, “apesar da resistência das mulheres”. Veio, então, a disputa pela prefeitura de Alvorada, estimulada pelo à época deputado Flávio Koutzi, “aliado de primeira hora na luta das professoras e referência política e partidária”.

A força da militância partidária e o apoio popular resultaram na eleição de Stela Farias, a primeira mulher a assumir a prefeitura de Alvorada. Vinculou-se à Esquerda Democrática, tendência interna do PT onde milita até hoje ao lado de Koutzi, o deputado federal Henrique Fontana e outros expoentes políticos.

Pioneira gestão feminina
Governou o município metropolitano apoiada na inovadora experiência do Orçamento Participativo colocado em prática na Capital, medida que assegurou o enfrentamento da precária estrutura pública de Alvorada e resultou na reeleição, quando foi possível recuperar a rede pública de educação, abrir postos de saúde nos bairros, promover saneamento e pavimentação na cidade. “Consegui atuar diretamente na melhoria de vida das pessoas”, afirmou. Nesse mesmo período o PT elegeu o primeiro governador, Olívio Dutra, o que contribuiu para alavancar a gestão de Stela Farias, que dividia as tarefas públicas com as obrigações maternas, cuidando de Lucas, Bárbara e João Gabriel. A aprovação popular assegurou o primeiro mandato na Assembleia Legislativa.

Responsável pela representação das cidades periféricas às grandes capitais, “o mandato enfrentou um governo estadual radicalmente neoliberal, com corte de investimentos públicos, encolhimento do Estado e da capacidade de trabalho dos servidores, revestida de modernização das estruturas públicas e sem diálogo com a população”, explicou. Além da tribuna, a deputada participou da Comissão de Serviços Públicos, “referência na defesa das escolas, da segurança pública, saúde, servidores públicos e da população que mais se ressentia do recuo das instituições públicas”.

Outro espaço foi a realização de audiências públicas para tratar dos contratos abusivos de pedágios privados nas rodovias gaúchas e, ainda, a presença na CPI para investigar desvio de recursos nas praças e na investigação que apurou ilícitos no Detran. A expansão do método criminoso do Detran em outras áreas da administração direta do Estado, especialmente nas grandes obras, resultou na CPI da Corrupção, por ela presidida.

Inovação e economia
No segundo mandato, Stela Farias foi convidada para assumir a Secretaria da Administração e dos Recursos Humanos, na gestão de Tarso Genro. Concentrou seus esforços durante dois anos e meio para racionalizar as estruturas públicas, gerando economia com eficiência no atendimento e na gestão, criando o Programa de Compras Públicas para Micro e Pequenos empresários – o Fornecer. ”Iniciativa inédita no país, o programa permitiu a utilização de compras governamentais como política de desenvolvimento econômico regionalizado”, resultando no avanço de nove grandes fornecedores de pão, carne e leite ao Estado para 850 micro ou pequenas empresas beneficiadas com a ampliação da carteira de contratações para o custeio do Estado. As compras públicas foram descentralizadas, realizadas pequenas obras de manutenção em prédios públicos, incentivo da compra de alimentos da agricultura familiar foram algumas das iniciativas do seu mandato na secretaria.

Destacou a manutenção do Programa de Reforma Patrimonial do Estado (Otimizar) que estabeleceu o controle, a atualização e a gestão racionalizada dos 18 mil imóveis do Estado. E, ainda, a criação do Comitê de Diálogo Permanente (Codipe), “mesa de negociações entre representantes do Estado e dos servidores para tratar da vida funcional, das reposições salariais, da política de aperfeiçoamento profissional”, alcançando 51 quadros de pessoal do Estado. Também foram instituídas políticas internas de saúde preventiva.

Ações protetivas para as mulheres
“O terceiro mandato, desde o início, deu sinais de que seria de muita luta”, continuou Stela Farias, tendo em vista o perfil do governo que “nunca produziu uma agenda positiva”, promovendo cortes orçamentários na segurança pública, saúde e educação, atingindo “as estruturas e políticas públicas estabelecidas em nosso governo para combater a violência e feminicídios”. Instalou a Frente em Defesa dos Serviços Públicos, que percorreu o Estado realizando audiências públicas e verificando in loco as consequências do corte de recursos orçamentários em áreas essenciais.

Stela representou a Assembleia na 60ª reunião da ONU Mulher, em Nova York, e tomou a iniciativa de propor a criação da Procuradoria Especial da Mulher da Assembleia Legislativa, aprovada e em funcionamento. “Criamos um importante protagonismo institucional deste Parlamento, na rede de acolhimento e proteção à mulheres vítimas de violência”, destacou, tendo sido a primeira procuradora. Outra realização do mandato foi a aprovação da Lei 14.897, para aperfeiçoar a divulgação semestral de dados da Segurança Pública, incluindo os estabelecidos na Lei Maria da Penha e na Lei dos Feminicídios, além dos cometidos contra a população negra, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência, idosos e por motivação homofóbica.

No âmbito dos serviços públicos, o mandato garantiu a regulamentação da aposentadoria especial para policiais civis e servidoras penitenciárias e alteração da legislação para que as servidoras públicas, em licença maternidade, participem dos processos de avaliação de desempenho e promoção. E o mandato se encerra com a aprovação do projeto de lei que institui a Política Estadual de Cuidados Paliativos para Atenção Integral de Saúde das pessoas com doenças ameaçadoras à vida, que poderá se tornar referência para a criação de uma política nacional na área.

Democracia ameaçada
Stela Farias foi a primeira mulher a assumir a liderança da bancada do PT, conduzindo os atos de resistência ao desmonte do Estado promovido pelo atual governo, conforme definiu, “uma avalanche de medidas que fecharam escolas, instituições de pesquisa, terceirização de atribuições públicas onerando os cofres públicos”. Através do diálogo, foi possível evitar a entrega de estatais estratégicas como Banrisul, CEEE, CRM e Sulgás, assegurou. Outra ação liderada por ela foi a Comissão Especial para Investigar a Oferta de Vagas da Educação de Jovens e Adultos no Estado, ameaçada de extinção.

“O Parlamento é o lugar da democracia, aqui se expressa, de forma igual, toda a diversidade de pensamento e ideologia”, resumiu Stela, alertando que o autoritarismo e o fundamentalismo se impõem como grave ameaça à cidadania. Antecipou que dará continuidade à trajetória política, “por Justiça e pela redução das desigualdades, a garantia de direitos e defesa da democracia”.

Agradeceu o empenho, nos períodos de mandato, dos servidores da Assembleia, da Bancada do PT, deputados do partido, do PCdoB, PSOL, PDT, das demais bancadas “pelo convívio democrático, republicano e respeitoso”.

Apartes
Do plenário, os apartes foram realizados pelo deputado Pedro Ruas (PSOL); Ciro Simoni (PDT); as deputadas Manuela d’Avila (PCdoB), Miriam Marroni (PT) e Regina Becker Fortunati (PTB).

Fonte: Agência de Notícias ALRS